terça-feira, 27 de setembro de 2011

A Fraude ambiental no Acre


O Eng. Florestal foi pra Brasília, e o Médico assumiu o Estado

A ação global pelo meio ambiente intitulada “Um dia para ir além dos combustíveis fosséis”, será realizada em diversos países
Em plena era da sustentabilidade e dos comportamentos ecologicamente corretos, vivemos um Acre de faz de conta. “Manda o recurso que eu faço de conta que cuido do meio ambiente”, um Acre que para receber mais de R$ 700 milhões de reais (BID II) precisou criar mais uma floresta pública (FLORA), em fase de criação, que será localizada no município de Manoel Urbano.

Não que sejamos contra a conservação da nossa biodiversidade, não é isso. O problema se continuarmos com a atual postura acontecerá a invasão de todas as Unidades de Conservação do Estado em um curto espaço de tempo, talvez demore a acontecer com as mais longínquas, que é o caso do Parque Estadual do Chandlles, que de Parque não tem nada, pois o SNUC estabelece que as Unidades de Proteção Integral não seriam habitadas, não é a realidade.

Um “bom” exemplo é a nossa Floresta Estadual do Antimary (FEA), que mas parece um projeto assentamento (PA), quem disse que era inteligente criar um PA ao lado de uma floresta pública? Quantos hectares da FEA foram mesmo entregues para a reforma agrária por falta de pulso do governo? E você acha que ainda vai sobrar algum ha, quando acabar a Exploração Florestal, a exploração através do manejo florestal é legal, o que é ilegal é falta de importância dada a fase pós-exploração, sem levar em consideração as cartas marcadas nessas “licitações”, estranho somente uma empresa ganha essas “falsilitações”, e que coincidência é a mesma que “doa” algumas cifras para todas as campanhas da estrela vermelha no Acre.

O que houve senador? E o Acre que cuidava das florestas? Cadê a fiscalização do IMAC? Aonde foi parar o Pelotão Florestal da PMAC? IBAMA cadê você? O Eng. Florestal foi pra Brasília, e o Médico assumiu o estado (E EU VOTEI NELES), será que é essa a explicação? No inicio do ano o setor de fiscalização do IMAC foi extinto, tudo bem que não era essas coisas de fiscalização, mas já era algo. Ai disseram que cada setor cuidaria de fiscalizar sua área, isso funciona? Acho que sim não vejo mas fazendeiros e nem colonos no IMAC dando explicações ou entrando com recurso de multas.

O Pelotão Florestal foi enaltecido para a categoria de Companhia Ambiental, agora independente do BOPE, nossa que maravilha agora vai... que nada o efetivo quase não aumentou, o quartel que esta sendo construído no complexo do CIEPS, com verba do BID (R$ 1,5 mi), com entrega prevista pra junho de 2009 ate hoje não terminou (acorda SEOP), funciona  precariamente no antigo prédio do PROERD, e o nosso secretario de Ciências de Tecnologias, após certa reunião “pediu” que os verdinhos “se acalmassem por um tempo”, estavam atrapalhando o desenvolvimento do estado, por ele essa Cia nem existia.

No IBAMA quem dita as regras é o chefe do poder executivo é ele quem coloca e tira o superintendente local, daí já sabemos o resultado, trabalho mesmo só quando a demanda vem de Brasília.

Aproveitem visitem as reservas florestais, conheçam as árvores de grande porte, contemplem os rios navegáveis da nossa região, caminhe pelo menos meia hora de mata adentro. Sabe por quê? Talvez nossos netos não tenham a mesma oportunidade que nós e as fotos falarão por si.

O rio Acre, responsável pelo abastecimento de toda a cidade de Rio Branco está morrendo, vamos deixar o estado todo do mesmo jeito?

