Renato Santana
Editor do jornal Porantim
Lideranças indígenas reunidas em Brasília enfrentaram nesta quinta-feira, 8, a bancada ruralista e representantes do latifúndio de Rondônia em debate feito na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária do Senado Federal, presidida por Acir Gurgacz (PDT/RO).
Na pauta, a demarcação de terras indígenas, dentro do processo de identificação e delimitação.
Para o debate, foram convidados representantes da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), do Sindicato dos Pecuaristas de Porto Velho, Fundação Nacional do Índio (Funai), Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e Articulação dos Povos Indígenas Brasileiros (Apib).
O que os ruralistas não esperavam era a grande mobilização de indígenas, que tomaram conta da sala onde transcorreu o encontro da comissão. Tiveram que ouvir de cabeça baixa a fala do representante da Apib, Eliseu Guarani Kaiowá, do Mato Grosso do Sul.
Momentos antes, o senador Waldemir Moka (PMDB/MS) bancou o cínico e disse que em seu estado a relação entre indígenas e fazendeiros era boa. Eliseu falou na sequência e lembrou dos 250 Guarani Kaiowá assassinados entre 2003 e 2010 no Mato Grosso do Sul.
“Não pode dizer que é um ser humano quem mata e depois some com o corpo”, disse Eliseu lembrando que as mortes eram fruto do massacre imposto aos indígenas que lutam por seu território tradicional no estado.
A participação dos indígenas pode ser considerada um termômetro, cujo indicador altera de maneira significativa apontando para a mobilização dos povos indígenas de forma ascendente. O recado é claro: os ruralistas não vão fazer o que bem entendem com as leis para entrar nas terras indígenas com seu gado, tratores e truculência desumana, sempre ao arrepio dos direitos constitucionais. Podemos perguntar, afinal: onde estavam esses senhores enquanto o povo brasileiro brigava pela carta constitucional?
A comissão tratou das demarcações em todo país, mas com destaque para a situação de Rondônia. De terça-feira, 6, até esta quinta-feira, 8, aconteceu um encontro de lideranças indígenas do estado e noroeste de Mato Grosso. O documento final segue na íntegra e compõe a conjuntura das discussões travadas no Senado Federal.
Documento Final
Nos dias 06 a 08 de março de 2012, lideranças indígenas dos povos Arara, Puruborá, Wayoró, Djeoromitxi, Aruá, Makurap, Cujubim, Tupari, Kassupá, Mamaindê, Karitiana, Gavião, Migueleno, Zoró, com assessoria da liderança Babau Tupinambá, nos reunimos em Ji-Paraná, Rondônia, para discutir a demanda territorial dos povos indígenas de Rondônia e noroeste do Mato Grosso, baseado na Constituição Federal, que reconhece e garante aos povos indígenas os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam.
Para nós, povos indígenas, a terra e a água são sagradas, fonte de vida e sustentação para nós e para as gerações futuras. Por isso, não a temos como objeto de exploração econômica, como fazem os grupos econômicos, que a vêem como mercadoria a ser negociada.
Somos impactados por grandes empreendimentos, como as hidrelétricas de Jirau e Santo Antonio, as Pequenas Centrais Hidrelétricas que são seis na bacia do rio Branco, rio Cascata, Altoé e outras; rodovias, Projeto Terra Legal, agronegócio, agropecuária e outras grandes obras a serem implantadas em Rondônia como as hidrelétricas de Tabajara e Ribeirão, as hidrovias, ferrovia transcontinental e outros projetos econômicos, que avançam sobre os nossos territórios ocasionando a discriminação, o envenenamento e assoreamento de nossos rios, diminuição da pesca e caça, invasão de madeireiros, pescadores e plantadores de soja e cana-de-açúcar, causando a vulnerabilidade e a expulsão dos povos de suas terras.
Além disso, estamos constantemente sendo ameaçados por medidas governamentais e legislativas, que travam o cumprimento da Constituição Federal, no que diz respeito a garantia dos territórios tradicionais e outros direitos garantidos na Constituição Federal. Constatamos que quase todas as terras indígenas de Rondônia e noroeste do Mato Grosso demandam ao Estado ações na agilização das demarcações de terra, bem como a agilização dos Grupos de Trabalhos já constituídos.
O governo diariamente passa por cima da decisão do movimento indígena, mandando para o Congresso projetos de leis que atentam contra os direitos indígenas, como a lei de mineração em terras indígenas e outras tantas. Deputados federais e senadores, inimigos dos povos indígenas, tentam através de emendas constitucionais como as PEC 38/99 e PEC 215/2000, que passa para o Congresso a competência da demarcação das terras indígenas.
Exigimos do Estado medidas que garantam a posse permanente de todos os nossos territórios tradicionais:
1. Conclusão do processo demarcatório dos povos: Puruborá, Migueleno, Wayoro, Cujubim, Karitiana;
2. A constituição dos Grupos de Trabalho para os povos: Kassupá, Djeoromitxi, Tupari, Aruá, Aikanã, Zoró (Zabeawej), Gavião e Arara;
3. Medidas com relação à fiscalização dos territórios contra a invasão de madeireiros, fazendeiros, garimpeiros, pescadores e projetos econômicos;
4. Seja respeitado o direito a consulta, como determina a Convenção 169 da OIT;
5. Garantir a sobrevivência física e cultural e a proibição de implantações de projetos econômicos, dentre eles: Hidrelétrica de Santo Antonio e Jirau, que afetam diretamente os povos que estão em situação de isolamento e risco;
6. Garantir a Proteção Física de lideranças indígenas que estão sendo ameaçadas de morte;
7. Aprovação do Estatuto dos Povos Indígenas, nos termos propostos pela CNPI e a aprovação da Lei que cria o Conselho Nacional de Política Indigenista.
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