Foto Dom Flávio |
Foto Dom Flávio |
Há tempos que estamos falando isso e agora, finalmente, o Ministério Público Federal entrou na história. Tião Viana já tentou destruir a natureza local e violar direitos dos povos quando propôs a extração de petróleo e gás de xisto, o chamado frakling. Agora é o Senador Marcio Bitar e a Deputada Mara Rocha que pretendem fazer o mesmo, só que agora travestido de estrada. No fundo o interesse é a exploração dos inúmeros recursos existentes na região: madeira, petróleo, gás natural, minérios etc... O que ninguém fala é na destruição ambiental e desagregação social e o desastre que isso significa. Por tras de tudo isso ainda tem os projetos de REDD que veem nisso uma super valorização de seus créditos de carbono.
Vejamos o que diz o MPF:
Com a anunciada proximidade do início da construção de mais uma rodovia que ligará o Brasil ao Peru, cortando terras indígenas e o Parque Nacional da Serra do Divisor, na região do Vale do Juruá, no Acre, a Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão (PRDC) representou ao MPF em Cruzeiro do Sul (AC) para que seja avaliada a abertura de inquérito civil para acompanhar irregularidades que estão sendo cometidas na condução do processo.
Segundo noticiado pelo Governo do Acre, a rodovia que ligará os municípios de Cruzeiro do Sul (AC) e Pucallpa (Peru) já teve os estudos preliminares realizados pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), e o projeto fechado da estrada deve ser apresentado no final do ano e o governo federal disponibilizou R$ 45 milhões para as rodovias estaduais e a estrada para Pucallpa.
Além disso, segundo o Governo do Acre, o projeto executivo e o projeto base já estão em fase de conclusão e licitação e o edital para licitação da obra deverá ser publicado entre os dias 15 e 20 de dezembro.
Ocorre que, apesar da divulgação do governo de que a licitação da obra terá início em dezembro, não há nenhuma notícia de que tenha sido realizada consulta prévia, livre e informada aos povos indígenas e comunidades tradicionais interessadas, conforme determina a Convenção n. 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário.
Pelo divulgado até o momento, a estrada em questão terá seu traçado por dentro do Parque Nacional da Serra do Divisor, unidade de conservação de proteção integral, considerado um dos locais de maior biodiversidade do planeta, onde estão localizadas duas terras indígenas (Nukini e Nawa), com indícios, ainda, da existência de grupos indígenas isolados, que circulam entre o Brasil e o Peru.
O procurador regional dos Direitos do Cidadão Lucas Costa Almeida Dias, que também é representante da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão no Estado do Acre (Populações indígenas e tradicionais) também ressalta que está em tramitação o Projeto de Lei nº 6.024/2019 que modifica a categoria do Parque Nacional da Serra do Divisor de proteção integral para Área de Proteção Ambiental (APA), o que permitiria a ocupação humana e exploração dos recursos naturais.
Lucas Dias reforça a obrigatoriedade da consulta aos povos indígenas e comunidades tradicionais interessadas antes de iniciado o processo decisório, pois é nesta fase (da consulta) que as partes dialogam e podem revisar suas posições iniciais. Com a consulta, existe a possibilidade de revisão do projeto inicial ou sua não realização, por isso ela deve anteceder quaisquer medidas administrativas ou legislativas com potencialidade de afetar diretamente os povos indígenas e tradicionais, afirma o titular da PRDC.
A Justiça Federal em Cruzeiro do Sul já chegou a proibir a exploração do gás de xisto pela Petrobrás enquanto essa consulta não fosse realizada junto às comunidades impactadas pela atividade.
Na mesma linha de diversas entidades ambientalistas, a PRDC afirma que a construção desta rodovia poderá ser o maior impacto ambiental que o Acre já sofreu nas últimas décadas. O asfaltamento poderá causar diversos impactos sociais às comunidades tradicionais que vivem na região, como a violência, a prostituição, o alcoolismo, o surgimento de novas endemias, a restrição das áreas de caça e os conflitos com madeireiros, garimpeiros e narcotraficantes, o que poderá levar à desestruturação de sua organização social, econômica, cultural e política.
