Por Tomás Balduino
Folha de São Paulo
Lideranças camponesas e indígenas estão apreensivas com o poder da senadora por sua atuação na demarcação de terras no Brasil
Eis o quadro: o pequeno agricultor Juarez Vieira foi despejado de sua terra, em 2002, no município tocantinense de Campos Lindos, por 15 policiais em manutenção de posse acionada por Kátia Abreu. Juarez desfilou, sob a mira dos militares, com sua mulher e seus dez filhos, em direção à periferia de alguma cidade.
O caso acima não é isolado. O governador Siqueira Campos decretou de "utilidade pública", em 1996, uma área de 105 mil hectares em Campos Lindos. Logo em 1999, uns fazendeiros foram aí contemplados com áreas de 1,2 mil hectares, por R$ 8 o hectare. A lista dos felizardos fora preparada pela Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Tocantins, presidida por Kátia Abreu (PSD-TO), então deputada federal pelo ex-PFL.
O irmão dela Luiz Alfredo Abreu conseguiu uma área do mesmo tamanho. Emiliano Botelho, presidente da Companhia de Promoção Agrícola, ficou com 1,7 mil hectares. Juarez não foi o único injustiçado. Do outro lado da cerca, ficaram várias famílias expulsas das terras por elas ocupadas e trabalhadas havia 40 anos. Uma descarada grilagem!
Campos Lindos, antes realmente lindos, viraram uma triste monocultura de soja, com total destruição do cerrado para o enriquecimento de uma pequena minoria. No Mapa da Pobreza e Desigualdade divulgado em 2007, o município apareceu como o mais pobre do país. Segundo o IBGE, 84% da população viviam na pobreza, dos quais 62,4% em estado de indigência.
Outro irmão da senadora Kátia Abreu, André Luiz Abreu, teve sua empresa envolvida na exploração de trabalho escravo. A Superintendência Regional de Trabalho e Emprego do Tocantins libertou, em áreas de eucaliptais e carvoarias de propriedade dele, 56 pessoas vivendo em condições degradantes, no trabalho exaustivo e na servidão por dívida.
Com os povos indígenas do Brasil, Kátia Abreu, senadora pelo Estado do Tocantins e presidente da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil), tem tido uma raivosa e nefasta atuação.
Com efeito, ela vem agindo junto ao governo federal para garantir que as condicionantes impostas pelo Supremo no julgamento da demarcação da área indígena Raposa Serra do Sol sejam estendidas, de qualquer forma, aos demais procedimentos demarcatórios.
Com a bancada ruralista, ela pressionou a Advocacia-Geral da União (AGU), especialmente o ministro Luís Inácio Adams. Prova disso foi a audiência na AGU, em novembro de 2011, na qual entregou, ao lado do senador Waldemir Moka (PMDB-MS), documento propondo a criação de norma sobre a demarcação de terras indígenas em todo o país.
O ministro Luís Adams se deixou levar e assinou a desastrosa portaria nº 303, de 16/7/12. Kátia Abreu, ao tomar conhecimento desse ato, desabafou exultante: "Com a nova portaria, o ministro Luís Adams mostrou sensibilidade e elevou o campo brasileiro a um novo patamar de segurança jurídica".
Até mesmo com relação à terra de posse imemorial do povo xavante de Marãiwatsèdè, ao norte do Mato Grosso, que ganhou em todas as instâncias do Judiciário o reconhecimento de que são terras indígenas, Kátia Abreu assinou nota, como presidente da CNA, xingando os índios de "invasores".
Concluindo, as lideranças camponesas e indígenas estão muito apreensivas com o estranho poder econômico, político, classista, concentracionista e cruel detido por essa mulher que, segundo dizem, está para ser ministra de Dilma Rousseff. E se perguntam: "Não é isso o Poder do Mal?" No Evangelho, Jesus ensinou aos discípulos a enfrentar o Poder do Mal, recomendando-lhes: "Esta espécie de Poder só se enfrenta pela oração e pelo jejum" (Cf. Mt 17,21).
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PAULO BALDUINO DE SOUSA DÉCIO, o dom Tomás Balduino, 90, mestre em teologia, é bispo emérito da cidade de Goiás e conselheiro permanente da Comissão Pastoral da Terra
No Acre, várias lideranças indígenas, agentes da CPT e missionários do CIMI se encontram sob ameaças de morte conforme denúncias apresentadas à 6ª Camara de Consiliação, em Brasilia, à Comissão de Direitos Humanos da Camara dos deputados e à Polícia Federal. Prova da disposição dos ameaçadores é que a sede da Comissão Pastoral da Terra, em Rio Branco, foi invadida por sete vezes em um ano. O mais grave é que em todos os casos, nenhuma medida efetiva foi tomada.
Não custa lembra que o vice-presidente diretor da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), Assuero Doca Veronez é também presidente da mesma confederação no Estado do Acre. Isso prova a força política que a confederação tem no estado.
Então, porque será que estas coisas estão acontecendo e ninguém fala nada? ao contrário, seguem querendo apresentar um Acre dos sonhos de fada enquantos os povos indígenas morrem por desassistência em todas as áres, especialmente na saúde. As escolas se encontram em total estado de abandono, a Funai, que deveria defender e zelar pelos direitos dos povos indígenas, segue deliberadamente inoperante e atrelada ao poder do estado e aos partidos de sustentação. Seguem os projetos de extermínio das comunidades tradicionais tais como exploração de petróleo e gás natural, manejo madereiro (in)sustentável, estrada inter-oceânica e estrada férrea entre Acre e Pucalpa, projetos de REDD e PSA entre outros instrumentos de extermínio.
Precisamos romper esse silêncio e fazer a voz rouca do campo ganhar as cidades, o país, o mundo, e darmos um basta a tantas violências e assassinatos.
Que a noite escura da dor e da morte, passe ligeira. Que os sonhos animem nossas consciências. Que luta redima nossa pobreza e que o amanhecer nos encontre sorridentes, festejando a nossa liberdade.
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