segunda-feira, 31 de outubro de 2011

ALGUMA COISA ESTÁ FORA DA ORDEM...


  • Historicamente, segmentos progressitas e de esquerda sempre defenderam a solidariedade entre os povos como um valor da mais alta relevância. Da mesma forma, muitas lutas sociais ganharam mais vigor com o apoio recebido de "fora". Vide o recente caso dos(as) bolivianos(as) na sua luta contra a construção da rodovia que iria atravessar o Território Indígena Parque Nacional Isiboro Sécure (TIPNIS), cujo apoio internacional e de diferentes setores da Bolívia foram importantes para que o governo suspendesse a obra diante de tanta pressão interna e externa. A mesma coisa podemos dizer sobre a resistência a Belo Monte, no Pará. Agora, imagine se de repente todos(as) nós pudéssemos emitir opinião, questionar, denunciar, se solidarizar ou propor apenas sobre o que dissesse respeito ao local onde vivêssemos? O que seria da ciência? O que seria da Filosofia? O que seria do pensar? O que seria da luta social? Uma coisa é certa: seria a morte da política e de valores nobres como a solidariedade. Essa visão obscurantista deve ser combatida com todas as forças sob risco de termos de abrir mão de conquistas obtidas com muitos sacrifícios. Por incrível que pareça algumas pessoas advogam atualmente a tese de que não "fale nada do meu lugar se você não mora aqui" para repelir o contraditório e a crítica - mesmo que embasada em fatos, números, relatos ou denúncias.
  • Esse forma de pensar é, em sua essência, autoritária, pois ela advoga para si o poder de determinar - a priori - quem é responsável e irresponsável na defesa de determinados pontos de vista, ou sobre quem perdeu ou não "o bonde da história", mesmo que estejamos em tempos de "trêm bala". Ora, qualquer posicionamento político, estudo, análise, documento ou carta aberta representará sempre o pensamento de uma parte da sociedade. Se o/a outro(a) não representa a totalidade - o que é simplesmente impossível - significa que o meu posicionamento tem esse poder? Logo se vê que tal argumento não encontra guarida sob qualquer perspectiva que o mesmo seja enfocado.
  • Bem, agora além dos inúmeros muros que se levantam - ou se levantaram - no mundo (de Berlim, de Israel em relação aos palestinos, o da fronteira entre o EUA e o México, além das barreiras políticas, ideológicas, econômicas e outras) nos querem impor a barreira geográfica para definir quem pode ou não debater determinados assuntos. Sendo assim ficamos terminantemente proibidos de refletir, questionar, ou quem sabe, elogiar, a execução de políticas públicas, como as do Acre, pelo simples fato de não morarmos lá. Seguindo esta linha de raciocínio não poderei mais continuar meus estudos sobre as repercussões das hidrelétricas do rio Madeira sobre as populações e o ambiente (do Brasil e da Bolívia) porque, infelizmente, resido no Pará.
  • Por que é leviano questionar as ações do governo acreano voltado ao fortalecimento da economia verde? Qual é o problema? Se não é verdade porque simplesmente não se apresentam argumentos contrários que desconstruam a crítica, ao invés de buscar desqualificar quem apresentou as mesmas? A questão central é: apostar no mercado de carbono, REDD e outras "alternativas" desse tipo é contribuir de alguma forma para a mercantilização da natureza. Pode-se argumentar contrariamente, mas será preciso lutar contra fatos nada desprezíveis.
  • Dentro da própria Universidade Federal do Acre (UFAC), somente para citar um único exemplo, há quem questione as ações do governo estadual em relação às suas políticas de REDD e de fortalecimento do mercado de carbono, alegando que isto não trará benefícios às comunidades locais. Eles também são irresponsàveis? Ou somente eles podem realizar a crítica já que moram no Estado (mesmo que não lhes sejam ouvidos os argumentos)?
  • Ningúem em sã consciência, morando ou não no Acre, desconhece os avanços alcançados nesse estado nos últimos anos seja na área social, ou no atendimento de várias demandas da sociedade. Rio Branco é a expressão material de muitos desses avanços.
  • Quem porventura tiver acesso aos termos da Carta do Acre verificará que o enfoque são as políticas de REDD. O texto não se propôs em qualquer momento realizar uma crítica ao governo, mas a uma ação precisa da qual discordamos, inclusive várias organizações acreanas. Portanto, não há invencionices, má fé ou um complô de "direita" para colocar o governo estadual em situação delicada.
  • Por fim, ressaltar que os termos aqui expostos são de responsabilidade de seu autor na medida em que a mesma não resultou de debate no interior de qualquer coletivo.
Guilherme Carvalho
Doutorando do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA/UFPA) e integrante da Coordenação Nacional da Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais

Inoperância do governo permite o genocídio do último povo indígena isolado no Maranhão

A equipe do Cimi de apoio aos povos indígenas isolados reuniu-se em Porto Velho/RO nos dias 26 a 28/10/2011 para fazer uma atualização de dados e a partir deles analisar o contexto em que se encontram estes povos na Amazônia.