Trabalho no estado e por razões óbvias não posso me identificar, não agüento mais tanta hipocrisia, tanto faz de conta, Ministério Público por favor, cobre mais do poder executivo, olhe mais pela área ambiental. É difícil cuidar dela mais difícil será viver sem os benefícios dela.

Dada a relevância do tema aqui apresentado, devo informar aos meus leitores que o texto foi também publicado no Contilnet e no blog do Carlos Portela - com repercursão no blog do Carioca.

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Comissão da verdade???

E a Comissão da Verdade, hein?

Imagine a cena: trancados no banheiro do gabinete do presidente da Câmara, o anfitrião Marco Maia (PT-RS), o ministro da Justiça e a ministra dos Direitos Humanos batiam boca por telefone com Dilma Rousseff, instalada em um quarto de hotel em Nova Iorque.

Batiam boca? Como é? Perdão!

Elimine o “batiam boca”.

Discutiam – assim é melhor. Mas não é melhor o bastante. Ninguém bate boca ou discute com a presidente. Alguns choram diante dela.

Digamos então: ponderavam. Os que se espremiam dentro do banheiro para ter uma conversa com Dilma à prova de vazamento ponderavam. Em troca, eram admoestados.

Emenda do DEM ao projeto que cria a Comissão da Verdade estabelece: todos os seus integrantes têm de ser “imparciais”.

Há mecanismo capaz de aferir a imparcialidade de quem quer que seja? Irrelevante.

Dilma implicou com a emenda e pronto. Aceitou-a mais tarde para driblar o risco de o projeto ser votado somente em 2012.

O governo corre atrás do prejuízo. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA condenou o Brasil por não ter investigado os crimes praticados durante a ditadura militar que se estendeu entre 1964 e 1985.

Lula não teve peito. Farda mete-lhe medo. Deixou a tarefa para Dilma, ex-presa política, torturada.

A Câmara dos Deputados aprovou a criação da Comissão da Verdade. Que para funcionar depende ainda da aprovação do Senado.

No país dos absurdos, onde a independência foi proclamada por um estrangeiro e a República por um militar monarquista, teremos uma Comissão da Verdade destinada a tangenciar a verdade.
É o que teremos, de fato.

A comissão será formada por sete pessoas escolhidas solitariamente pela presidente. Elas receberão salário mensal de quase R$ 12 mil para se dedicar ao trabalho com exclusividade. Não serão estáveis. A qualquer momento e por qualquer motivo, e sem dever explicações, Dilma poderá substituir quem quiser.

Na redação anterior do projeto de lei que criava a comissão, existia referência à “repressão política”, um dos alvos a ser investigado. A referência foi suprimida a pedido dos negociadores do Ministério da Defesa.

Falava-se também em “apuração” de violações aos direitos humanos. Fala-se, agora, em “exame”.

A comissão teria o curto prazo de validade de dois anos para esquadrinhar um período de 21 (1964-1985). O prazo foi mantido.

Ampliou-se para 42 anos o período a ser perquirido (1946-1988). Foi a maneira esperta encontrada para se tirar o foco da mais recente ditadura da história do país. A ditadura anterior esgotou-se em 1945.

Quer saber se a comissão desfrutará de autonomia financeira? Ou seja: se disporá de um orçamento próprio para fazer face às suas despesas? Ora, é claro que não.

Ela se reportará à ministra Gleisi Hoffmann, chefe da Casa Civil da presidência da República, nesse caso a dona da chave do cofre. Gleisi é gente boa. Pode apostar.

Se a comissão poderá convocar pessoas para depor? Outra vez: ora, é claro que não. Poderá convidar. E ninguém será obrigado a aceitar o convite.

Em compensação, poderá requisitar documentos, secretos ou não, de posse de órgãos públicos. De posse, inclusive, do comando das Forças Armadas.

Sim! Aleluia, irmão! Dê graças ao Senhor!

