terça-feira, 28 de março de 2023

Por que a Medida Provisória 1151/2022 é um verdadeiro contrabando e não pode ser votada?

Elaborada com o objetivo de alterar a legislação vigente sobre concessão de florestas públicas nacionais e sobre gestão de Unidades de Conservação, a MP 1151, ao invés de focar no tema, tratou principalmente de inserir na concessão florestal, como um contrabando, o direito a comercialização de créditos de carbono florestais. Ou seja, permitirá que a empresa que obtenha a concessão, por exemplo por 40 anos para a exploração de 40 mil hectares em manejo florestal, obter igualmente a possibilidade de aferir e comercializar créditos de carbono sobre tal área, convertendo o manejo madeireiro em ativo ambiental e possibilitando que outro ente público ou privado, nacional ou internacional, possa compensar suas emissões de gases de efeito estufa.

 
No fundo estamos falando do uso de florestas públicas e de Unidades de Conservação no rol de licenças para poluir, corroborando para o atraso ao urgente e necessário corte de emissões de gases de efeito estufa para enfrentamento da crise climática.
A inserção da possibilidade de transação de créditos seria um “atrativo”, como a própria MP se refere, para investimento em manejo florestal, considerada uma das atividades principais para que o Brasil alcance metas climáticas de estocagem de carbono. No entanto, a realidade das florestas deve ser levada em consideração. Por isso destacamos:

 
1. As concessões florestais são executadas por empresas, que não representam povos e comunidades tradicionais, logo, conferir a elas maior atribuição seria repassar a elas o papel de guardiãs das florestas ou submeter os povos que vivem nessas áreas a uma tutela do setor privado;

 
2. As áreas de concessão também podem ser reivindicadas por grupos étnicos, portanto, conferir atratividade de mercado a concessão sem antes garantir demarcações étnicas acentua conflitos territoriais;

 
3. A inclusão de Financial Technologies Fintech no uso do recurso do Fundo Nacional sobre Mudança do Clima avança nas medidas de financeirização da natureza e reduz o direito ao meio ambiente a um ativo transacionável. A natureza é uma bem comum e como tal precisa ser tratada como um direito.

 
4. A alteração na Lei nº12.114/2009 do Fundo Nacional sobre Mudanças Climáticas, ampliando os agentes financeiros para financiamento da comercialização de créditos de carbono florestais, atropela a retomada de leis, políticas e conselhos que foram desmontadas pelo governo Bolsonaro, como o ENREDD+, CONAREDD+, código florestal, Política Nacional de Mudanças Climáticas, Fundo Amazônia, dentre outras, ignorando estudos e propostas debatidas durante o processo de transição do governo.

5. A comercialização de créditos de carbono florestal visa a compensação de emissões por entes privados e atrasam a mudança necessária que o setor precisa para se comprometer com as mudanças no padrão de produção e distribuição.
 
6. O Brasil ainda não possui nenhuma regulação em vigor sobre o mercado de carbono, avançar com essa MP é colocar o carro na frente dos bois e gerar mais especulação e pressão em cima dos territórios, sem marcos legais que regulem o setor e promovam a proteção dos direitos territoriais e da consulta, livre prévia e informada.
 
7. A MP também reduz a barganha do Brasil nas negociações internacionais de mudanças climáticas no âmbito da UNFCCC e da implementação do Acordo de Paris, ao avançar em temas sensíveis, já que estão entregando ao mercado, via legislação nacional, algo que ainda está em debate neste outro âmbito. A MP 1151 é sobre concessão florestal, de biodiversidade e de crédito de carbono. São questões muito profundas e que precisam ser debatidas com a sociedade.
 
Não votem a MP 1151!
 
Brasília, 28/03/2023
 

Assinam:


1. Grupo Carta de Belém
2. Articulação dos Povos Indígenas do Brasil - APIB

3. Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito
Santo - Apoinme

4. Articulação dos Povos Indígenas do Sul - Apinsul

5. Conselho Nacional das Populações Extrativistas - CNS

6. Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos - CONAQ

7. Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura Contag

8. Conselho Pastoral dos Pescadores - Norte

9. Central Única dos Trabalhadores CUT

10. Movimento dos Atingidos por Barragens - MAB

11. Movimento pela Soberania Popular na Mineração - MAM

12. Marcha Mundial das Mulheres MMM

13. Movimento Negro Unificado - MNU

14. Movimento dos Pequenos Agricultores - MPA

15. Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra - MST

16. Movimento de Trabalhadoras e Trabalhadores Sem-Teto - MTST

17. Alternativa para a Pequena Agricultura no Tocantins - APA-TO

18. Amigos da Terra Brasil

19. Associação Agroecológica Tijupá

20. Associação dos Moradores da Reserva Extrativista Mapuá - Amorema

21. Associação Maranhense para a Conservação da Natureza - Amavida

22. Amazon Hopes

23. Articulação de Agroecologia da Amazônia

24. Articulação das Pastorais do Campo

25. Articulação Pacari Raizeiras do Cerrado

26. Cosmopolíticas - Núcleo de Antropologia - Universidade Federal Fluminense - UFF

27. Comissão Pastoral da Terra CPT

28. Comunidade Quilombola de Caldeirão - Salvaterra/PA

29. Conselho Indigenista Missionário - CIMI

30. Conselho do Povo Terena/ MS

31. FASE - Solidariedade e Educação

32. Fórum da Amazônia Oriental - FAOR

33. Grupo de Estudos: Desenvolvimento, Modernidade e Meio Ambiente - GEDMMA/UFMA

34. Grupo de Pesquisa Costeiros UFBA

35. GT de Saúde e Ambiente da Abrasco
36. Instituto Brasileiro de Educação, Integração e Desenvolvimento Social IBEIDS
37. Instituto de Estudos Socioeconômicos Inesc

38. Instituto EQUIT

39. Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais Inga

40. Instituto de Referência Negra Peregum

41. Instituto Iepé

42. Instituto Yande

43. International Rivers Brasil

44. Jubileu Sul Brasil

45. Justiça Global

46. Movimento Ciência Cidadã

47. Movimento da Mulher Trabalhadora Rural do Nordeste - MMTR/NE

48. Movimento SOS Chapada dos Veadeiros

49. Núcleo de Estudos em Cooperação - NECOOP/UFFS

50. Núcleo de Estudos e Pesquisas Sociais em Desastres - NEPED/ UFSCar

51. Organização de Desenvolvimento Sustentável e Comunitário ODESC

52. Rede Brasileira de Justiça Ambiental RBJA

53. Rede de Mulheres das Marés e das Águas dos Manguezais Amazônicos do Maranhão
e Piauí

54. Rede Urbana Capixaba de Agroecologia RUCA

55. Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais SRRT- Santarém/PA

56. Sempreviva Organização Feminista SOF

57. Terra de Direitos