Chamamos atenção para o risco de morte dos indígenas Awá Guajá isolados, no Maranhão pela ação de madeireiros que deixam um rasto de destruição na ultimas florestas da região localizadas no interior das terras indígenas. Os madeireiros, respaldados por influentes forças políticas, constituíram um verdadeiro poder paralelo afrontando o Estado de Direito e ameaçando a todos que se contrapõem as suas práticas ilegais. Desdenham das forças de segurança que se revelam incapazes de combater os crimes e de por fim a invasão das terras indígenas.

Os Awá Guajá perambulam em 05 terras indígenas demarcadas, continuamente invadidas e depredadas por madeireiros, que abrem estradas no seu interior, expondo esses grupos a massacres, a contaminação por doenças e afetando diretamente os recursos naturais que garantem a sua sobrevivência.

Essa situação persiste e vem se agravando apesar das reiteradas denúncias encaminhadas pelos povos indígenas do Maranhão e das cobranças do Ministério Público Federal a Funai, Ibama e Polícia Federal que tem como atribuição garantir a proteção dos povos indígenas.

Assusta-nos a inoperância e a omissão do poder publico diante do extermínio anunciado dos Awá Guajá isolados e a sua indiferença em relação ao Poder paralelo instalado pelos madeireiros na região.

Diante dessa realidade de ameaça a vida e de flagrante desrespeito aos direitos dos povos indígenas e dos crimes ambientais no Maranhão rogamos por uma mobilização imediata do governo federal para por fim a exploração ilegal de madeira nas terras indígenas e a impunidade na região.

Porto Velho (RO), 28 de outubro de 2011.

Nota pública sobre a ocupação do canteiro de obras de Belo Monte

O canteiro da Usina Hidrelétrica de Belo Monte foi ocupado no início da manhã desta quinta-feira por cerca de 400 indígenas, pescadores, ribeirinhos e agricultores contrários à construção da obra devido aos graves impactos ambientais e violações de direitos humanos que marcam o processo de licenciamento do empreendimento. A decisão de ocupar o canteiro de obras foi aprovada coletivamente, em assembleia, por 700 representantes de comunidades locais que participaram de um seminário contra Belo Monte realizado esta semana na cidade de Altamira, no Pará.
Os manifestantes notificaram, através de carta e contato pessoal, representantes do Palácio do Planalto e outras autoridades do governo federal sobre a ocupação da usina. Segundo o documento enviado, “diante da intransigência do governo em dialogar e da insistência em nos desrespeitar, ocupamos o canteiro de obras de Belo Monte e trancamos seu acesso pela rodovia Transamazônica. Exigimos que o governo envie para cá um representante com mandado para assinar um termo de paralisação e desistência definitiva da construção de Belo Monte”.
Após 15 horas, o canteiro de obras da usina hidrelétrica de Belo Monte foi desocupado com a chegada de dois oficiais de Justiça e três advogados do consórcio Norte Energia, acompanhados de um destacamento da Policia Militar, munidos de um interdito proibitório ajuizado pela empresa.  Após informar os manifestantes sobre a ordem judicial, que tinha poderes de reintegração de posse, os oficiais de Justiça destacaram que a Tropa de Choque estava nos arredores, pronta para agir.  É vergonhoso que a mesma Justiça, que tem se mostrado cada vez mais morosa e suscetível a pressões políticas no julgamento das 12 Ações Civis Públicas movidas pelo Ministério Público Federal (MPF) contra as ilegalidades e violações de direitos humanos no processo de licenciamento ambiental de Belo Monte, tenha expedido o interdito proibitório favorável à empresa em apenas algumas horas.
A ação inédita de ocupação do canteiro de obras de Belo Monte partiu de uma decisão soberana e autônoma de pescadores e indígenas da Bacia do Xingu, e foi considerada por estes o marco de uma nova aliança na luta contra a hidrelétrica. O reconhecimento mútuo e o acordo firmado esta semana entre os segmentos que mais sofrerão com a destruição do Xingu foi visto como uma nova etapa, mais forte e ampla, da luta contra Belo Monte.  A parceria entre indígenas e pescadores, inédita, mostrou que os povos do Xingu estão unidos em defesa do rio, da natureza e do seu modo de vida tradicional.
A nossa resistência contra este projeto de destruição chamado Belo Monte permanece inabalável. A ocupação foi um recado claro para o governo Dilma Rousseff de que a luta pela proteção do Xingu está mais viva do que nunca. Se o governo federal insistir em continuar violando os nossos direitos, dos povos indígenas e comunidades tradicionais, outras ações de resistência virão.
Altamira (PA), 28 de outubro de 2011.

Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira – COIAB
Comissão Pastoral da Terra – CPT
Conselho Indigenista Missionário – CIMI
Movimento Xingu Vivo para Sempre – MXVPS

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Nota do Cimi sobre as Informações Mentirosas Divulgadas em Relação à Ocupação do Canteiro de Obras da UHE de Belo Monte

Corre em alguns portais jornalísticos da internet a informação de que o bispo da Prelazia do Xingu (PA), dom Erwin Kräutler, presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), estaria presente e liderando os indígenas, pescadores, ribeirinhos e populações tradicionais que ocupam o canteiro de obras da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, em Altamira, PA, desde a manhã deste dia 27 de outubro.
O Consórcio Norte Energia divulgou nota afirmando  que a maioria dos ocupantes do canteiro seriam de fora e que responderiam a interesses de indivíduos alheios aos interesses nacionais. A postura do Consórcio traz à memória o período da ditadura militar (1964-1985) quando quem fosse contra o regime era tratado como se estivesse agindo contra a pátria.
Vimos a público comunicar que Dom Erwin encontra-se fora do país, na Áustria, desde o dia 19 de outubro. Portanto, a informação divulgada é totalmente mentirosa e tendenciosa.
Notícias têm sido plantadas com o objetivo de esconder o fato dos povos indígenas, pescadores e outras populações locais  terem tomado a iniciativa de demonstrar toda sua indignação e repulsa à UHE Belo Monte, ao Consórcio Norte Energia e a todas as ações governamentais envolvidas no caso.
O Cimi reitera seu entendimento sobre a ilegalidade do empreendimento de Belo Monte por violar o direito dos povos indígenas e populações tradicionais. Considera legítima a luta contra a construção da usina.   
Brasília, 27 de outubro de 2011

Primeiro vídeo de Belo Monstro depois da ocupação

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Declaração da Aliança do Xingu contra Belo Monte


“Não permitiremos que o governo crie esta usina e quaisquer outros projetos que afetem as terras, as vidas e a sobrevivência das atuais e futuras gerações da Bacia do Xingu”
Foto ilustrativa