Só tem um probleminha: as Forças Armadas informam mais uma vez que os documentos relativos ao combate travado entre os guardiões da pátria e os comunistas financiados pelo ouro de Moscou desapareceram há muito tempo. Desconfia-se que nem mais existam.

Sendo assim, lamenta-se, sente-se muito, mas não vai dar...

Comissões da verdade contribuíram em diversos países para que a Justiça fosse feita punindo-se criminosos. Ou para que a luz prevalecesse sobre as trevas. A África do Sul é o melhor exemplo disso. Os que confessaram crimes foram anistiados. Os que esconderam, processados.

Aqui, a Lei da Anistia lacrou a porta da Justiça.

Quanto à verdade: ao que tudo indica, um pedaço da nossa História já se perdeu para sempre.

Noblat

sábado, 24 de setembro de 2011

Ética e política terceira parte

 Marilena Chauí
Ética, Política, Liberdade, Igualdade

A primeira dificuldade é a seguinte: o homem, os seres humanos, são diferentes de todas as outras coisas que existem. Que diferença é esta? Todas as coisas que existem estão submetidas às leis necessárias da natureza. A natureza é um enorme sistema de causas e efeitos. Aquilo que a gente chama de Determinismo. Na natureza tudo tem causa, tudo produz um efeito, e a relação entre a causa e o efeito é uma relação necessária. Na natureza não existe acaso. Na natureza não existe jogo. Na natureza não existe Liberdade.

Ao contrário, a marca dos seres humanos é a Liberdade. Os seres humanos não pensam, não agem segundo relações de causa e efeito. Eles agem por escolha. Por deliberação. Por decisão. Eles agem por Liberdade. Eles agem escolhendo os Fins. Fins das ações que eles realizam. Eles agem escolhendo os Fins das ações que eles realizam, das práticas que eles tem, dos comportamentos que eles tem.

E portanto o reino humano ou a esfera humana é diferente do resto da natureza. Esta separação entre a natureza e os humanos se deu a partir de um critério que é fundamental na Ética: que é a liberdade, e a Finalidade. Se a Política vai operar com o critério da Liberdade, da Justiça, das Finalidades Humanas, então há na raiz da Política um valor que é ético. Este valor pode ser chamado de liberdade. Pode ser chamado de Justiça, ele pode ser chamado de responsabilidade. Mas este valor é ético. Então ao mesmo tempo em que há todo este trabalho para separar a Ética e a Política, há toda uma elaboração teórica de separação entre o homem e a natureza que coloca para a Ética e para a Política os mesmos fundamentos. Ou seja elas estão baseadas, as duas, nas mesmas coisas. Elas estão baseadas na Liberdade, na Finalidade, na Temporalidade Humana, no fato de o homem ser um Ser Cultural. Então, a Política vai ter que se dar no interior deste campo comum, que é o campo da cultura, o campo da história, o campo da civilização. Essa é a primeira dificuldade para separar Ética e Política já que elas possuem o mesmo fundamento.

Só que o aparecimento deste fundamento comum entre a Ética e a Política que é a Liberdade vai ao mesmo tempo introduzir um complicador. Que vai explicar afinal porque é tão difícil esta relação entre a Ética e a Política. E este complicador é um complicador para a Ética, para a Política, e para relação entre elas. Que complicador é este?

É o seguinte: ao afirmar que todos os homens, todos os seres humanos são livres é afirmado simultaneamente que por causa disto todos eles são iguais. A igualdade deles é a liberdade. Mas de fato, na prática, esta igualdade não existe muito. Pelo contrário, a sociedade é feita por uma divisão social entre os desiguais. E esta desigualdade, ferindo portanto a liberdade, ferindo aquilo que seria a igualdade, introduz para a Ética e para a Política o problema da Violência. Ou seja a desigualdade real faz com que falar da liberdade como o critério da vida Ética torna a Ética uma coisa irreal porque a igualdade pela qual ela poderia funcionar não existe e torna a Política incapaz também de realizar a liberdade.

