quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Indígena com câncer está morrendo abandonado em Feijó

Desde segunda-feira estou com uma equipe na Região de Feijó para uma visita aos povos indígenas. Ontem, terça-feira, dia 30, fomos surpreendidos com a informação de que um indígena já de idade avançada teria dado entrada no Hospital Regional de Feijó com uma imensa ferida aberta na face e que talferida estaria tomada por vermes (tapuru).

Infelizmente a noticia se confirmou. Fomos até lá e encontramos, já na casa de saúde indígena - CASAI- o senhor Eduardo Pereira Shanenawa de 81 anos abandonado em uma rede e com o rosto enfaixado, mas dava para perceber através das ataduras que de fato todo o rosto dele estava tomado pelo câncer que estava em estado muito avançado.

Conversei com a enfermeira responsável, já que o administrador da CASAI não se encontrava e a questionei sobre as condições do paciente. De fato o paciente não teria condição de estar ali. Ela se limitou a informar que nada poderia ser feito já que o hospital não o queria internado e o "liberou" para ir embora. Disse ainda que a CASAI estava procurando um local mais adequado para manter o paciente em tratamento.

Há mais de dois meses o senhor Eduardo encontrava-se abandonada na aldeia sem a visita de nenhum agente de saúde ou outro profissional. Seu Eduardo há meses fora encaminhado para Rio Branco mas não pôde fazer o tratamento porque, segundo informações obtidas com profissionais aqui em feijó, a CASAI de Rio Branco avaliou que o caso dele não teria mais jeito e, então, o mandaram de volta à aldeia.

Procuramos a direção do hospital para conversarmos mas o diretor e o enfermeiro que atendeu ao senhor Eduardo não se encontravam. O que mais intriga nesta história é o fato de nenhum agente de saúde estar prestando atendimento básico ao paciente, nem mesmo fazendo curativos.

A saúde indígena está um caos em todo o Estado do Acre. Lideranças de diversos povos estão acampadas na sede da Funasa, em Rio Branco, a quase um ano e as negociações não avançam. Pesa sobre as autoridades do setor gravíssimas acusações de desvio de verbas entre outras. Enquanto ninguém assume a responsabilidade, seguem as mortes e o abandono total dos pacientes indígenas.

Em vídeo publicado por este blog recentemente, os Senadores do Acre, respondendo a uma pergunta de um aluno de medicina, negam que a saúde indígena esteja um caos. Mas é só dar uma passada em qualquer uma aldeia ou CASAI para ver que os indígenas estão realmente morrendo à mingua.

Estamos subindo o Envira e ao retornar farei um relato completo e o apresentarei às autoridades para que tomem providências. Não publico as fotos e as filmagens adquiridas, em respeito aos pacientes, e por serem imagens absolutamente chocantes.

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Corrupção deve ser considerado crime hediondo

Tem uma enquete no site do Senado onde se pergunta:

Você é a favor ou contra o projeto que inclui os atos de corrupção na Lei dos Crimes Hediondos, que aplica punições mais severas aos condenados? (PLS 204/2011)

É só participar, se acha que vale a pena, ou ainda tem esperança.

Fonte: Blog do Noblat

domingo, 28 de agosto de 2011

Presidente da Funai leva puxão de orelha de Raoni

Imagem: Cuturas Populares


 
No ato de encerramento da Primeira Cumbre Regional Amazonica, evento promovido pela COICA - Coordenação das Organizações Indígenas da Bacia Amazônica, em parceria com a COIAB, que aconteceu de 15 a 18 de agosto em Manaus, para discutir alternativas para o combate ao aquecimento global,  o grande cacique Raoni Kayapó, lendário defensor do Xingu, deu um “puxão de orelha” no convidado da mesa, o Sr. Márcio Meira, presidente da FUNAI, e deu a ordem final, mandando ele sair da presidência do órgão indigenista oficial brasileiro.

“Tem que sair, você tá matando os povos indígenas. Tem que colocar outra pessoa que se preocupe com a gente”, afirmou o grande cacique Kayapo, puxando a orelha do Meira.
 