Nós, os 700 participantes do seminário “Territórios, ambiente e desenvolvimento na Amazônia: a luta contra os grandes projetos hidrelétricos na bacia do Xingu”; nós, guerreiros Araweté, Assurini do Pará, Assurini do Tocantins, Kayapó, Kraô, Apinajés, Gavião, Munduruku, Guajajara do Pará, Guajajara do Maranhão, Arara, Xipaya, Xicrin, Juruna, Guarani, Tupinambá, Tembé, Ka’apor, Tupinambá, Tapajós, Arapyun, Maytapeí, Cumaruara, Awa-Guajá e Karajas, representando populações indígenas ameaçadas por Belo Monte e por outros projetos hidrelétricos na Amazônia; nós, pescadores, agricultores, ribeirinhos e moradores das cidades, impactados pela usina; nós, estudantes, sindicalistas, lideranças sociais e apoiadores das lutas destes povos contra Belo Monte, afirmamos que não permitiremos que o governo crie esta usina e quaisquer outros projetos que afetem as terras, as vidas e a sobrevivência das atuais e futuras gerações da Bacia do Xingu.
Durante os dias 25 e 26 outubro de 2011, nos reunimos em Altamira para reafirmar nossa aliança e o firme propósito de resistirmos juntos, não importam as armas e as ameaças físicas, morais e econômicas que usaram contra nós, ao projeto de barramento e assassinato do Xingu.
Durante esta última década, na qual o governo retomou e desenvolveu um dos mais nefastos projetos da ditadura militar na Amazônia, nós, que somos todos cidadãos brasileiros, não fomos considerados, ouvidos e muito menos consultados sobre a construção de Belo Monte, como nos garante a Constituição e as leis de nosso país, e os tratados internacionais que protegem as populações tradicionais, dos quais o Brasil é signatário.
Escorraçadas de suas terras, expulsas das barrancas do rio, acuadas pelas máquinas e sufocadas pela poeira que elas levantam, as populações do Xingu vem sendo brutalizadas por parte do consórcio autorizado pelo governo a derrubar as florestas, plantações de cacau, roças, hortas, jardins e casas, destruir a fauna do rio, usurpar os espaços na cidade e no campo, elevar o custo de vida, explorar os trabalhadores e aterrorizar as famílias com a ameaça de um futuro tenebroso de miséria, violência, drogas e prostituição. E repetindo assim os erros, o desrespeito e as violências de tantas outras hidrelétricas e grandes projetos impostos à força à Amazônia e suas populações.
Armados apenas da nossa dignidade e dos nossos direitos, e fortalecidos pela nossa aliança, declaramos aqui que formalizamos um pacto de luta contra Belo Monte, que nos torna fortes acima de toda a humilhação que nos foi imposta até então. Firmamos um pacto que nos manterá unidos até que este projeto de morte seja varrido do mapa e da história do Xingu, com quem temos uma dívida de honra, vida e, se a sua sobrevivência nos exigir, de sangue.
Diante da intransigência do governo em dialogar, e da insistência em nos desrespeitar, ocupamos a partir de agora o canteiro de obras de Belo Monte e trancamos seu acesso pela rodovia Transamazônica. Exigimos que o governo envie para cá um representante com mandado para assinar um termo de paralisação e  desistência definitiva da construção de Belo Monte.
Altamira, 27 de outubro de 2011

TIPNIS: Lula e Evo

Evo perdeu. Lula perdeu. Perdeu o BNDES. Perdeu o Brasil. 

 Roberto Malvezzi (Gogó)

Foi com perplexidade que simpatizantes do governo Evo Morales reagiram ao ataque violento do governo boliviano à marcha indígena contra a estrada que corta a reserva TIPNIS. Essa simpatia está em todo o mundo, não apenas dentro da Bolívia.

Porém, os brasileiros tiveram que pôr mais uma pulga atrás da orelha. Somos acusados pelos próprios marchantes de sermos os maiores interessados na estrada. Na verdade, ela atenderia mais aos interesses do agronegócio brasileiro da região Oeste, visando os portos do Pacífico. 

Financiada pelo BNDES, a obra teve Lula como lobista da OAS para convencer Evo. Poucos dias depois da visita a marcha começou. Agora, vencedor, o movimento se indigna contra o imperialismo brasileiro.

As nações indígenas, com suas tradições milenares, não se comportam politicamente pela cartilha marxista-leninista de tática e estratégia. Muito menos pelo oportunismo. Elas não fazem aliança hoje para descartar seus aliados no dia seguinte, conforme exigem as conveniências do poder. Ao contrário, o elemento chave em suas alianças é a confiança. E não se abandona um aliado por conveniência. E, uma vez traída, dificilmente essa confiança será restabelecida.

O que se viu na Bolívia foi a lógica da sabedoria milenar indígena, isto é, Evo tem que respeitar a aliança que o levou ao poder, não o povo respeitar os novos interesses de seu governo. O povo indígena foi para a rua e foi reprimido violentamente. O governo voltou atrás e pediu perdão, declarando TIPNIS intangível. Somente o futuro dirá se essa atitude vai ser suficiente para restabelecer a confiança mútua, ou se a história seguirá por outros rumos.

No Brasil o PT jogou fora aliados históricos, impõe seus projetos pela força, passa por cima de comunidades indígenas e quilombolas, vai para a América Latina e África impor os interesses imperiais de empresas brasileiras.  Lula tem sido o embaixador desse sub imperialismo do capital.

Depois de TIPNIS, quem sabe o governo brasileiro, além de prejudicar Evo, aprenda a respeitar melhor os indígenas do próprio país.  Ou então, nos falta um levante como na Bolívia.

Ocupado canteiro de obras da usina de Belo Monte

Renato Santana
De Brasília

O canteiro de obras da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, na região de Altamira (PA), está ocupado por mais de 600 indígenas, pescadores, ribeirinhos e populações ameaçadas pelos impactos sociais e ambientais do grande empreendimento. A ocupação começou na madrugada desta quinta-feira (27).