(chamo de Violência todo ato pelo qual um ser humano é tratado desprovido de sua humanidade e é tratado como se ele fosse uma coisa). E é assim que nós podemos dizer que há pelo imenso três critérios pelos quais nós podemos dizer que a Ética e a Política se relacionam uma sendo subsídio para a realização da outra.

Primeiro critério: a relação entre meios e fins na Ética é uma relação na qual não há exercício da violência. Que é a violência? É tratar um ser humano como se ele fosse uma coisa. Como se ele fosse um objeto. Tratar um ser humano como um sujeito e não como um objeto é tratá-lo eticamente. Se a Política na esfera pública for capaz de tratar os fins políticos através de meios não violentos, não tratando os seres humanos como coisa nós temos uma Política Ética.

Segundo critério - embora a Ética se realize no campo da vida privada, o que a Ética busca nesta esfera que lhe é própria é a idéia de que nenhuma autoridade é legítima se ela for despótica, se ela for arbitrária, se ela se realizar como expressão da vontade individual, injustificada de alguém. Neste caso é a Política que vai ajudar a Ética na medida em que o próprio da esfera pública é afastar a autoridade despótica, isto é, aquela autoridade que se exerce como uma vontade pessoal, individual, arbitrária, acima de todas as outras. Assim agora a relação vem da Política para a Ética em que a Ética auxilia na luta contra as formas arbitrárias de autoridade no interior da vida privada. Isto significa, por exemplo, que a posição do pai, da mãe, do avô, da avó, do patrão, do chefe, não é tão simples. Não basta a vontade deles para que a autoridade deles seja eticamente legítima. A Política nos ajuda portanto a melhorar a própria Ética.

Terceiro critério: é o critério que pode valer para a Ética e para a Política que é a redefinição da idéia de liberdade. Em vez de pensarmos a liberdade como o direito de escolha vale a pena pensar a liberdade como o poder de criar o possível. Ou seja, a liberdade é esta capacidade dos seres humanos de fazer existir o que não existia. De inventar o possível. De inventar o novo. E se a liberdade for pensada desta maneira, a relação entre a Ética e a Política pode se dar como criação histórica na esfera privada e na esfera pública. Estou convencida de que há uma única forma da Política compatível com a Ética e uma única modalidade da Ética compatível com a Política. Essa forma Política é a democracia. E esta forma Ética é a liberdade através dos direitos. Então como a democracia é o campo da criação dos direitos e como a Ética é a afirmação de direitos através do direito fundamental que é o direito à vida e à liberdade, a compatibilidade entre a Ética e a Política só pode ocorrer quando o campo da Política permite o tratamento dos conflitos e quando o campo da Ética permite a divulgação dos seus princípios.

Então eu diria que é a possibilidade de dar à Ética um conteúdo público e de dar à Política um conteúdo moral que ocorre na democracia. Acho que não foi por acaso, indo lá no meu ponto de partida, não foi por acaso que os inventores da Política, os gregos, considerassem que era só na Política que a Ética se realizava e por Política eles entendiam a democracia como igualdade perante a lei, (a isonomia). E o direito a expor, a discutir e votar a opinião em púbico que é a isegoria.

Então se nós considerarmos que o campo da Ética é o campo da liberdade e o campo da Política é também o campo da liberdade, só uma forma Política na qual esse princípio possa se realizar é que torna viável uma relação entre a Ética e a Política. O que significa que o ideal ético da visibilidade só pode se realizar na prática Política da democracia, e vice-versa. Evidentemente isto seria um ponto de partida. Isto não é uma conclusão. Pelo contrário se assim for nós precisaremos começar tudo de novo. Pois nós temos que recomeçar a discutir a desigualdade, a violência, a mentira, a corrupção, a privatização e a oficialização estatal de nossas vidas.

Belo Monte: quando as formiguinhas encurralaram o elefante !