Fonte: Graça Graúna

Jorge Viana Critica os "Jaminawa" em rede nacional


Neste video, o ex-governador e agora senador pelo PT do Acre, Jorge Viana, conhecido por se apresentar como criador do modelo administrativo apelidado de "florestania", em oposição à cidadania, onde supostamente incluiria os habitantes da floresca, como seringueiros e indígenas, mostra que não tem muita proximidade com os povos indígenas do Acre.

O vídeo foi gravado do programa Assunto de Estado, exibido pela TV Senado, mas só agora publiquei aqui no blog e no You Tube. Demorei a publicar porque fui primeiro ouvir a posição dos "Jaminawa".

Coloco Jaminawa entre parênteses porque na verdade não se trata de um povo só. Os Chamados Jaminawa, são na verdade quatro grandes famílias distinta entre sí, mantendo quase que a mesma língua, há apenas diferenças dialetais.

Esses índigenas não possuem território demarcado, ao contrário do que quer fazer crer o Senador. Não possuem nenhuma assistência, ou quase nenhuma, do poder público. Há muito tempo estamos denunciando a situação de abandono vivida por aqueles indígenas e nenhuma providência foi tomada. Recentemente o Cimi entrou com um pedido junto ao Ministério Público Federal para que este obrigue a Fumai a demarcar as quatro terras indígenas destinadas a eles.

O processo de demarcação de terras no Estado do Acre está paralisado justamente desde o tempo em que Jorge Viana era governador. A pergunta que temos que fazer ao ex-governador é: porque os processos de demarcação de terras indígenas no Estado do Acre foram paralisados?

A Funai, no Acre, continua inoperante e servindo apenas como espaço para políticas menores com profunda ingerência de setores ligados diretamente ao governo do Estado. Enquanto isso, os indígenas se encontram em abandono nos mais diversos setores:

Saúde: Há quase um ano lideranças indígenas de diversos povos estão acampadas na sede da Funasa, em Rio Branco sem serem ouvidos e sem terem suas reivindicações, justas, implementadas. O poder público, Funasa, prefeituras e conveniados, é acusado pelos indígenas de desvio de verbas destinadas à saúde indígena além de má gestão.

Educação: As escolas estão abandonadas, principalmente as que ficam nos altos rios, longe da vista dos formadores de opinião. Recentemente ganhou visibilidade o estado de abandono das escolas do Alto Rio Envira, escolas dos povos Ashaninka e Madjá. Além disso, há a desassistência pedagógica. Este abandono da educação é objeto de ação do Ministério Público Federal.

Produção: Não há nehum programa de assistência à produção e menos ainda destinado ao transporte da produção. O que ocorre quase sempre é que as prefeituras, mais próximas da comunidade e que depende dos produtos produzidos na terra indígena, fornecem barcos mas que não são entendidos dentro de um programa mais amplo e duradouro.

Demarcação e defesa de território: Como já disse, todos os processos que visam a demarcação de terras indígenas no Estado do Acre estão paralisados desde o governo do Jorge Viana. Para piorar, quase todas as terras já demarcadas se encontram invadidas e não há nenhum programa que vise a segurança das terras e menos ainda da população que habita estas terras.

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Bom viver para todo o mundo

O texto a seguir foi escrito Marcelo Barros, brilhante como monje, escritor, Cristão e defensor dos seres vivos como filhos de Deus e unidos na natureza. O texto foi publicado na agência de notícias Frei Tito - Adital, e vale a pena ler como proposta do Bem Viver para todos e para sempre!

Marcelo Barros
 
Em julho, os povos indígenas da Ameríndia recordam a figura de Bartolomeu de las Casas, o primeiro bispo católico que ainda nos primeiros tempos da colonização assumiu o papel de defensor dos índios contra os conquistadores. Este primeiro bispo de Chiapas, no sul do México, faleceu no dia 17 de julho de 1586. Nos Andes, um encontro de povos indígenas propõe ao mundo que, para salvar o planeta Terra, a humanidade deveria aprender o Bom Viver como regra ética e critério de organização das sociedades. É o Suma Kwasay dos quétchuas, ou o "Suma Kamana" dos aymara. O povo Guarani o chama lekil Kuxlejal, sinônimo de "vida boa". Significa o que hoje denominamos de "qualidade de vida" e o Evangelho chama de "Vida em plenitude" (Jo 10, 10).