A Rodovia Transamazônica (BR-230), a partir de trecho em frente ao canteiro, na altura da Vila de Santo Antônio, região de Altamira, está interditada e só passam veículos transportando doentes.  

Em assembleia realizada na manhã desta quinta-feira, o movimento definiu como principal reivindicação que o governo federal envie autoridades para negociar com os as populações tradicionais o fim das obras de Belo Monte.

Outra decisão tomada pelos ocupantes é que o acampamento no canteiro de obras será permanente e desde já convocam outras entidades e movimentos a cerrarem fileiras nessa luta que, conforme os manifestantes, não irá parar.

Todo o processo de ocupação ocorreu de forma pacífica e é fruto das discussões entre os povos tradicionais durante o seminário “Territórios, ambiente e desenvolvimento na Amazônia: a luta contra os grandes projetos hidrelétricos na bacia do Xingu”.

Com o encontro, se pretendia analisar a conjuntura em torno de Belo Monte e discutir respostas às situações de risco e impactos geradas pela usina. As mesas de debate foram suspensas em vista da ação de ocupação do canteiro de obras.

São 21 povos indígenas envolvidos na mobilização. “Para mim, as pessoas que estão querendo fazer essas usinas, são uma doença. São um câncer que vai matar o planeta. Nós somos o remédio para essa doença!”, disse Davi Gavião que segue: “Sou filho de quem foi impactado por uma usina. Faz 35 anos que nosso povo foi retirado da sua área e até agora estamos lutando por uma indenização. Faz 35 anos! Essa Belo Monte vai trazer muitos impactos também. Temos que lutar contra todas as barragens! (sic)”.

Entre os pescadores, Raimundo Braga Nunes: “Tenho certeza que depois de Belo Monte vou ser obrigado a mudar de trabalho, porque peixe não vai ter. Vai morrer, ou vai migrar. Eu não me calo, estou pronto para brigar, preparado. Convido nossos amigos indígenas para somar forças para proteger nosso rio. O Xingu é nosso pai e mãe”.

Decisão adiada

Nesta quarta-feira (26), as populações impactadas viram o desembargador do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) Fagundes de Deus votar contra a Ação Civil Pública que pede a paralisação das obras de Belo Monte. Conhecedor do setor energético, o desembargador se posicionou tendo como base a experiência adquirida na área, pois já advogou para a empresa Eletronorte.  

Impetrada pelo Ministério Público Federal (MPF), a ação é um recurso de apelação onde se pede o cancelamento do licenciamento ambiental e a inconstitucionalidade do Decreto 788/2005 do Congresso Nacional – que libera a obra sem a realização da consulta de boa fé aos povos indígenas do Xingu e populações tradicionais, tal como diz a Constituição Federal e a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

A desembargadora Maria do Carmo Cardoso, terceira a votar a matéria durante a sessão desta quarta-feira do TRF-1, em Brasília (DF), pediu vistas da Ação Civil Pública e interrompeu o julgamento – programado para entrar em pauta no dia 9 de novembro.  

Dessa forma, a ocupação é também uma resposta a postura da Justiça que apesar de todas as irregularidades, 11 ações denunciando ilegalidades no processo de Belo Monte em tramitação, além de pareceres contrários à obra trabalhados por um painel de especialistas e MPF, não interrompe as obras. Sobretudo, não reconhece a e leva em conta a opinião das comunidades que agora ocupam o canteiro.

Primeiro voto: a favor da ação 

O primeiro voto dos desembargadores do TRF-1, no último dia 17, declarou inválidas a autorização e licença ambiental para Belo Monte.  

“É de nenhuma eficácia a autorização emitida pelo parlamento”. Com essas palavras a desembargadora Federal Selene Maria de Almeida desqualificou o Decreto Legislativo nº 788/2005 do Congresso Nacional que autorizou a construção da usina de Belo Monte. Ela considerou igualmente inválido o licenciamento ambiental de Belo Monte.

Num voto elaborado e denso, a desembargadora acatou a maioria dos pontos apresentados pelo MPF/PA, sendo o argumento mais importante o fato de as comunidades indígenas afetadas pela usina de Belo Monte não terem sido consultadas a respeito, conforme mandam a Constituição Federal e tratados internacionais, como a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil em 2004 (Decreto nº 5.051/2004).

