Não às Soluções Baseadas na Natureza! Grandes poluidoras do clima, como a Shell e a Nestlé, estão vendendo uma farsa perigosa. Elas dizem que conseguem reduzir suas emissões de gases de efeito estufa a zero e continuar queimando combustíveis fósseis, extraindo mais minérios no planeta e aumentando a produção industrial de carne e laticínios. Eles chamam isso de reduzir as emissões a um patamar “líquido zero”. Plantar árvores, proteger florestas e mudar práticas da agricultura industrial, afirmam elas, armazenará carbono extra nas plantas e no solo em quantidade suficiente para compensar as emissões de gases do efeito estufa que essas empresas lançam na atmosfera.
O que as grandes empresas e os grandes grupos conservacionistas chamam de “soluções baseadas na natureza” é uma perigosa distração. Seu conceito propagandístico é disfarçado com dados não comprovados e equivocados, e com a afirmação de que a ideia pode proporcionar 37% das reduções de CO2 até 2030. Cada vez mais empresas, da Total à Unilever, passando pela Microsoft, estão fazendo das “soluções baseadas na natureza” o centro de seus planos de ação climática, enquanto o setor de conservação recorre ao financiamento empresarial para as “soluções baseadas na natureza”, com o objetivo de expandir seu controle sobre as florestas.
Do ponto de vista do setor de conservação, a ideia é simples: as grandes empresas pagam para cercar florestas ou plantar árvores em terras que alegam estar “degradadas” e que poderiam absorver mais carbono se fossem restauradas. Em troca, afirmam estar compensando os danos climáticos de suas emissões contínuas de gases de efeito estufa. Frequentemente, usa-se um documento, conhecido como crédito de carbono, para comercializar essa suposta compensação.
Ao falar de “natureza”, grandes empresas e grandes grupos conservacionistas se referem a espaços cercados, sem pessoas. Eles querem dizer áreas protegidas monitoradas por guardas florestais armados, plantações de árvores e grandes fazendas de monoculturas. A “natureza” deles é incompatível com a natureza entendida como território, como espaço de vida indissociável de culturas, sistemas alimentares e meios de subsistência das comunidades que dela cuidam e da qual se consideram partes intrínsecas. Além do mais, por trás de uma fachada propagandística de iniciativas reais de agroecologia e regeneração natural, os apoiadores das “soluções baseadas na natureza” estão se preparando para promover práticas ainda mais prejudiciais, como plantações de monoculturas de árvores e agricultura industrial.
Portanto, as “soluções baseadas na natureza” não são soluções, e sim uma farsa. As supostas soluções resultarão em “espoliações baseadas na natureza” porque cercarão os espaços de vida restantes de povos indígenas, agricultores e outras comunidades que dependem da floresta, e reduzirão a “natureza” a uma prestadora de serviços para compensar a poluição das empresas e proteger os lucros das corporações que são as maiores responsáveis pelo caos climático. Comunidades indígenas, de agricultores e outras que dependem da floresta, cujos territórios estão sendo cercados, enfrentarão mais violência, mais restrições ao uso de suas terras e mais controle externo sobre seus territórios.
As “soluções baseadas na natureza” são uma repetição dos esquemas fracassados de plantio de árvores e conservação florestal do REDD+, que os mesmos grupos de conservação vêm promovendo nos últimos 15 anos. O REDD+ nada fez para reduzir as emissões globais de gases de efeito estufa ou conter as grandes empresas de alimentos e agronegócio que causam desmatamento. Seu legado duradouro, entretanto, é a perda de terras e florestas por comunidades de agricultores e outras que dependem da floresta, e fortes restrições sobre os usos que elas podem fazer de suas terras. O REDD+ também deu origem a uma indústria de consultores e proponentes de projetos de “sustentabilidade e salvaguardas”, que lucram ao declarar que os projetos de REDD+ são “sustentáveis”, apesar das violações de direitos que causam. Os proponentes de “soluções baseadas na natureza” estão agora empregando as mesmas táticas dos esquemas de certificação e salvaguardas para desviar as críticas e ocultar a tomada de terras e florestas comunitárias.