O mundo capitalista sempre prometeu às pessoas a possibilidade de se viver melhor e fala em otimização da produção e do trabalho. Os povos tradicionais não querem apenas isso. Almejam transformar profundamente o modo de viver. Priorizam a sacralidade da vida humana e de todos os seres vivos. Compreendem isso como compromisso de viver de modo sadio, feliz e harmonioso consigo mesmo, com os outros humanos e com todos os seres vivos. Para os povos tradicionais, não é um ideal irrealizável e sim uma utopia possível que temos de construir.

Antigamente, nas comunidades andinas, o bom viver era um método de vida e espiritualidade social. Com a invasão da cultura individualista e do consumo, para que alcancemos novamente este ideal, precisamos nos apoiar em um conjunto de princípios, critérios e iniciativas como alternativas ao tipo de desenvolvimento que privilegia o econômico, sem levar em conta a dimensão humana, social e ecológica. A Bolívia e o Equador inscreveram o bom viver nas suas constituições, como objetivo do Estado. Nestes países, inúmeras conferências e congressos procuram aprofundar um conhecimento cultural das diversas tradições indígenas. Garantindo, assim, uma conduta ética e espiritual que fundamente uma sociedade dirigida à realização de cada pessoa na comunidade e, a partir do cuidado social, garanta o equilíbrio nas relações entre as pessoas, povos, assim como com a Mãe Terra e toda a natureza.

Na sociedade capitalista, o desenvolvimento dos países era calculado pelo Produto Interno Bruto (PIB). Na década de 90, o economista indiano Amartya Sem propôs como critério o "Índice de Desenvolvimento Humano". Isso significa levar em conta não só o aspecto econômico, mas a saúde, educação e liberdade social de cada povo. Já em 1970, no Bustão, país pouco conhecido da Ásia, o príncipe Jigme Singye Wangchuck propôs como critério de classificação, não a produção econômica e o desenvolvimento social, mas o "Índice de Felicidade interna", qualidade de vida digna, baseada nos princípios espirituais do Budismo. A questão é como avaliar o grau de felicidade de uma comunidade e das pessoas na sociedade. Uma ONG inglesa (Friends of the Earth) publicou uma série de itens para medir o grau de felicidade coletiva. Alguns destes elementos são: saúde, estabilidade social, possibilidade de vida familiar, condições saudáveis de trabalho, liberdade e lazer. No começo deste século, esta ONG elaborou uma pesquisa na qual, segmentos da população de vários países responderam a um questionário. Além disso, estas famílias foram visitadas por voluntários que também se pronunciaram sobre as condições de vida nestes países. Os povos que se destacaram pelo índice de felicidade foram pequenos países como Costa Rica, estado desmilitarizado e relativamente pobre, a Colômbia depois da pacificação de sua guerra civil e mesmo Cuba, vítima do bloqueio americano. O povo brasileiro foi considerado dos mais felizes, apesar de tantos problemas sociais e políticos que enfrentamos. Nenhum país rico do G8 aparece na lista dos mais felizes. Os Estados Unidos ocupam o posto 150, igual ao Zimbabue, país africano pobre e ainda imerso em conflitos raciais.

Apesar de que existem grupos religiosos capitalistas que fazem do lucro e da prosperidade econômica um sinal de bênção divina, as grandes tradições espirituais sempre chamaram as pessoas a valorizar mais o ser do que o ter. No evangelho de Mateus, em seu primeiro discurso público, Jesus proclama oito bênçãos, bem-aventuranças ou situações de felicidade (Mt 5, 1- 12) e no evangelho de João, ele afirma: "Eu vim ao mundo para que todas as pessoas tenham vida e vida em plenitude" (Jo 10, 10).