Ela não deixou dúvidas sobre a necessidade das oitivas: “A Constituinte prescreve que sejam ouvidas as comunidades indígenas afetadas. Para protegê-las”. Em seu voto, Selene reafirmou o posicionamento já adotado pelo TRF-1 quando da primeira avaliação da matéria, em 2006.

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Mais um: Comunista Orlando Silva não resiste e joga a toalha


O Comunista, agora ex-ministro dos esportes, Orlando Silva, não resistiu às pressões e pediu demissão. Acoado e sob gravíssimas acusações, mesmo com toda a minifestação de "solidariedade" dos correligionários, não deu.

Em reunião com senadores e deputados do PC do B, o presidente do partido, Renato Rabelo, admitiu que era insustentável a permanência do Ministro Orlando Silva no cargo. O pedido de demissão já foi comunicado ao Ministro Gilberto Carvalho e, agora às 17:30, será oficializado à presidente Dilma Russeff.

Agora resta ao partido lutar para continuar com a pasta, o que não será muito fácil, principalmente por causa das acusações que também pesam sobre o ex-ministro e hoje governador do DF, Aguinelo, que antecedeu Orlando Silva e que também é do PC do B.

A situação está difícil no governo da Dilma. Quem é "Orlando e Brasil" que se entenda e assuma sua cota.

Rejeição ao Brasil aflora em protesto indígena na Bolívia

Fabio Murakawa
Valor Economico

Vitória: manifestantes indígenas levantam acampamento em La Paz, após governo recuar e vetar estrada em reserva.

A glorificação dos indígenas, a repulsa ao Brasil e uma grande decepção com o presidente Evo Morales marcaram o desfecho da mobilização indígena ontem em La Paz. À tarde, os índios desmontaram o acampamento que mantinham havia uma semana na praça Murillo, em frente ao palácio presidencial e ao Congresso. Eles caminharam mais de 500 km por dois meses para impedir que a estrada, com financiamento brasileiro, atravessasse seu território. Voltam para casa com a missão cumprida.

Pressionado por milhares de pessoas na praça, o presidente Morales sancionou na madrugada de ontem uma lei que diz que nenhuma rodovia poderá atravessar o Território Indígena Parque Nacional Isiboro Sécure (Tipnis), classificado como "intangível". A medida foi resultado de quatro dias de negociações no Palácio Quemado. Com isso, o trecho 2 da estrada, que cortaria o território, terá que passar por outro lugar.

Ontem, enquanto se preparavam para partir, os indígenas eram saudados pela população. Moradores de La Paz se aproximavam para oferecer comida e parabenizá-los pela vitória. Alguns de seus líderes viraram celebridade, mais notadamente o presidente da Subcentral Tipnis, Fernando Vargas, indígena da etnia moxenha e que foi a cara visível dos protestos.

Enquanto tentava coordenar a saída, ele mal conseguia andar. A cada dois passos, era parado por um boliviano para tirar fotos e receber abraços e saudações. Para entrevistá-lo, oValor precisou levá-lo da praça a uma lanchonete a poucos metros dali, tamanho o assédio. Mesmo assim, clientes e funcionários interrompiam a entrevista a todo momento para cumprimentar o líder indígena. "Eu esperava ser bem recebido em La Paz, mas não dessa maneira", disse ele.

Vargas explicou que a população se voltou a favor de sua causa após uma violenta repressão policial, no último dia 25 de setembro. Os bolivianos ficaram chocados ao ver, na TV, indígenas sendo arrastados por policiais com as mãos atadas por fita adesiva, enquanto outros eram atacados com bombas de gás lacrimogêneo e cacetetes.

Esse episódio marcou também, segundo Vargas, o fim da confiança no presidente Morales, um líder cocaleiro que se elegeu com uma ampla base de apoio entre os povos indígenas amazônicos.

Durante os encontros com Morales no palácio, Vargas disse ter cobrado o governante pela repressão. "Para mim, está claro que a ordem partiu dele", afirmou.

Sobre a estrada, disse que o presidente estava tentando "pagar a fatura" aos cocaleiros, pois essa havia sido uma promessa de campanha ao setor mais fiel a Morales. "Nós, indígenas, não precisamos da estrada para atravessar o parque. Nossa forma de nos locomover são os rios. A estrada só vai frear o nosso desenvolvimento", disse. "Essa estrada se presta para duas coisas: para ampliar o plantio de coca, destinada à produção de droga, e para atender aos interesses do Brasil, que quer atravessar seus produtos rumo ao Oceano Pacífico usando a Bolívia como ponte."

