sexta-feira, 10 de junho de 2016

Por uma reforma política em defesa da democracia - sem golpes.

Fala na Assembléia Legislativa do Acre
Com os nervos a flor da pele assisto na TV, jornais, revistas e nas redes sociais grupos e pessoas se digladiando e todos afirmam defender a democracia, o Brasil...

Naturalmente não preciso chamar a atenção para os desvios históricos que ambos os grupos tomam como sendo verdadeiros. O primeiro atribuo mais aos de "azul" que aos de "vermelho" que é o fato de atribuir ao PMDB a redemocratização do pais. Segundo os defensores dessa insanidade histórica o PMDB foi quem restabeleceu a democracia por dois motivos, Sarney assume depois do falecimento do Tancredo durante um momento crucial da redemocratização que foi a campanha pelas diretas e, finalmente o primeiro governo civil depois dos seguidos governos militares e também por causa de Ulisses Guimarães que teria "conduzido" o processo constituinte. Bem, a história, portanto, tem sido fraudada desde sempre.

O que se seguiu foram governos que, segundo a tese em vigor do golpe, seriam ou de direita ou ilegítimos. De direita nos casos de Collor e Fernando Henrique e ilegitimo e golpista com Itamar Franco. Isso dura até 2003 quando assume a presidência o Lula. No caso do Lula, tenho que recordar ao leitor, que ele chegou ao poder em coligação com o Partido Liberal que fez o vice José Alencar, que se reelegeria com Lula pra um segundo mandato.

Além de se coligar com um partido clara e declaradamente de direita, Lula, ainda em campanha em 2002, faz publicar o que chamou de "Carta aos brasileiros" onde faz uma guinada gigantesca à direita neoliberal, ao mercado. A Carta diz em um trecho:  

"Será necessária uma lúcida e criteriosa transição entre o que temos hoje e aquilo que a sociedade reivindica. O que se desfez ou se deixou de fazer em oito anos não será compensado em oito dias. O novo modelo não poderá ser produto de decisões unilaterais do governo, tal como ocorre hoje, nem será implementado por decreto, de modo voluntarista. Será fruto de uma ampla negociação nacional, que deve conduzir a uma autêntica aliança pelo país, a um novo contrato social, capaz de assegurar o crescimento com estabilidade. Premissa dessa transição será naturalmente o respeito aos contratos e obrigações do país."

Com esse breve recordo histórico pretendo apenas demonstrar que a questão que se coloca no fundo é não a participação popular nos pactos pela governabilidade e pela democracia, isso em nenhum dos grupos políticos que ascenderam ao poder da república. Neste ponto portanto, mais uma vez, se igualam os direta de azul com os direita de vermelho. E se é para falar em golpe, todos são golpistas.

Os pactos sempre foram feitos entre o mercado e os partidos sem nunca considerarem o povo. A carta de Lula em 2002, carta aos brasileiros, na verdade foi uma carta ao mercado onde restabelecia o pacto garantindo que o povo não tomaria parte, mesmo que historicamente o PT vinha se projetando justamente por afirmar a necessidade de considerar o povo, as bases, neste pacto. O PT chega ao poder optando pelo pacto com os partidos e o mercado e menosprezando a força popular que só se via nos discursos populistas de sua principal liderança.

Esse pacto com os partidos e com o mercado começou a ser questionado em junho de 2003 quando uma massa foi às ruas dizer que "não me representam". Isso significava dizer dizer que o povo não estava representado no pacto e que exigia e cobrava sua participação neste pacto. Neste momento ruíram-se o pacto e a consequente representatividade. Portanto, um governo, qualquer governo, que não representa a vontade popular é um governo ilegítimo. A partir desta tomada de consciência, para o povo qualquer um dos candidatos que ganhasse  as eleições de 2014, seria ilegítimo mesmo que eleito pelo voto direto. A ilegitimidade estava justamente na ausência do povo no pacto para a eleição e consequente representatividade deste mesmo povo.

E como escolher entre dois ilegítimos? Logo após as manifestações de junho de 2013 a presidente Dilma foi à TV anunciar que faria uma consulta popular e proporia uma reforma política. Isso garantiu a ele uma maioria estreita mas suficiente para reelegê-la. Claro que também os tradicionais movimentos ligados ao PT foram às ruas e procuraram "garantir" que no "novo" governo a presidente Dilma finalmente iria ouvir o povo... Isso fez com que a maioria que, como disse, ainda que por estreita margem, reelegesse a Dilma. O que se revelou mais uma mentira e enganação. Mais uma vez o pacto foi feito com as elites, o mercado e os partidos, notadamente os de centro para a direita.

Se sentindo enganado, e de fato fomos, o povo volta a se manifestar e repudiar o novo pacto feito pelo governo com os partidos e o mercado. O lado derrotado nas eleições percebendo essa insatisfação popular, vê ai uma possibilidade de angariar e arregimentar militância, coisa que nunca tiveram, e ao mesmo tempo colher dividendos políticos e construir as bases para o impedimento da presidente eleita.

 O governo preferiu manter o pacto com as elites (aqui abro um parêntese para explicar que os sindicatos e seus gordos fundos também fazem parte da elite) e seguir fazendo fisiologismo em nome da "governabilidade". Como o povo seguia, e segue até o presente momento, sem nenhuma sinalização de que será ouvido, o campo para o impedimento está aberto e dificilmente se conseguirá reverter essa situação até mesmo porque existem elementos que só complicam ainda mais, não só o governo suspenso da Dilma como o do governo em exercício do Temer. Complicam os dois governos porque os dois governos fazem parte do mesmo pacto e, portanto, em nenhum deles o povo está representado. Elementos que complicam é que todos os membros do pacto, partidos, elites, mercado, estão envolvidos em corrupção, desmandos, acintes e deboches contra o povo. Quer dizer, em nome da governabilidade e do poder, perdeu os dois, a governabilidade e o apoio popular.

O fato é que, seja com a volta da Dilma, seja com a permanência do Temer, não haverá outra alternativa que não seja uma repactuação e dessa vez tem que passar necessariamente pelo "ouvir" o povo. Tem que haver uma consulta popular, convocação de uma constituinte exclusiva para fazer a reforma política, já que com esses que ai estão e estão justamente por causa do pacto ilegítimo e, logo, são todos eles ilegítimos, não o farão, seja por não serem legítimos, seja por não terem moral e dignidade para tanto ou ainda por não desejarem nenhuma mudança. Somente após uma reforma política é que poderemos ter novas eleições e que de preferência antecipada em relação a 2018. O povo não vai esperar até 2018 para fazer as mudanças, fará nem que seja na marra.
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