Fonte: Adital

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Para além do “desenvolvimento sustentável”

Tenho a honra de publicar mais um excelente texto de Israel Sousa, que também foi publicado no Blog Insurgente, um dos poucos espaços realmente "livres" e democrático - não burguês- de nossa região Amazônica. Deliciem com o texto e ajudem a partilhar idéias.


O Projeto de Lei Complementar 30/2011, a partir do qual se forja o Novo Código Florestal brasileiro, mobilizou poderosas forças políticas, dividiu opiniões, suscitou violência e resistências. Do lado dos que dirigem criticas ao projeto, destaca-se a atuação do Comitê Brasil em Defesa das Florestas e do Desenvolvimento Sustentável, responsável pela elaboração do Manifesto em Defesa das Florestas e do Desenvolvimento Sustentável, já assinado por quase uma centena de organizações. Algumas delas de grande peso, como CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), ABI (Associação Brasileira de Imprensa), CONIC (Conselho Nacional das Igrejas Cristãs do Brasil), CTA (Centro dos Trabalhadores da Amazônia), CUT (Central Única dos Trabalhadores) etc.

Trata-se de uma atitude corajosa, a do Comitê. Sobretudo nesse momento em que aqueles que alertam para os riscos do projeto de crescimento econômico do governo brasileiro são tratados como “agentes” a serviço de interesses estrangeiros. Alguns são “demonizados”, até. Mas em nome de quê a resistência? Qual o alicerce? É realmente uma alternativa?

A primeira pergunta é de fácil resposta. A resistência é em nome da defesa das florestas e do “desenvolvimento sustentável”, como denota o nome do comitê. Por isso, consta no Manifesto: “É mais do que hora de o País atualizar sua visão de desenvolvimento para incorporar essa atitude e essa visão sustentável em todas as suas dimensões”. E ainda: “Devemos aproveitar a discussão do Código Florestal para avançar na construção do desenvolvimento sustentável”.

Salta aos olhos o fetiche de que é objeto o “desenvolvimento sustentável”, que, antes de ser “sustentável”, é “desenvolvimento” e é capitalista. Remendo novo em pano velho. Expressão de um sistema expansionista e de uma classe que, por paradoxal que seja, se guia pela perspectiva de curto prazo mas projeta seus interesses no infinito. Assim o “desenvolvimento”, uma das variantes que o capitalismo assumiu no pós-Segunda Guerra. Quando, na década de 1970, as mudanças climáticas e a depredação ambiental do “desenvolvimentismo” mostraram-se insofismáveis, foi posta em marcha uma “operação salvamento”. 

Naquele momento, em que aflorava a “consciência ambiental”, a saída foi agregar o “sustentável” ao “desenvolvimento”. Dessa forma, o capitalismo ganhou uma ideologia poderosíssima, passando a operar encoberto pelo manto da “sustentabilidade”. Seguido pelo “sustentável”, o “desenvolvimento” passou a ser encarado não apenas como “ambientalmente correto”, mas como uma (para muitos, a única) força-projeto capaz de salvar a vida no planeta. Como que por força de uma “alquimia dos avessos”, o capital já não era a ameaça, e sim a salvação. 

Empunhando a mesma bandeira clorofilada, os países centrais passaram a ditar aos países periféricos, por vias diversas, as políticas a serem adotadas no sentido de preservar a natureza. Lograram, assim, embotar a soberania destes sobre seus territórios e bens naturais. Em paralelo, intensificaram o processo de mercadificação da natureza e de espoliação das populações locais.     
      
De maneira um tanto controversa, o Comitê aqui em foco reproduz e alimenta esse estado de coisas. Cala sobre a natureza intrinsecamente predatória do sistema do capital e trata a tudo como se fosse, basicamente, uma questão de escolha entre “boas” e “más” “opções desenvolvimentistas”. Todavia, é mister dizer que o “desenvolvimento sustentável” não é senão capitalismo. Como tal, ele está voltado para a produção de “valores de troca” e, portanto, para as necessidades do sistema e não das pessoas.