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Desabafo de uma idosa

"Na fila do supermercado o caixa diz uma senhora idosa que deveria trazer suas próprias sacolas para as compras, uma vez que sacos de plástico não eram amigáveis ao meio ambiente. A senhora pediu desculpas e disse: “Não havia essa onda verde no meu tempo.”


O empregado respondeu: "Esse é exatamente o nosso problema hoje, minha senhora. Sua geração não se preocupou o suficiente com  nosso meio ambiente. "

"Você está certo", responde a velha senhora, nossa geração não se preocupou adequadamente com o meio ambiente.

Naquela época, as garrafas de leite, garrafas de refrigerante e cerveja eram devolvidos à loja. A loja mandava de volta para a fábrica, onde eram lavadas e esterilizadas antes de cada reuso, e eles, os fabricantes de bebidas, usavam as garrafas, umas tantas outras vezes.

Realmente não nos preocupamos com o meio ambiente no nosso tempo. Subíamos as escadas, porque não havia escadas rolantes nas lojas e nos escritórios. Caminhamos até o comércio, ao invés de usar o nosso carro de 300 cavalos de potência a cada vez que precisamos ir a dois quarteirões.


Mas você está certo. Nós não nos preocupávamos com o meio ambiente. Até então, as fraldas de bebês eram lavadas, porque não havia fraldas descartáveis. Roupas secas: a secagem era feita por nós mesmos, não nestas máquinas bamboleantes de 220 volts. A energia solar e eólica é que realmente secavam nossas roupas. Os meninos pequenos usavam as roupas que tinham sido de seus irmãos mais velhos, e não roupas sempre novas.

Mas é verdade: não havia preocupação com o meio ambiente, naqueles dias. Naquela época só tínhamos somente uma TV ou rádio em casa, e não uma TV em cada quarto. E a TV tinha uma tela do tamanho de um lenço, não um telão do tamanho de um estádio; que depois será descartado como?

Na cozinha, tínhamos que bater tudo com as mãos porque não havia máquinas elétricas, que fazem tudo por nós. Quando embalávamos algo um pouco frágil para o correio, usamos jornal amassado para protegê-lo, não plastico bolha ou pellets de plástico que duram cinco séculos para começar a degradar.

Naqueles tempos não se usava um motor a gasolina apenas para cortar a grama, era utilizado um cortador de grama que exigia músculos. O exercício era extraordinário, e não precisava ir a uma academia e usar esteiras que também funcionam a eletricidade.


Mas você tem razão: não havia naquela época preocupação com o meio ambiente. Bebíamos diretamente da fonte, quando estávamos com sede, em vez de usar copos plásticos e garrafas pet que agora lotam os oceanos. Canetas: recarregávamos com tinta umas tantas vezes ao invés de comprar uma outra. Abandonamos as navalhas, ao invés de jogar fora todos os aparelhos 'descartáveis' e poluentes só porque a lámina ficou sem corte.
Na verdade, tivemos uma onda verde naquela época. Naqueles dias, as pessoas tomavam o bonde ou de ônibus e os meninos iam em suas bicicletas ou a pé para a escola, ao invés de usar a mãe como um serviço de táxi 24 horas. Tínhamos só  uma tomada em cada quarto, e não um quadro de tomadas em cada parede para alimentar uma dúzia de aparelhos. E nós não precisávamos de um GPS para receber sinais de satélites a milhas de distância no espaço, só para encontrar a pizzaria mais próxima.

Então, não é risível que a atual geração fale tanto em meio ambiente, mas não quer abrir mão de nada e não pensa em viver um pouco como na minha época?