Povos Indígenas
A Frente de Proteção Etnoambiental Envira - FPEEnv informa que existem índios isolados que vivem no interior do Parque Nacional da Serra do Divisor, referenciados sob a denominação de “Isolados do igarapé Tapada”, com localização próxima à Terra Indígena Nawa. Segundo relatos colhidos junto ao povo Nawa, os isolados foram situados em diferentes lugares, como, por exemplo, no igarapé Tapada, na cabeceira do Novo Recreio e do rio Azul, no igarapé Jordão com o rio Azul, na cabeceira do igarapé Água Preta com o Boa Vista, entre outros.
O povo Nawa já se manifestou em documento sobre a transformação do Parque Nacional em APA, alertando que tal fato permitirá a abertura de novas estradas, com o aumento de índices de desmatamento, grilagem e loteamento de terras, e afetará a maior biodiversidade de aves, anfíbios e aumentará os impactos sociais, com exploração sexual, disseminação de drogas e DST’s.
Além disso, segundo a manifestação dos Nawa, isso acentuará, a partir da permissão de ocupação humana, conflitos de recursos e contaminação de rios e recursos pesqueiros, principalmente os afluentes dos rios da Bacia do Juruá, dos quais as populações nativas retiram sustento e mantém-se em equilíbrio com o ecossistema e tensionará as populações nativas com a possibilidade de invasões de Terras Indígenas, acarretando conflitos ambientais.
Lucas Dias ressalta que excluir a participação dos indígenas no planejamento da estrada pode provocar o subdimensionamento dos custos socioambientais e camuflar possível inviabilidade ambiental, e também financeira, do projeto.
Por outro lado, continua o procurador, deve-se levar em conta os potenciais impactos que a obra poderá causar, que incluem invasões das terras indígenas, aumento do desmatamento, evasão das aldeias para centros urbanos e até o incremento do alcoolismo entre jovens indígenas.
Para a PRDC, tal exclusão é inconstitucional, inconvencional e ilegal, pois a análise desses aspectos sociais pode justamente inviabilizar a execução do projeto e acarretar grandes prejuízos financeiros futuramente.
Os resultados de estudos e da consulta prévia às comunidades devem ser considerados como critérios fundamentais (ao lado dos critérios de engenharia e econômicos) para a concessão e execução de um projeto de tal magnitude, sendo ilegal postergá-los para as fases seguintes, sob pena de se atestar a viabilidade de um empreendimento inviável social, econômico e ambientalmente. Portanto, enquanto essas comunidades não forem consultadas sobre o empreendimento, não se pode dar início ao licenciamento ambiental ou à licitação relacionada à construção da estrada.
Pedidos da Representação
Diante de todos estes fatos, a representação da PRDC é para que o MPF em Cruzeiro do Sul avalie a instauração de inquérito civil para apurar as irregularidades apontadas e garantir que as comunidades indígenas sejam consultadas de forma prévia, livre e informada antes de qualquer medida que possa afetá-los direta ou indiretamente.
Além disso, também deve-se garantir que as comunidades isoladas permaneçam sem contato com a sociedade envolvente e, portanto, o trajeto da estrada seja revisto para preservar-lhes o isolamento.
Outro ponto que a PRDC pede que seja analisado é a regularidade do licenciamento ambiental, que deve ser realizado por órgão federal e que a FUNAI também seja consultada.
A eventualidade da instauração do inquérito é sujeita à independência funcional do procurador da República responsável pela região do Vale do Juruá.
Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão
A PRDC zela pela defesa dos direitos constitucionais do cidadão e visa à garantia do seu efetivo respeito pelos Poderes Públicos e pelos prestadores de serviços de relevância pública. Cabe ao Procurador Regional dos Direitos do Cidadão agir de ofício ou mediante representação e representar ao poder ou autoridade competente para promover a responsabilidade pela ação ou omissão inconstitucionais (arts. 11 a 16 da Lei Complementar n. 75/93).