Como se pouco fosse postular a eternização do sistema, o Manifesto aqui citado chega a fazer apologia à competição intercapitalista: “o grande trunfo do Brasil para chegar a ser potência é a sua condição ambiental diferenciada”. Ora, e a competição não é, em larga medida, responsável pelos problemas ambientais que hoje nos ameaçam? Não é por causa dela que os diversos países lançam mão de todos os meios a seu alcance para se afirmar diante dos outros? E não é pelo mesmo motivo que os maiores poluidores do mundo se negam a assinar acordos que limitem a atuação de suas indústrias?  

Parece trata-se, como se vê, de deixar as questões de fundo, as que realmente interessam, intocáveis, impronunciáveis. Toma-se como quadro inelutável o atual sistema econômico. E a natureza é, ainda que de forma sutil, tratada como lenha a ser queimada no forno da locomotiva da acumulação capitalista.

Outra coisa digna de atenção no Manifesto é a crença no poder da ciência e da técnica. Em verdade, essa é a base em que ele se alicerça. Diz-se ali: “Tudo o que aqui foi dito pode ser resumido numa frase: vamos usar, sim, nossos recursos naturais, mas de maneira sustentável. Ou seja, com o conhecimento, os cuidados e as técnicas que evitam sua destruição pura e simples”.

            É prova de ingenuidade depositar no “conhecimento” as esperanças de preservação das florestas. Não é preciso ir muito fundo para saber que o papel que ele desempenha em nossa sociedade é mais que ambíguo. Com efeito, alguns chegam mesmo a atribuir ao progresso técnico-científico parte considerável - senão a totalidade - dos problemas ambientais. No entanto, importa ter presente que é temerário atribuir à ciência e à tecnologia, isolando-as do contexto social em que são produzidas e apropriadas, a culpa pelo problema e/ou a responsabilidade pela solução esperada e necessária. Nem Adão nem Cristo. Sozinhas, elas não geraram a queda (problema) e, da mesma maneira, sozinhas elas não serão capazes de trazer a redenção (solução). 

É louvável a resistência que, na defesa das florestas, o Comitê opõe ao Novo Código Florestal, congregando em torno de si dezenas de organizações. É lamentável, porém, que tal seja feito em nome do “desenvolvimento sustentável”. Isso atesta, eloquentemente, a fragilidade e a confusão que se abateram sobre as forças populares nos últimos anos. 

A manutenção de qualquer forma de “desenvolvimento” (neo, sub, pós, sustentável etc.) é a manutenção do próprio capitalismo. Ou seja: é a manutenção de um sistema que, por natureza, gera desequilíbrio nas mais variadas esferas da vida: política, social, econômica, ecológica etc. A crise que hoje assombra a Europa e os EUA (e o mundo) bem mostra que os senhores do dinheiro preferem sacrificar nações inteiras a abrir mão do lucro. Nada indica que a natureza receberia tratamento diferenciado.  

Muitos são os que têm alertado para a imprevisibilidade da crise em curso. O capitalismo parece realmente ferido de morte. Mas ameaça levar-nos a todos de roldão. Esse momento deve ser aproveitado não “para avançar na construção do desenvolvimento sustentável”, mas para buscar alternativas civilizacionais ao sistema econômico vigente. Nesse sentido, é imperativo ir para além do “desenvolvimento sustentável”. Ou, para dizer com István Mészáros, é preciso ir “para além do capital”.
O Autor é Cientista Social, Mestre em Desenvolvimento Regional pela Universidade Federal do Acre (UFAC) e membro do Núcleo de Pesquisa Estado, Sociedade e Desenvolvimento na Amazônia Ocidental – NUPESDAO.

''O governo falseia a realidade'', afirma dom Erwin Kräutler

Por Aline Scarso
Brasil de Fato

A ministra do Planejamento, Miriam Belchior, disse nesta segunda-feira (22) que todos que possuem uma visão técnica, e não ideológica, serão convencidos da viabilidade e necessidade da hidrelétrica de Belo Monte, no Rio Xingu, no Pará. Segundo a ministra, Belo Monte será exemplo de implantação de usinas hidrelétricas na região Amazônica, com respeito social e ambiental. Em resposta à ministra o presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) dom Erwin Krautler afirmou que o governo "falseia a realidade".