As empresas cujos planos de ação climática incluem “soluções baseadas na natureza” pretendem aumentar a produção altamente poluente. Na lógica equivocada das “soluções baseadas na natureza” de caráter empresarial, mais poluição significa que as grandes empresas demandarão mais terras para o armazenamento de carbono, o que implicará mais expropriações e mais restrições à pequena agricultura e ao uso que as comunidades fazem de seus territórios. Também implicará ainda mais controle das empresas sobre terras e florestas.
A companhia italiana de energia Eni diz que, em 2050, ainda estará usando combustíveis fósseis para gerar 90% de sua energia. Para compensar essas emissões, terá que usar todo o potencial de todas as florestas da Itália para absorver carbono – 8 milhões de hectares para sustentar a “emissão líquida zero” da Eni! De acordo com a ONG Oxfam, as metas de emissão líquida zero de apenas quatro das grandes empresas de petróleo e gás (Shell, BP, Total e Eni), sozinhas, poderiam exigir uma área de terra com o dobro do tamanho do Reino Unido. Essas são apenas algumas das grandes empresas de energia. O plano de emissão “líquida zero” da maior empresa de alimentos do mundo, a Nestlé, poderia exigir 4,4 milhões de hectares de terra por ano para compensações. E os planos de grandes empresas de tecnologia, como a Microsoft e a Amazon, também se baseiam no cercamento de áreas igualmente grandes.
Grandes empresas e grandes ONGs conservacionistas estão vendendo essa mais recente solução empresarial falsa não apenas nas negociações sobre o clima; elas também estão levando a ideia para as reuniões governamentais da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) da ONU. No contexto da Cúpula de Sistemas Alimentares, em setembro de 2021, a “Produção positiva para a natureza” está sendo usada como um conceito semelhante às SBN, para industrializar ainda mais a agricultura e ampliar o controle por parte das empresas. Se essas tentativas forem bem-sucedidas, o resultado será mais caos climático e uma perda ainda mais rápida de biodiversidade, enquanto as empresas continuam lucrando com a destruição e a queima de carbono fóssil.
Os governos precisam saber que há um movimento crescente de comunidades da linha de frente, organizações e ativistas da justiça climática. Os signatários desta declaração permanecerão unidos para resistir às tentativas de tomar os territórios das pessoas para expropriações baseadas na natureza e compensação de carbono. Apelamos aos movimentos climáticos, ambientais e de justiça social para que rejeitem inequivocamente as “soluções baseadas na natureza” e todos os esquemas de compensação. Esses esquemas não foram concebidos para enfrentar a crise climática. Sua função principal é comprar mais uma ou duas décadas de lucro desenfreado para as empresas a partir da extração de carbono fóssil e da agricultura industrial, ao mesmo tempo em que aumenta o controle externo sobre os territórios das comunidades. A neutralidade climática significa pouco mais do que reduções no papel, alcançadas por meio de contabilidade criativa e emissões hipotéticas evitadas, que não podem ser confirmadas. O tempo acabou para essas distrações. Apenas um plano rápido e com prazos definidos que inclua deixar no solo as reservas restantes de carvão, petróleo e gás e mudar a agricultura industrial evitará o caos climático catastrófico.
Comunidades da linha de frente que se opõem à extração de combustíveis fósseis, oleodutos, minas, plantações e outros projetos da indústria extrativa estão mostrando o caminho. A oposição às “soluções baseadas na natureza” e a resistência das comunidades contra a destruição de depósitos subterrâneos de carbono, a mineração empresarial e o agronegócio devem ser entendidas como parte da mesma luta maior para impedir a tomada dos territórios das comunidades pelas empresas.
As comunidades de base também estão na vanguarda das lutas pela soberania alimentar e a agroecologia, que são necessárias para resolver as muitas crises que afetam o planeta. Reconhecemos e apoiamos as lutas das comunidades de base pelo controle dos territórios dos quais dependem, hoje e no futuro. É hora de nos mantermos unidos! Junte-se a nós!Rejeite as soluções baseadas na natureza como uma nova forma de tomada de terras e lavagem verde pelas grandes empresas! Diga NÃO às Espoliações Baseadas na Natureza!A declaração permanece aberta para assinatura até o final de 2021Adicione sua organização>>> A declaração completa com as assinaturas até 31 de outubro de 2021 está disponível em português, espanhol, inglês e francês. |
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