Enviado por: https://wrm.org.uy/pt/
Este 21 de setembro não é só mais um. Ele chega em meio à crise da Covid-19 em todo o mundo, uma pandemia que nos obriga a refletir sobre os dramáticos impactos que a perda da biodiversidade e os danos ao funcionamento dos ecossistemas estão causando ao planeta e às sociedades que fazem parte dele.
|
|
|
|
|
Por Lindomar Padilha
Este texto, embora tenha sido
escrito para contribuir com o processo de assembleia do Cimi Regional Amazônia
Ocidental (Cimi AO), faz parte de uma série de reflexões que venho fazendo
sobre o tema da análise de conjuntura bem como os rumos que estão sendo tomados
pelos movimentos sociais, pastorais, sindicatos e movimentos da sociedade civil
organizada em geral. Para efeito didático, tratarei a todos genericamente como
“movimentos sociais”. O resultado dessas reflexões encontra-se em um artigo que
deverá ser publicado em breve.
Quando se trata de análise da
conjuntura, seja ela política, social, econômica, eclesial ou outra qualquer, o
objetivo sempre será o de melhor apontar caminhos a serem seguidos. Analisamos
os dados que apontam para o sucesso e os que apontam para o insucesso. A partir
desses dados analisados, decidimos o caminho a ser seguido. Outro ponto
importante para a conjuntura é a definição “do que somos” e “para que” estamos
analisando a conjuntura, pois, disso dependerá a seleção dos aspectos a serem
analisados. Neste ponto, a meu ver, os movimentos sociais pecam gravemente em
suas analises. Explico o porquê.
Os movimentos sociais têm não rasas
vezes, feito analises da conjuntura meramente em seu aspecto político focado em
eleições ou em ações de governos. Ora, este tipo de análise cabe aos partidos
políticos. Os movimentos sociais têm feito suas analises segundo o escopo
ideológico ao qual julgam pertencer. Assim, analisa na perspectiva de
permanecerem no poder, caso se julgam no governo, ou na perspectiva de chegarem
ao poder, caso se julguem opositores ao governo. Este tipo de analise cabe aos
partidos políticos e não aos movimentos sociais que, sim, podem fazer este tipo
de análise, mas não é uma analise necessária e em alguns casos pode até
comprometer o objetivo mesmo. Movimentos sociais não são partidos e, portanto,
não devem fazer suas analises como se fossem. Não se pode analisar (os
movimentos sociais) a conjuntura na perspectiva eleitoral, a cada dois anos.
Uma coisa é o movimento social se reconhecer como sujeito político, outra coisa
é militar partidariamente.
Muitos movimentos sociais, quando
vão fazer sua analise conjuntural chamam representantes ou lideres partidários.
Não que isso seja de tudo ruim, mas pode colocar o movimento social a serviço
deste ou daquele partido e confundindo a razão mesma do movimento social
podendo levar inclusive a perda total de sentido da própria existência deste.
Os movimentos sociais devem fazer analise para melhor propor caminhos segundo o
grupo ao qual está mais diretamente ligado e não propor ao grupo que representa
seguir este ou aquele partido ou político em especial. Temos que ter clareza de
que as pessoas são livres para se associarem a este ou aquele partido político
ainda que militem em algum movimento social, mas os movimentos sociais não
porque esta já é a função dos partidos políticos. Realizamos analise de
conjuntura para identificar um “possível” e não meramente para ver a realidade.
Portanto, temos ver, o possível para a realidade na qual estamos inseridos,
para julgar os pontos segundo o nosso movimento e decidir a ação política que
não será necessariamente partidária ou eleitoral. Pode ser ação política
pastoral, indigenista etc... Os partidos fazem ação política partidária, os
movimentos sociais fazem ação política social, segundo seus objetivos e
segmentos que representam.
Tomemos então o caso mais específico
do Cimi AO. O Cimi AO atua diretamente no apoio aos povos indígenas e à causa
indígena. Portanto, a analise da conjuntura realizada pelo Cimi AO precisa ver
a realidade em que os povos indígenas e o Cimi estão inseridos na atualidade.
Daí, deverá ponderar sobre as possibilidades de ações que possam resultar em
melhorias para estes povos sempre em sintonia com os objetivos estabelecidos
aprioristicamente pelo Cimi e só a partir disso deve-se executar tais ações.
Agir diretamente sobre a causa a que se está ligado é, pois, a intenção final
da analise conjuntural. Ou seja, a análise de conjuntura é feita a partir de um
ponto de partida e de uma leitura ligada à determinada visão de projeto, no
caso do Cimi AO, os projetos dos povos indígenas.
Considerando a visão de projetos dos
povos indígenas, fica claro que o Estado Nacional não figura entre os objetivos
da ação, uma vez que o Estado Nacional (Brasil) nasce justamente da invasão e
espoliação dos territórios desses povos. Dessa forma, a ação política será
sempre na defesa dos interesses desses povos e nunca na defesa do Estado
Nacional esteja ele sendo governado por quem quer que seja. Qualquer grupo
político que tiver na defesa exclusiva do estado brasileiro, seguramente
deixará escapar os povos indígenas (originários), ou os relegará à condição de
“segmentos” e não de povos. Faz-se central em nossa analise o conhecimento dos
projetos dos povos bem como as diversas pedagogias por eles adotadas. Por essa
razão, deveríamos ouvir sempre os povos indígenas e não os partidos políticos.
A pergunta é como os povos indígenas estão enxergando esta realidade e como
poderemos contribuir com suas ações na busca da afirmação de seus modelos e
pedagogias?
Analisando o momento atual
identificamos equívocos como, por exemplo, movimentos sociais soltando nota em
defesa deste ou daquele partido político, deste ou daquele político em
especial, quando deveria ser o contrário: partidos políticos e líderes
políticos é que deveriam sair em defesa dos movimentos sociais porque são
estes, os movimentos, ao final, a base de qualquer movimento democrático
incluindo o processo eleitoral. Costumamos ouvir que a conjuntura está
desfavorável aos povos indígenas como alguma vez esta tenha sido favorável. A
mera constatação disso não nos diz nada de novo, de especial e muito menos
aponta qualquer “possibilidade” para nossa ação na realidade. Temos que inverter
a ordem da proposição para enxergamos as possibilidades. Temos que pensar em
ações que visem “indianizar” o Estado brasileiro no sentido de força-lo a se
reconhecer como um estado plurinacional.
Por fim, não devemos tanto focar
nossas ações em caráteres meramente politicos eleitorais, mas em caráteres
políticos plurinacionais e pluriculturais onde igualdade de direitos e liberdade
sejam a um só momento ponto de partida e ponto de chegada.
Concluo por hora e dessa forma, minha pequena contribuição com a reflexão desejoso de que os povos indígenas sejam sempre nossa causa primeira. A causa indígena é uma causa civilizatória.
Foto de Rainforest Foundation UK
Uma das principais propostas para a próxima reunião da Convenção sobre Biodiversidade é aumentar a área do planeta coberta por áreas protegidas para 30% até 2030. A reunião estava prevista para outubro de 2020, mas foi adiada por causa do coronavírus. Agora está previsto para maio de 2021, em Kunming, China.
Uma carta aberta datada de 1 de setembro de 2020, assinada por 128 organizações e especialistas ambientais e de direitos humanos, alerta que,
essa meta é contraproducente e poderia consolidar ainda mais um modelo obsoleto e insustentável de conservação que poderia destituir de suas terras e meios de subsistência as pessoas menos responsáveis por essas crises.
Um artigo de 2019 publicado na Nature Sustainability analisa o impacto que a proposta de proteger metade da Terra poderia ter e conclui que mais de um bilhão de pessoas podem ser diretamente afetadas.
No início deste ano, Rainforest Foundation UK analisou as áreas de importância ecológica que são mais propensas a serem propostas como áreas protegidas e estimou que o plano da CDB para proteger 30% do planeta poderia deslocar ou despojar até 300 milhões de pessoas.