As declarações foram dadas durante evento com o tema: "Hidrelétricas: as necessidades do País e o respeito à sustentabilidade”, promovido pela revista Carta Capital em São Paulo. A ministra ainda adiantou que o governo deve divulgar uma portaria, em setembro, com objetivo de acelerar os processos de licenciamento ambiental para as futuras hidrelétricas.

A portaria, segundo Belchior, deixará mais claras as condicionantes ambientais que deverão ser cumpridas pelos consórcios. A nova determinação deve gerar ainda mais atritos com movimentos sociais da região amazônica. A região, que abriga áreas de unidades de conservação ambiental e terras indígenas, também possui grande capacidade de aproveitamento hidrelétrico. 

Protestos são “de minoria”

Assim como a ministra, o presidente da Empresa Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim, desqualificou as manifestações contrárias à obra que ocorrem de forma intensificada desde o último ano. Segundo ele, o governo não tem a visão de que a população de Altamira, e dos outros dez municípios que serão afetados pela inundação, é contra Belo Monte. 

“Belo Monte será um resgate social e ambiental da região. A maioria da população tem defendido Belo Monte porque sabe que a usina vai melhorar as condições de vida dela. [A rejeição] é totalmente minoritária. Alguns grupos extremistas estão fazendo confusão”, afirmou o presidente da EPE. 

Sobre os protestos internacionais que ocorrem nesta segunda-feira (22) em dezesseis países, Tolmasquim afirmou que “há desconhecimento” sobre os benefícios que a usina trará a região. Durante o evento, Tolmasquim e o diretor da Eletrobras, Valter Cardeal, lembraram que o projeto original, que previa inundação de 1.600 km², teve que ser revisto para diminuir os impactos sócio-ambientais. Isso significou, segundo eles, a perda da capacidade instalada da hidrelétrica e de receita orçamentária.

Governo falseia a realidade

Com a previsão de inundar 503 km² de área na região amazônica, as obras de Belo Monte já se iniciaram. O Consórcio Norte Energia será responsável pela construção, orçada em R$ 26 bilhões. 

De acordo com estimativas da Eletrobras, pelo menos 96 mil pessoas irão se deslocar para a região, o que aumentará a demanda por serviços básicos, como saúde e educação, dos quais a região já é carente. Outras 40 mil pessoas deverão se deslocar de suas terras, que serão inundadas pela barragem. Populações indígenas e ribeirinhas sentirão os impactos em seu modo de vida com diminuição da oferta de água pelo Xingu.

Para denunciar esses impactos, manifestantes de 18 cidades espalhadas por 15 estados realizaram atos no último sábado (20) contra a construção da hidrelétrica. Somente em São Paulo, pelo menos mil pessoas saíram às ruas da Avenida Paulista, onde queimaram um boneco simbolizando o presidente do Ibama, Curt Trennepohl.

Trennepohl disse recentemente a uma jornalista australiana, sem saber que estava sendo gravado, que o Brasil irá acabar com os indígenas assim como a Austrália fez com os aborígenes.

Para o presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Dom Erwin Krautler, o governo falseia a realidade ao dizer que os protestos contra a obra são de uma minoria. Krautler, que vive em Altamira, disse que há muita insegurança na região. “As manifestações de Altamira nunca foram ideológicas, mas são de um povo que será afetado, que está desesperado, fugindo de suas casas e invadindo terrenos alheios”, afirma o missionário.

Ele conta que o preço das indenizações pagas para que os moradores deixem suas terras são somas irrisórias. Quem opta por uma casa nova custeada pelo governo, não sabe onde vai morar. Já as populações indígenas e ribeirinhas estão extremamente preocupadas com a diminuição do fluxo de água, o que deve também motivá-las a mudarem do local.

“A política do governo é um fato consumado. O governo não entra em diálogo. É a política do rolo-compressor, do vale-tudo contra o povo envolvido. Então defendem a usina com unhas e dentes e ainda tacham as manifestações contrárias de ideológicas”, defende o missionário.