Emília Altini vice-presidente do Cimi |
Em um saboroso, belo e animado bate papo com
Emília Altini, às vésperas de
seguirmos para a cúpula dos povos, ela gentilmente me concedeu uma entrevista
onde abordou temas considerados relevantes para o entendimento das políticas
indigenistas em nosso país.
Com fala mansa, simples e
prestativa, Emília, Catarinense/Rondoniense, como se define hoje, é uma
religiosa da Congregação das Irmãs Catequistas Franciscanas, e nos fala como
chegou a assumir a vice-presidência do Cimi – Conselho Indigenista Missionário,
justamente no ano em que a entidade completa seus 40 anos de atuação junto aos
povos indígenas.
Sua simplicidade se explicita já
no começo da conversa quando pergunto sobre como eu a deveria tratar, se de
senhora ou você. Ao que me respondeu da seguinte forma:
“Quanto ao tratamento está bem, mas pode me chamar de você é mais familiar e popular. Não me parece que tenho em mim a arte de ser senhora. O exercício do poder para mim sempre é um serviço. Colocar-se a serviço e estar disponível com suas forças e capacidades. Assim estou.”
“Quanto ao tratamento está bem, mas pode me chamar de você é mais familiar e popular. Não me parece que tenho em mim a arte de ser senhora. O exercício do poder para mim sempre é um serviço. Colocar-se a serviço e estar disponível com suas forças e capacidades. Assim estou.”
Como a entrevista foi feita antes
da participação na Rio +20, devo explicar ao leitor que a participação do Cimi
se deu na Cúpula dos Povos, Acampamento Terra Livre, que ao final foi publicado
um documento o qual está disponível neste Blog com o título: Declaração Final do IX Acampamento Terra Livre – B...
1.
Como a senhora chegou ao trabalho indigenista do Cimi?
Iniciou seu trabalho no setor de Educação Escolar Indígena |
Senti chamada para o serviço do indigenismo, na
década de 90.Como sou religiosa por vocação posso dizer que nela me sinto
realizada e feliz. Sou da Congregação das Irmãs Catequistas Franciscanas,
congregação de fundação Brasileira, numa cidade chamada Rodeio SC. Sou
Catarinense de nascimento, mas hoje me considero Rondoniense por escolha
missionária. Cheguei em Rondônia em maio de 1980. Para me auto sustentar
assumi trabalho no governo na área da Educação – escolar, na função de
Orientadora Educacional, como servidora federal. Na época Rondônia era
Território era uma das áreas mais necessitadas do momento. No processo de conhecimento da realidade fui
me apaixonando pelo contexto do diferente. Em 1990 com a passagem da Educação
Escolar Indígena que estava nas mãos da FUNAI, fui convidada pela coordenação,
do Regional do Cimi, daquela época, para coordenar na Secretaria do Estado-
SEDUC o programa de Educação Escolar Indígena que ora se instalava. Fui fazendo
a Experiência, gostando , aprendendo com os povos e com os missionários do Cimi
e em 1994, quando com o nosso grupo de irmãs celebramos os 25 anos de presença
nessa região norte, a questão indígena foi assumida como área missionária com
presença permanente, na perspectiva do trabalho do Cimi. Desde então assumimos,
eu e mais uma irmã, a Educação Escolar Indígena como meta para estarmos junto
com o povo e demais povos da região, onde estou até hoje, com garra coragem e
convicção.
2. Na última assembléia do Cimi a senhora foi eleita vice-presidente. Como está sendo para a senhora, uma mulher, assumir a vice-presidência de um organismo tão importante da CNBB? A senhora é a única mulher na história do Cimi a se tornar vice-presidente?
Emilia, D. Erwin e Cléber - presidência do Cimi |
No serviço missionário de Vice-presidente do Cimi,
eu não sou a primeira, já tivemos na década de noventa uma primeira experiência
dentro da Entidade. Digo que não é uma das funções mais fáceis. Tem um valor de
responsabilidade muito grande. Mesmo antes de assumir não deixei de dizer das
minhas inseguranças no dominio da compreensão política da entidade, revelei
sempre uma preocupação no desempenho dessa função. Assumi acreditando na corresponsabilidade mútua
e contribuir dando de mim o que sou capaz e posso. Reconheço que não seria a pessoa mais indicada
para essa função. Estou na caminhada,
fazendo caminho, às forças da diversidade que somos, agrupadas na unidade
construiremos juntos o espaço do Bem Viver
tornando o Cimi, a partir do protagonismo dos povos indígenas que se
revigoram de norte a sul, o organismo da
Igreja que acena para o novo construído na certeza e na esperança de ver
nascer devolver a terra para as mãos dos
povos Indígenas.
