sexta-feira, 5 de julho de 2013

A Intifada Indígena e as manifestações de rua no Brasil


Lindomar Padilha

Para entendermos, ou tentarmos entender, um pouco mais sobre as manifestações de rua que vem acontecendo nos últimos dias Brasil a fora penso que precisamos nos atentar para um fenômeno que as antecedeu e que costumo chamar de Intifada Indígena pela relação que nutrem os territórios indígenas no Brasil com os territórios da Palestina.

Durante a década de 90 o movimento indígena organizado e institucionalizado, passou a tomar parte em eventos, reuniões oficiais e até em partidos políticos. Começava a se construir uma espécie de lideranças que as chamo de lideranças que tomam cafezinho na anti-sala do poder. Essas lideranças começam a andar pelo Brasil e pelo mundo “representando” os povos indígenas (e outros povos e comunidades) do Brasil. Acentua-se de forma escandalosa a ruptura entre representantes e representados. O ponto chave para entender aquele momento foi a Conferência de Coroa Vermelha e a marcha indígena contra as comemorações dos 500 anos de “descoberta” do Brasil, onde algumas lideranças afinadas e financiadas pelo governo tentavam sufocar a voz dos povos indígenas.

Também foi naquele momento que os povos e comunidades indígenas entenderam que o modelo de representação adotado já não respondia adequadamente às suas necessidades e anseios. Aliás, o que se questionava era se algum dia, afinal, aquele modelo havia funcionado. A partir daí, e logo após a conferência, os povos começam a, simultaneamente, discutir nas comunidades e nos espaços de reuniões extra-aldeia. Nasce o movimento pós-conferência.

O movimento pós-conferência dá início a uma nova forma de se fazer ouvir pelo poder público, pelos políticos e “seus” partidos. O movimento rompe claramente com o modelo da “anti-sala do poder” e decide ganhar as ruas onde cada povo, cada comunidade se auto representava. Nascia aí os ATLs – Acampamentos Terra Livre. Ao todo foram nove acampamentos todos com ampla representatividade, todos voltados e executados nas ruas e praças, especialmente na Esplanada dos Ministérios, em Brasília.

E porque em Brasília? Porque os povos indígenas estavam dizendo que esta forma de poder representativo via partidos e nos moldes dados, não servia nem para os brasileiros em geral, menos ainda para os povos indígenas. Os povos indígenas, que já haviam dito às lideranças “oficialescas” que não as reconheciam mais como legítimas para os representar, agora dizem isso a todo o modelo de representação política nacional. Os povos indígenas não aceitam mais a subserviência, o silêncio forçado, os desmandos e corrupção com recursos destinados aos seus povos e comunidades, não aceitam mais que o governo financie ONGs indígenas ou indigenistas para que estas ajudem no processo de “silenciar” os povos, que não aceitam mais estas ONGs falarem em nome dos povos.

O mesmo processo que ocorreu com os povos indígenas parece ter ocorrido com outros povos e comunidades e, de sorte que com vários segmentos da sociedade. O grande aprendizado que fica é que não adianta tentar mudar o pau torto que o cerremos. A forma que o sistema representativo se apresenta, só o é, na forma mesma. O conteúdo, porém é outro.

Exemplo disso é o fato de a presidente Dilma, somente agora, a essa altura do campeonato, ter aceitado conversar (mas falar que ouvir) os movimentos sociais especialmente os povos indígenas. Fica claro que ela, que jamais ouviu os indígenas, agora quer fazer crer que os está convidando ao diálogo como se ela fosse verdadeiramente democrática. Detalhe: ela recebeu a bancada ruralista inúmeras vezes e por exigência da própria bancada.


Portanto, o que as ruas trazem agora, há anos os povos indígenas nos trouxeram. Nós é que cegos pelo preconceito, nos recusamos a enxergar e admitir que eles estavam certos. “Este modelo não nos representa”.

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