"- Conclamamos outros povos, trabalhadores e trabalhadoras do campo e da cidade, a recusar esse padrão destrutivo, marcado pela desigualdade e pela violação dos direitos dos povos indígenas e comunidades tradicionais. Reiteramos nossa unidade na luta e disposição de resistir até o fim. Chico Mendes vive, não nas ações de marketing governamental, mas sim na luta dos povos da floresta. "
Declaração de Xapuri, 28 de maio de 2017
Arte de Samuel Jaminawa |
Nós, moradores da floresta, seringueiras e seringueiros, indígenas Apurinã, Huni Kui, Jaminawa, Manchineri, Shawadawa, integrantes de organizações solidárias e Equipe Itinerante, professores e professoras de diferentes universidades, reunidos em Xapuri, no período de 26 a 28 de maio de 2017, no encontro “Os efeitos das políticas ambientais/climáticas para as populações tradicionais”, declaramos:
- Que, neste momento de retomada,
estamos unindo as lutas dos povos indígenas e seringueiros em uma mesma causa.
Nossa união é nossa principal arma de ação contra o capital.
- Que, cientes da história de
resistência dos povos da floresta e do legado de Chico Mendes, nos manteremos
firmes na defesa de nossos territórios. Assim como os que nos antecederam,
seguiremos nos opondo às tentativas de expropriação de nossos modos de vida.
Exigimos a demarcação e reconhecimento de nossos direitos a terra e território.
- Rejeição às iniciativas em curso
materializadas em políticas que têm como objetivo entregar nossos territórios a
grupos de capital privado, entre os quais fazendeiros e madeireiros.
Manifestamos preocupação com a falta de transparência e maneira como diferentes
mecanismos têm sido apresentados, incluindo pagamentos por serviços ambientais
como REDD e suas variáveis, planos de manejo florestal insustentáveis, e
mecanismos previstos no novo Código Florestal, muitos dos quais impostos por
meio de intimidação, chantagem, negociações marcadas por estelionatos e má fé.
- Nossa indignação com as falsas
soluções, que legitimam a continuidade e expansão de um modelo social e
ambientalmente destrutivo. Rejeitamos as iniciativas voltadas para compensar a
poluição. Não aceitamos os mecanismos baseados em restrições aos nossos modos
de vida, e manifestamos solidariedade em relação às populações que vivem nas
áreas contaminadas pelas empresas que buscam compensação. Somos solidários e
estamos juntos das pessoas de outros países que vivem nas áreas impactadas pela
poluição gerada por empresas destrutivas. Ninguém deve viver em áreas
envenenadas, é hora de pôr fim a todo tipo de racismo, incluindo o
ambiental.
- Que estamos sendo lesados pelos
acordos pactuados e negociatas feitas entre o governo do Acre e outros estados
e países em benefício de corporações ávidas por créditos de poluição, entre as
quais petroleiras, mineradoras, madeireiras e empresas do agronegócio.
Manifestamos preocupação com as conversas em curso sobre compensação de
emissões da aviação através da Redução de Emissão por Desmatamento e Degradação
de Florestas Tropicais, os chamados mecanismos REDD. Nos recusamos a usar o
termo crédito de carbono, entendo que são na verdade de créditos de poluição,
que agravam em vez de solucionar o problema. Rejeitamos toda e qualquer forma
de colonialismo climático.
- Solidariedade total com as
mulheres e homens que, forçados a cumprir prerrogativas impossíveis, acabam
multados, criminalizados, endividados, sem condições de manter seus modos de
vida, presos em esquemas que remetem às práticas de aviamento e barracão,
incluindo escravidão por dívida. Manifestamos solidariedade também com os
moradores do seringal Valparaíso e Russas, que, coagidos a se submeterem a um
projeto de REDD, sofrem ameaças de expropriação das terras que são deles por
direito.
- Solidariedade à comunidade nativa
Nova Oceania, do Alto Rio Tauhamanu, no município Ibéria, no Peru. Nossos
irmãos e irmãs Pyru Yini e outros grupos em isolamento enfrentam o avanço do
desmatamento, impulsionado por concessões madeireiras, que contam com
participação direta de empresários acreanos e outros. São grupos envolvidos em
projetos de REDD, que, ao mesmo tempo que costuram acordos internacionais com
apoio das autoridades brasileiras, mantém práticas predatórias. Compartilhamos
a denúncia que uma aldeia foi destruída com 18 casas incendiadas em julho de
2014, sem absolutamente nenhuma providência por parte das autoridades, em um
episódio manchado pela impunidade.
- Conclamamos outros povos,
trabalhadores e trabalhadoras do campo e da cidade, a recusar esse padrão
destrutivo, marcado pela desigualdade e pela violação dos direitos dos povos
indígenas e comunidades tradicionais. Reiteramos nossa unidade na luta e
disposição de resistir até o fim. Chico Mendes vive, não nas ações de marketing
governamental, mas sim na luta dos povos da floresta.
Xapuri, 28 de maio de 2017