Texto repassado por Marline Dassoler

Ética e Política, segunda parte


 Marilena Chaui
Modernidade, Ética e Política

É esta esfera que a modernidade vai constituir. A partir da queda do antigo regime, da queda das monarquias por direito divino, da desmontagem do poder teológico-político e do ressurgimento da idéia de República, (primeiro a República oligárquica, depois a República representativa, depois a República Democrática), é que se reconfigura o campo público, da Política. Como o poder estava marcado pela Ética da esfera privada, como o poder estava marcado pela idéia de que o governante é que tinha que ser virtuoso, o que acontece com os pensadores que vão criar a nova idéia de Política, que vão dizer que existe sim a “res publica”(coisa pública, o espaço público)?. O que é que eles vão fazer?

Eles vão dizer que o espaço público, a “res publica”, o poder político, não pode ser regido pelos valores do espaço privado. Portanto pelos valores da Ética. Pelos valores da virtude. E eles vão separar, e esta grande separação é feita por Maquiavel, eles vão separar o público e o privado dizendo que o privado é campo da Ética, o público é o campo da Política. E a Política e a Ética não tem mais nada em comum. O que vai ser dito é que o campo da política não é regido pelas virtudes do governante.

O campo da Política é regido por uma lógica que é a lógica das relações de força. E para que o campo da Política não seja o campo da violência e da guerra é preciso lidar com esse campo de forças, e portanto com os conflitos, com as divisões que caracterizam a sociedade, com essas diferenças, de um modo tal que a Política não seja a guerra. Que a Política não seja a pura força, a pura violência, mas que ela tenha uma lógica das forças que é encarnada no poder político como um polo que simboliza para o todo da sociedade uma unidade que ela própria não tem. E que se realiza através das instituições e através da lei. E portanto o importante é a qualidade da lei e a qualidade das instituições, a qualidade do direito e da justiça, a qualidade das decisões. E não mais se a pessoa ou as pessoas que ocupam o campo político são ou não virtuosas. E a virtude e portanto com ela a Ética se tornam uma coisa própria da vida privada.

Sociedade Civil e Estado

A esfera da sociedade civil que é onde os indivíduos existem, é a esfera da vida privada. Ora, se a sociedade civil é a esfera da vida privada como é que o Estado se constitui como esfera pública. Se o Estado surge a partir da sociedade Civil para regulamentar a Sociedade Civil e comandá-la? Ou seja, a base do Estado são as relações privadas do mercado, baseadas, por exemplo, na lógica da competição.

Então o que se quer dizer é o seguinte: a sociedade moderna ao criar a Sociedade Civil como o mercado dos contratos doe trabalho, da produção de mercadorias e da acumulação do capital, e da propriedade privada, faz com que a esfera pública, que é uma esfera social, seja uma esfera privada. A esfera dos proprietários privados. E portanto nós não sabemos onde o Estado vai nascer para ser propriamente esfera pública.

Assim a separação que dizia: na esfera pública eu tenho a lógica Política e na esfera privada eu tenho a lógica Ética, se complica. Porque eu tenho aí uma esfera que é pública, que é a esfera social, na qual os elementos da vida privada estão presentes.

Nós podemos dizer que há dois motivos principais para essa enorme dificuldade que existe no nosso mundo contemporâneo para separar o público do privado e deixar a Ética em um dos lugares e a Política em outro.

Dilma na ONU

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

ÉTICA E POLÍTICA


Publicarei em três post algumas reflexões de Marilena Chauí sobre Ética e Política. São reflexões que vale a pena ler e entender no contexto atual. A seguir a primeira parte.

