Manifestação da Via Campesina, ao lado de movimentos sociais e sindicais do campo e organizações ambientalistas, contra alteração do Código Florestal, no dia 7 de abril O deputado federal Aldo Rebelo (PC do B-SP), relator do projeto de reforma do Código Florestal, afirmou que o governo propõe o “extermínio" da agricultura familiar ao pedir que os pequenos produtores tenham área de reserva legal dentro de suas propriedades. A declaração foi dada em entrevista ao portal G1, divulgada na quinta-feira. Luiz Zarref, dirigente da Via Campesina Brasil, rebate a declaração do deputado, que utiliza a agricultura familiar como uma nuvem de fumaça para dar legitimidade ao seu projeto de flexibilização do Código Florestal. “É absurda a ideia de retirar a Reserva Legal das propriedades camponesas. Nenhum movimento agrário pediu isso. Nem mesmo a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agriculturag (Contag), que está bastante próxima do deputado Aldo Rebelo, defendeu isso em suas propostas iniciais de alteração do Código”, afirma Zarref. A Via Campesina Brasil congrega o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), Movimento de Mulheres Camponesas (MMC), Associação Brasileira dos Estudante de Engenharia Florestal (Abeef), Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil (Feab), Pastoral da Juventude Rural (PJR), Comissão Pastoral da Terra (CPT), Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais. Abaixo, leia os comentários de Zarref à entrevista concedida por Aldo Rebelo ao G1. Pequena agricultura defende Reserva Legal É absurda a ideia de retirar a Reserva Legal das propriedades camponesas. Nenhum movimento agrário pediu isso. Nem mesmo a Contag, que está bastante próxima do deputado Aldo Rebelo, defendeu isso em suas propostas iniciais de alteração do Código (no Grito da Terra de 2009). Ele fez essa brutalidade em seu relatório apenas para cooptar as bases, oferecendo uma resposta fácil. No entanto, o estudo feito pela maior referencia da academia brasileira, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, deixa claro o que a Via Campesina já vem dizendo: as Reservas Legais aumentam a produtividade agrícola. Elas garantem a polinização das culturas plantadas, são refúgio para predadores naturais das pragas agrícolas, colaboram na adubação das unidades produtivas e garantem os corpos d'àgua, juntamente com as APPs. Interesses internacionais O Código Florestal é uma lei que defende os interesses nacionais e da sociedade brasileira, por isso o Estado historicamente garantiu uma repressão acima do descrito na lei, para jogar o povo contra a lei. Ele, como suposto comunista, deveria saber que a polícia não respeita a lei, mas sim os interesses repressores das elites. Mas o problema não é a lei, é a política do Estado brasileiro, que privilegia os grandes latifúndios e deixa para os pequenos o rigor das concepções ambientalistas conservacionistas, que não estão previstos na lei. A entrevista do Aldo deixa evidente a nova trincheira que ele ocupa: a do agronegócio. Acusa a agricultura camponesa de ser ilegal, enquanto o latifúndio, histórico desmatador, é defendido como legalizado. Ataca o MST e defende os interesses das transnacionais, que hoje dominam a agricultura brasileira. Aldo critica as organizações sociais europeias e não faz nenhuma menção às grandes multinacionais da agricultura, que apoiam seu relatório. As empresas de agrotóxicos, a maioria europeias como a Bayer, Basf e Syngenta, transformaram o país no maior consumidor de venenos agrícolas do mundo, sem alterar proporcionalmente a produção brasileira. Ele usa isso para confundir a sociedade, uma vez que a grande mídia está a seu favor. Especificamente, existem vários desvios graves na sua entrevista. Quem defende o relatório do Aldo Os maiores beneficiários são os latifundiários. Um indicativo é que 15 deputados serão diretamente beneficiados, todos eles ligados a bancada ruralista, incluindo nomes "de peso" como Paulo César Quartieiro (DEM) e Sandro Mabel (GO). A agricultura familiar está apoiando a implementação da legislação prevista no Código Florestal, com a criação de um programa nacional de regularização ambiental em nível federal, enquanto o Aldo defende programas municipais e estaduais, sujeitos aos interesses da politicagem local. Já está mais do que evidente que o deputado e suas propostas não tem apoio da agricultura familiar e camponesa. Nem mesmo a Contag - que é a confederação dessas entidades citadas por Aldo - tem saído em público para defender o relatório do deputado. Continuar a defender isso é mais uma prova do jogo sujo e dos interesses escusos do deputado. Função social da propriedade O ataque de Aldo ao instituto Reserva Legal é a prova cabal de que o deputado Aldo Rebelo abandonou o comunismo. A RL é um dos cernes da função social da propriedade. É uma inovação progressista, garantida pelos setores mais avançados da sociedade brasileira às vésperas do golpe militar. A RL garante que, independente dos interesses privados, do lucro, cada propriedade deve ter uma parcela destinada ao uso sustentável, já que as florestas são interesse de bem comum à toda sociedade brasileira. Ou seja, o deputado Aldo defende o império da propriedade privada, o mesmo discurso das elites agrárias e seus representes, desde a UDR até a CNA. Quem mais preserva A Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da Universidade de São Paulo, realizou pesquisa em supercomputadores e concluiu que 57% das APPs estão preservadas, ou seja, 59 milhões de hectares. Olhando o mapa gerado, comparando com o IBGE, fica bastante evidente que as aglomerações de agricultura camponesa e povos originários é onde se encontra as áreas com maior taxa de preservação. Nós já defendemos o cálculo da APP como Reserva Legal. Isso já era permitido pelo atual Código, exclusivamente para a agricultura familiar. O difícil é o cumprimento disso por parte dos órgãos estaduais de meio ambiente, que normalmente são preservacionistas radicais. Mas não é nenhuma novidade o que o Aldo está trazendo. Políticas públicas Todo agricultor camponês tem seu pedaço de mata, pois usa para tirar remédios naturais, como fonte de lenha, de madeira para instrumentos e construções. Se existir uma política concreta, que possibilite o extrativismo dessas áreas, já está mais do que comprovado que essa área pode também ser uma importante fonte de renda diversificada para as famílias. A RL só não tem utilidade na lógica do agronegócio, que quer passar trator em tudo, jogar veneno em todas as áreas, transformar tudo em deserto verde e monocultura. Recomposição fora da propriedade É inaceitável a proposta de recompor ela em qualquer parte do mesmo bioma. O impacto agrário dessa medida será gigantesco. Latifúndios de São Paulo poderão comprar áreas no Paraná ou no Pernambuco, dizendo que estão recompondo suas RLs. Já é possível prever duas situações muito graves: as áreas da agricultura camponesa, normalmente mais baratas, sofrerão um grande aliciamento para serem vendidas e transformadas em RLs. Veremos uma nova expulsão em massa de camponeses. A outra é que latifúndios improdutivos poderão ser considerados como áreas de RL em recuperação, o que impedirá o processo de reforma agrária em várias regiões. Fonte: Cimi DF |
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