A carta à CDB foi organizada pelo Minority Rights Group International , Rainforest Foundation UK e Survival International . Em um comunicado , Joe Eisen, Diretor Executivo da Rainforest Foundation UK, afirma:
“Certamente precisamos de compromissos ousados para lidar com as emergências climáticas e de biodiversidade, mas essa iniciativa pode significar que alguns dos mais pobres e menos responsáveis por essas crises estão pagando o preço pela inação no Norte Global. A evidência para a CDB é clara: a melhor maneira de alcançar justiça climática e proteger a natureza é reconhecendo os direitos dos povos indígenas e outros guardiões tradicionais. ”
A carta, com a lista dos signatários, está disponível aqui .
As preocupações das ONGs sobre a meta proposta de 30% para as áreas protegidas e a ausência de salvaguardas para os povos indígenas e comunidades locais
1 de setembro de 2020
Às Partes da CDB e ao Secretariado da CDB:
Estamos preocupados com a meta de 30% na Estrutura Global de Biodiversidade (GBF) 'esboço zero' para:
Embora compromissos ousados sejam certamente necessários para lidar com emergências climáticas e de biodiversidade, acreditamos que essa meta seja contraproducente e poderia consolidar ainda mais um modelo obsoleto e insustentável de conservação que poderia destituir as pessoas menos responsáveis por essas crises de suas terras e meios de subsistência.
Nossas principais preocupações são:
Acreditamos que antes da adoção de qualquer nova meta de área protegida:
Obrigado por considerar essas propostas.
[1] A linguagem citada é extraída do esboço do quadro de monitoramento para o quadro de biodiversidade global pós-2020, divulgado antes da 24ª reunião do Órgão Subsidiário de Aconselhamento Científico, Técnico e Tecnológico.
[2] Schleicher, J., Zaehringer, JG, Fastré, C. et al. Proteger metade do planeta pode afetar diretamente mais de um bilhão de pessoas . Nat Sustain 2, 1094–1096 (2019);
RFUK (2020) The Post-2020 Global Biodiversity Framework - Como o CBD se dirige para proteger 30 por cento da Terra até 2030 poderia despojar milhões .
[3] 3 IPBES (2019) Relatório de avaliação global sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos .
A crise do coronavírus dá o recado: é possível diminuir nossa demanda por recursos naturais e impedir que o planeta entre no cheque especial. Veja como contribuir
Publicado originalmente em:https://www.akatu.org.br/noticia/22-de-agosto-o-dia-da-sobrecarga-da-terra-2020/
Chegamos ao Dia da Sobrecarga da Terra (overshoot day): 22 de agosto é o momento de 2020 em que nós passamos a demandar mais recursos naturais e serviços ecossistêmicos do que a Terra é capaz de regenerar em um ano. Em termos gerais, a data nos conta que atualmente precisamos de 1,6 planeta para suprir toda a nossa demanda de consumo. É como se a partir de hoje a Terra entrasse no “cheque especial”, ou seja, ela tem de acionar a “reserva” planetária que seria destinada à população futura para suprir a nossa demanda atual.
O cálculo para se chegar ao Dia da Sobrecarga da Terra é feito pela Global Footprint Network desde 1961. Nele, divide-se a biocapacidade do planeta pela pegada ecológica da humanidade multiplicada pelo número de dias do ano. Conheça os conceitos:
— Biocapacidade do planeta: quantidade de recursos que a Terra pode gerar em um ano
— Pegada ecológica da humanidade: pegada de carbono (emissões de gases de efeito estufa) da geração de energia; área construída para habitação; produtos florestais para manufatura de madeira e papel; agricultura e pecuária para produção de alimentos e pesca
É importante mencionar que o cálculo da Global Footprint Network utiliza a pegada ecológica nacional (não a individual) e que as métricas de pegada de carbono são recalculadas todos os anos para que compartilhem dados comuns e mesmo método de contabilização.