 Por Marilena Chauí

A Política foi uma coisa inventada pelos gregos. Isto não quer dizer que antes dos gregos, antes dos romanos não houvesse o exercício do poder, não houvesse governo, não houvesse autoridade. Claro que havia, nos grandes impérios que existiram antes e depois do mundo grego e do mundo romano. Mas qual era a marca do poder nestes grandes impérios antigos. A marca era a identidade entre o poder e a figura do governante. O governante era a encarnação do poder. Como pessoa encarnava nele a autoridade inteira, o poder inteiro. Ele era o autor da lei, o autor da recompensa, o autor do castigo, o autor da justiça. Ou seja, a vontade do governante, a vontade pessoal, individual dele era a única lei existente. O que nós podemos dizer não é que não houvesse o poder, a autoridade antes dos gregos e dos romanos. Pelo contrário, a imensidão dos grandes impérios antigos mostra que o poder estava lá. Qual é a diferença entretanto dos gregos e romanos face a estes grandes impérios, a este grande poder que havia na antigüidade? Antes dos gregos e dos romanos, a característica do poder era a identificação entre o ocupante do poder e o próprio poder. Ou seja, o governante era o próprio poder. Isto quer dizer uma coisa muito simples: a vontade do governante, a sua vontade privada, pessoal, sua vontade arbitrária, caprichosa, o que lhe desse na telha, era a lei. E era ela o critério para a guerra, para a paz, para a vida, para a morte, para a justiça, para a injustiça. Que fizeram os gregos e os romanos?

Eles inventaram a Política.

Ou seja, eles criaram a idéia de um espaço onde o poder existe através das leis. As leis não se identificam com a vontade dos governantes, elas exprimem uma vontade coletiva. Essa vontade coletiva se exprimia em público, nas assembléias, através da deliberação, da discussão e do voto. Ou seja, os gregos e os romanos submeteram o poder a um conjunto de instituições e a um conjunto de práticas que fizeram dele algo público, que concernia à totalidade dos cidadãos, e que era discutida, deliberada e votada por eles. E, portanto, eles criaram a esfera pública. Aquilo que nós chamamos de esfera pública. Ou seja, ninguém se identifica com o poder, a vontade de ninguém é lei, e portanto a autoridade é coletiva, pública, é aquilo que constitui o cidadão. Os gregos puderam e depois deles os romanos distinguir com muita clareza a autoridade política ou autoridade pública e a autoridade privada. Não por acaso a autoridade privada tem um nome muito especial. Em grego o chefe de família, que é aquele que detém a autoridade do espaço privado (e detém esta autoridade exclusivamente por sua vontade - a vontade dele é a lei), o chefe de família se chama “despotes”. E é porque a autoridade privada do espaço privada da família é a autoridade do “despotes” (a autoridade absoluta de vida e morte sobre todos os membros da família), é que a autoridade no espaço privado se chama despótica. E os gregos diziam: quando a autoridade for despótica, o espaço público foi tomado pelo espaço privado e a Política acabou. A condição da Política é que não haja despotismo.

Cristianismo: público x privado

O cristianismo vai criar um problema no campo da Política. Por que? Porque se para os antigos era no espaço público que a Ética melhor se realizava, no momento em que com o Cristianismo o espaço público é recusado em nome do espaço privado, do recinto, do coração e da consciência, o que acontece? O que acontece no momento em que surgem as autoridades cristãs? Ou seja, como é que vai haver um espaço público cristão? Já que a autoridade e a Ética são pensadas de maneira privada? Ou seja, Deus é o Pai, Deus é o Senhor, os cristãos são a sua família. Ele é o pastor de um só rebanho. Todas as metáforas e todas as palavras que indicam a autoridade no mundo cristão pertencem ao espaço privado: é o pai, é o senhor, é o pastor, o rebanho. Como é que isto vai se constituir como um espaço público? Não há como constituir como espaço público. Nós poderíamos ir enumerando uma série de características do poder medieval e portanto do poder cristão ou daquilo que agente pode chamar o poder teológico-político pelo qual o governante é uma figura privada. O espaço do poder é um espaço privado. E a Ética é a Ética da pessoa do governante. É ele que tem que ser educado para as virtudes. É ele que não pode ter vícios. É ele que tem que cumprir o dever porque das qualidades dele dependem as virtudes ou os vícios, a felicidade ou a corrupção do rei. Não existe portanto a esfera Política propriamente dita. Existe a esfera do poder mas não a esfera da Política.