A rodovia, orçada em US$ 415 milhões, tem US$ 332 financiados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e está sendo executada pela construtora brasileira OAS. As obras estão em andamento nos trechos 1 e 3, mas eles devem sofrer modificações, agora que o traçado não passará mais pelo parque.

Os indígenas temem que a estrada facilite o avanço do plantio da coca, que já ocorre em áreas marginais do parque. Morales autorizou o início dos trabalhos e recorreu ao financiamento brasileiro sem antes consultar os nativos, que, pela Constituição boliviana, têm o direito de decidir sobre a destinação de seus territórios.

Segundo Vargas, os indígenas vêm tentando dialogar com Morales desde 2007, quando começaram os rumores sobre a estrada. "O governo nunca nos escutou, nunca nos deu importância. E, quando as obras começaram, nós decidimos marchar", afirmou.

Ignorados por Morales, os indígenas chegaram a procurar o governo brasileiro para tentar sensibiliza-lo sobre sua causa, disse ao Valor Adolfo Chávez, presidente da Confederação dos Povos Indígenas da Bolívia (Cidob). Ele afirmou ter enviado uma carta à Embaixada do Brasil em La Paz pedindo um encontro em Brasília. Obteve a promessa de ajuda, mas o encontro acabou não saindo.

Para Chávez, a estrada traria uma série de problemas sociais para os povos nativos do Tipnis. "Não queremos uma estrada para levar mendigos às cidades para pedir esmola, para abrir espaço para caminhões de alta tonelagem. Não estamos acostumados com isso. Vivemos da pesca, da caça, da coleta de frutas. E, quando isso ocorrer [a estrada], haverá devastação da terra, desmatamento, pirataria e uma zona muito perigosa de plantio de coca vai se expandir", disse. "Vocês brasileiros se queixam muito da cocaína que vem da Bolívia, mas isso é contraditório, porque querem seguir abrindo caminho para que a droga continue sendo produzida com maior facilidade", afirmou.

Esse sentimento negativo em relação ao Brasil fica mais exacerbado nas palavras do líder indígena Rafael Quispe, presidente do Conselho Nacional de Ayllus e Marcas do Qullasuyu (Conamaq). Abordado pelo Valor, e ciente de que se tratava de um jornal brasileiro, ele disse: "A empresa dos brasileiros é que está metida [na obra], quebrou a lei, e os brasileiros não fazem absolutamente nada. Vocês [brasileiros] estão f... a Bolívia. E não é só com estradas. Vocês estão f... a gente com termelétricas. Como a Bolívia, como cidadão boliviano, como posso eu, com capital boliviano, f... o seu país?"

Questionado sobre como fica a relação dos indígenas com o presidente, ele manteve o tom. "Por que você quer saber? Se você é brasileiro, pergunte ao governo. Capital brasileiro, empresa brasileira. O banco que está emprestando é brasileiro. E o que você quer que eu te diga? Vocês vieram f... o país."

“É preciso matar a onça lá em cima!”

“Sou contra Belo Monte!”, “Não quero Belo Monte!”, “Temos que lutar contra Belo Monte!”, "Belo Monte não passará!” Cada um dos participantes do seminário contra Belo Monte, que está sendo realizado estes dias em Altamira, tem o mesmo objetivo: Parar Belo Monte. Não há outra opção para os povos indígenas, os pescadores, os ribeirinhos, os pequenos agricultores, oleiros, areeiros, estudantes e sindicalistas presentes.


Mesa dos indígenas

Juma Xipaia
Dia 25 de outubro, o seminário, que continua até o dia 27, se iniciou com uma mesa indígena. Representantes de cada povo presente explicaram por que são contra a usina. Os povos da bacia do Xingu relataram os impactos que vão sofrer. Assim, os Arara da Volta Grande explicaram que a pescaria acabaria e o transporte ficaria comprometidos. Os Assurini do Pará temem as invasões que podem ocorrer, quando muitas pessoas são expulsas das suas casas e, sobre tudo, quando as obras terminarem e milhares de pessoas ficam sem emprego. Os indígenas de outras regiões compartilhavam as dramáticas experiências que sofreram com a construção de hidrelétricas nas suas terras. Como Davi Gavião, do povo Gavião (PA).