O recado do coronavírus
Talvez você se lembre que o Dia da Sobrecarga da Terra em 2019 ocorreu em 29 de julho, três semanas antes da data deste ano. Essa mudança é reflexo da redução de 9,3% na pegada ecológica da humanidade desde 1º de janeiro de 2020, em comparação ao mesmo período do ano passado. Um dado que seria ótimo, não fosse resultado direto de um momento de crise e tristeza: a pandemia do coronavírus.
Desde que começou a se espalhar pelo mundo, em fevereiro, a pandemia provocou isolamento social e desaceleração econômica. Com isso, as emissões de CO2 provenientes da combustão de combustíveis fósseis e as taxas de extração de madeira caíram substancialmente, alterando índices utilizados no cálculo, tais como:
É claro que uma catástrofe não pode ser o caminho para a redução de nossas pegadas ecológicas. Precisamos alcançar um futuro mais sustentável mantendo o equilíbrio da biodiversidade e sem abrir mão do bem-estar das pessoas.
O recado que a pandemia nos dá é que é possível mudar a nossa demanda por recursos naturais em um curto período de tempo e que o impacto do nosso consumo também diminui se nos limitarmos ao que é essencial.
Está pronto para agir?
Ainda não é possível saber quando sairemos da crise do coronavírus, mas já é hora de aprender com ela e pensar na reconstrução da economia e do mundo considerando os limites do nosso planeta — que é um só.
Para jogar o próximo Dia da Sobrecarga da Terra ainda mais adiante, precisamos agir. O movimento #MoveTheDate convida a todos a refletir sobre o seu consumo e adotar hábitos com melhor impacto, para reduzir a pegada ecológica individual e, assim, contribuir para a redução da pegada global. Veja o que você pode fazer:
→ Reduza o seu consumo de carne vermelha: a pecuária global é responsável por pelo menos 9% das emissões de gases de efeito estufa derivadas de atividades humanas.
→ Reduza o desperdício de alimentos: pelo menos ⅓ de toda a comida produzida no mundo é perdida ou desperdiçada. Essa perda e desperdício de alimentos é responsável por cerca de 9% da pegada ecológica global.
→ Colabore com a natureza: mesmo em isolamento social, é claro que nós ainda dependemos de solo fértil, água limpa e ar puro. Você pode contribuir para a manutenção da biodiversidade ao plantar uma árvore, cultivar um jardim ou ser voluntário em uma organização de conservação natural.
→ Invista em energias renováveis: a pegada de carbono compõe 57% da pegada ecológica da humanidade, portanto é imprescindível eliminar os combustíveis fósseis, cuja queima é a principal fonte de emissão de gases de efeito estufa. Você pode contribuir pressionando governos e empresas para seguirem este caminho.
→ Mobilize amigos e familiares para adotar hábitos mais sustentáveis: quanto mais pessoas no planeta, menos cada um poderá usufruir dele. Com 7,7 bilhões de habitantes na Terra, a tendência é haver um aumento no consumo, levando à destruição de habitats, extinção de espécies e esgotamento de recursos naturais. Se o crescimento populacional continuar, é ainda mais importante educar e empoderar os indivíduos para a adoção de hábitos mais sustentáveis.
→ Só compre roupas novas se for necessário: as roupas representam 3% da pegada ecológica global, portanto, toda vez que pensar em comprar um item novo, reflita sobre a sua real necessidade dele ou prefira comprar em lojas de segunda mão.
→ Troque o carro pela bike ou pela caminhada: a mobilidade representa 17% da pegada de carbono global. Podemos reduzir essa pegada substituindo o uso de veículos por caminhadas para cumprir pequenos trajetos ou pela bicicleta em trajetos um pouco mais longos, uma vez que ela não emite gases poluentes. Também é importante cobrar dos governantes cidades cujo planejamento favoreça o uso deste modal.
→ Viaje de maneira sustentável: a hospedagem escolhida, a forma de se locomover no destino e quais tipos de alimento privilegiar estão diretamente relacionados à sua pegada ecológica. Opte, por exemplo, por um hotel integrado à comunidade local e equipado com fontes de energia renováveis e reduza sua pegada ecológica em até 48% por viagem.