3. Este ano o Cimi completou 40 anos de existência, como a senhora avalia a caminhada e quais as perspectivas? Quais eventos ocorrerão dentro das comemorações?
A caminhada de 40 anos do Cimi, como ação
missionária junto a causa indígena, aponta hoje para um novo cenário político,
nas esferas municipal, estadual e federal, onde os povos por meio de suas
lideranças, organizações e movimentos tem tido uma força junto aos mais
diversos poderes que demandam sobre seus direitos: a terra/Território; a
Educação Específica e diferenciada, Saúde na valorização do uso alternativo da
sua medicina tradicional , na resposta em valorizar o conhecimento e as práticas tradicionais da
cura por meio do uso de suas ervas medicinais e a liberdade de suas expressões
religiosas, culturais e na organização e estrutura de uma política interna e
específica de cada povo. O Cimi celebra esses 40 anos de cabeça erguida, por
ter respondido com convicção e garra aos anseios dos povos na defesa de seus
direitos garantidos constitucional mente. Estamos avaliando nossa caminhada
missionária e de 20 a 23 de Novembro vamos culminar a continuidade da
celebração de ação de graças com o Congresso Nacional dos 40 anos. Que os povos
indígenas nos digam o quanto nos ensinaram, com eles, aprendemos a luta, a
resistência, de jamais entregar, por que a luta não se perde se reconstrói e se
retoma. Os quarenta anos se passaram no aprendizado e na troca de forças de
saberes e fazeres culturais. As agressões, criminalização e os roubos por meio
do desmatamento dos territórios tradicionais nos energetizam das forças
acampadas pelos espíritos dos ancestrais que sinalizam que a terra é dos povos
indígenas e a eles deve ser devolvida.
4. Como será a participação do Cimi na cupula dos povos, Rio + 20?
Será uma participação ativa, atenta respondendo aos
apelos e desafios que se apresentam no decorrer das discussões e decisões
provocadas pelos povos que aí se juntam a tantas outras forças populares que
buscam debater os assunto da Rio+20, mas
com perspectiva e propostas que nasce da base e da experiência vivida pelos
povos e populações tradicionais. O papel do cimi sempre foi de escuta, apoio e
assessória quando as necessidades são para atender a maioria do povo.
5. O Cimi já publicou uma nota questionando os PSA, REDD. Como a senhora vê os contratos que algumas comunidades indígenas estão assinando com algumas empresas?Qual a responsabilidade da Funai nestes casos?
Eu penso que isso trás presente uma política interna
do povo. O povo hoje, que é ameaçados por esses projetos de carbono, realmente
demanda sobre uma questão que o próprio povo como um todo desconhece o que está se passando e o
que isso implica na vida da comunidade. A política que demanda sobre esse tipo
de atividade que se apresenta como uma alternativa de sustentabilidade para os
povos ela é uma farsa. No interior das aldeias, um grupo do povos vive em
estado de miséria e abandono. A FUNAI muitas vezes está por trás dessa política
enganosa e descabida para a população como direito de ter uma participação de
igualdade sobre o recurso proveniente do contrato assinado entre ambas as
partes, FUNAI, Lideranças e porque não citar aqui algumas ONGs. As notas do
Cimi sempre vêm contrapondo essa política de pressão e dominação sobre os povos
envolvidos por acreditar que os povos estão num momento da história, que os faz
ser autônomos e capazes de agirem sobre seus atos e ações com sabedoria e
clareza.
6. Como a senhora avalia a conjuntura nacional e internacional em relação aos povos indígenas?
A conjuntura indigenista nacional está pensada para
atender as demandas dos ruralistas, com os programas de aceleração do “crescimento”,
do agronegócio, agropecuária e todos os demais agros que nascem a partir das
demandas do poder político e econômico, opressor e esmagador da liberdade das
populações indígenas mais atingidas terem o direito de serem ouvidos e
participarem das discussões como cidadãos e cidadãs capazes. Não se pode perder
de vista a certeza e a esperança, porque os povos sempre revelaram sua força de
demonstrar com ações o que lhes pertencem e com sabedoria retalharem a política
de desdém a ordem do uso da justiça e do poder em detrimento aos direitos que
lhes é devido. A questão da conjuntura internacional está respaldada pela
experiência do movimento das classes trabalhadoras que em suas lutas agem e reagem as política
que ferem a vida e a dignidade aos seus direitos. Tem que se ater neste campo
da conjuntura internacional os diferentes grupos populares que somam nas suas
posições políticas na defesa dos povos
mais pisados, machucados e desprovidos de condições econômicas, mas não de
condições de elementos que garantem o saber e o viver na partilha e na luta de
resistência, por direto, igualdade e justiça. A conjuntura é mutável. As
populações se mantêm permanentes e
constantes na busca do que lhes pertence por tradição e originalidade.
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