Câncer

“Para mim, as pessoas que estão querendo fazer essas usinas, são uma doença. São um câncer que vai matar a planeta. Nós somos o remédio para essa doença!” Davi é jovem, mas sabe do que está falando. “Sou filho de quem foi impactado por uma usina. Faz 35 anos que nosso povo foi retirado da sua área, e até agora estamos lutando para uma indenização. Faz 35 anos! Essa Belo Monte vai trazer muitos impactos também. Temos que lutar contra todas as barragens!”

João Lucas Krahô (TO), conta como seu povo Krahô continua sofrendo impactos de uma usina. “Não só os seres humanos serão impactados, mas também os animais. A usina vai acabar com os animais. Vimos isso com a usina de Tocantins. A usina acaba com nossos recursos, nossa alimentação, nossa água para beber!”

Josué Karajá (TO) vai além da constatação e aponta os responsáveis da destruição: “Lá na nossa região estão construindo a usina de Santa Isabel. Não queremos as usinas, porque fazem parte do PAC e o PAC só quer tirar recursos das terras indígenas, trazendo muitos problemas, muitos impactos. Dilma quer fazer o Brasil crescer, mas não vai fazer crescer os povos indígenas.”

Onça

Mas Dilma apenas é a cara dos verdadeiros interessados nas usinas e demais grandes projetos. São as grandes empresas que financiavam as campanhas políticas dela e de Lula, apontam vários palestrantes ao longo do dia. Como dona Antônia Krahô, uma liderança de do povo Krahô (TO). “Sou contra hidrelétricas, mas também contra hidrovias e outros projetos que atacam nossa terra. Brancos invadem nossa terra, queimam nossa floresta. Queremos viver de nosso jeito, mas o branco está acabando com isso. A gente tem que ir atrás a onça que está lá em cima, porque não é só a Dilma não. Precisamos nos unir, com nossos cassetetes, nossas arma, e matar essa onça que está lá, que está comendo nossa terra, que está comprando nossas terras. Que quer tomar tudo. Aonde vocês quiserem, a gente vai atrás, para matar essa onça!”

Defensores

Juma Xipaia, representante dos Xipaia (PA), outro povo da região de Altamira que seria impactado por Belo Monte, concretiza a fala simbólica da Antônia. Ressalta primeiro que Belo Monte ainda pode ser barrado. “Belo Monte é fato consumado? Não! As maquinas estão aqui, mas a usina só vai sair se nós deixamos sair.” Mas é preciso agir: “Já fizemos tantas reuniões,tantos documentos, e deu em que? O canteiro de obras está sendo construído. Precisamos sair na rua, gritar, e fazer algo diferente. Vamos somar forças, unir nossas forças, mas não podemos continuar falando, em quanto as máquinas estão destruindo nossa natureza! A natureza está chorando, os rios estão implorando! O que vai ser o resultado desse encontro? Espero que vai ser algo mais, nós somos os defensores do nosso rio. Só nós!”

Mesa dos pescadores

Mesa dos pescadores
À tarde, se realiza a mesa dos pescadores, que vieram de várias colônias de pescadores ao longo do rio Xingu, na região impactada. Eles deixam bem claro que para eles os impactos da construção da usina seriam muito dramáticos. A jusante da barragem, no trecho da Volta Grande que teria muito pouca vazão, o pescado vai quase desaparecer. Mas também a montante da barragem, os impactos seriam imensos. Primeiro porque a barragem vai impedir a migração dos peixes, impedindo inclusive a piracema, ou seja, a procriação. Segundo, porque várias ilhas desapareceriam de forma permanente no reservatório da usina. São estes ilhas que fornecem alimentação fundamental para muitos peixes. Também o desaparecimento de vários tabuleiros afetaria muito a natureza, porque são estes tabuleiros que os quelônios usam para a desova.

As falas de resistência dos pescadores são tão contundentes quanto as dos indígenas, resumidas na fala de Raimundo Braga Nunes: “Temos que unirmos, mais do que nunca, contra Belo Monte. Não podemos permitir que essa energia venha destruir nossos rios, nossa floresta. Pesca não vai ter mais. As ilhas com as árvores que alimentam os peixes vão ficar em baixo da água. Tenho certeza que depois de Belo Monte vou ser obrigado a mudar de trabalho, porque peixe não vai ter. Vai morrer, ou vai migrar. Eu não me calo, sou pronto para brigar, preparado. Convido nossos amigos indígenas para somar forças para proteger nosso rio. O Xingu é nosso pai e mãe.”

Fonte: Cimi