Atento às informações que nos chegam sobre o presídio Francisco de Oliveira Conde, tive a impressão de que, guardadas certas diferenças, ele é uma síntese de nossa sociedade e muito diz a respeito do modo como ela vem sendo administrada.
Como argumentamos em textos anteriores (ver Dossiê-Acre), o Acre é o estado mais desigual da Amazônia e o segundo mais desigual do país, perdendo, neste quesito, apenas para o Distrito Federal. Entre todas as capitais brasileiras, Rio Branco ficou em penúltimo lugar no que diz respeito aos indicies de inclusão social (ver Revista Cidadania & Meio Ambiente: caminhando junto com a sociedade. Câmara Cultura: Nº 41, Ano VII – 2012, p. 37).
Como se vê, apesar de todo o falatório sobre o desenvolvimento local, a política social no Acre é um verdadeiro fracasso (ver “Depois de mim, o dilúvio”: o “círculo vicioso” da dívida pública no Acre). Não foi por acaso que chegamos a ter - para nossa desonra - proporcionalmente o maior número de detentos do país, pois os que não eram alcançados pelas políticas sociais ficavam por conta do sistema prisional. Agora, porém...
E, para não deixar dúvida, digamos de uma vez: ter a maior população carcerária do país, em termos percentuais, não representa o êxito da política de segurança, mas o fracasso das políticas de inclusão social em nosso estado.
Além disso, o sistema prisional diz muitas outras coisas sobre nossa sociedade e o modo pelo qual ela é administrada. Ali, os trabalhadores vivem de pires na mão, denunciando as precárias condições de trabalho e a ausência de segurança. E a administração ou os ignora ou os trata a ferro e fogo. Outra marca do modus operandi da administração é tentar ocultar o caos ali instalado e afirmar num tom quase angelical que “está tudo sob controle”.
A falta de condições ali é tanta que alguns detentos resolveram eles mesmos bancar uma reforma em suas celas. Quanto a isso, Dirceu Augusto, diretor do IAPEN (Instituto de Administração Penitenciária) disse ser “normal”, pois o “Estado deve” e “eles (os detentos) podem”.
Lá dentro como cá fora, o Estado deve, mas não faz. Lá como cá, um sem-número de indícios e denúncias de corrupção. Dentro como fora, o crime impera e nem todos pagam pelo que fazem ou pelo menos não pagam como deviam; e outros, os menores, pegam até pelo que não devem. Ali como aqui, sobra descaso...
Mesmo que já haja muito bandido solto, causa temor a interdição de parte do presídio. Todavia, parece que ali - como aqui - a situação se tornou insustentável. Há coisas que nem mesmo muita maquiagem consegue ocultar. E se a situação continuar assim? Será que chegaremos a uma situação que obrigue a Justiça a interditar o presídio por completo? E se isso acontecer, os criminosos ficarão soltos como aconteceu e acontece em outras cidades brasileiras?
Embora sabendo que esta é apenas mais uma trapalhada do governo (ver Tião, um governo trapalhão... e déspota), confesso que fui tentado a andar com um apito no bolso ou pendurado no pescoço, como se carregasse um amuleto. Não fosse perigoso, talvez eu andasse com um. Já que nosso sistema prisional - como a administração de nossa sociedade - está falido, só muita fé, um tanto de sorte e um apito com poderes mágicos para nos livrar de todo o mal e da bandidagem toda à nossa volta.
Sinto que aquilo que há anos Renato Russo cantava vale hoje para muitos acreanos: “Vamos sair, mas não temos mais dinheiro. Os meus amigos todos estão procurando emprego. Voltamos a viver como há dez anos atrás, e a cada hora que passa envelhecemos dez semanas... (Teatro dos vampiros)”.
[1] Cientista Político e Mestre em Desenvolvimento Regional pela Universidade Federal do Acre, e pesquisador do Núcleo de Pesquisa Estado, Sociedade e Desenvolvimento na Amazônia Ocidental (NUPESDAO). E-mail: israelpolitica@gmail.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário