“....É preciso separar claramente o joio do trigo. Na pertinente análise feita por Célia Maria Motta no artigo “A atualização da crise neoliberal”(*), esta separação foi bem feita. No entanto, ao incluir a economista Amyra El Khalili no joio, Célia foi apressada. Primeiramente por se valer de apenas um título de Amyra, o que é insuficiente para considerá-la uma pensadora que ensina a se aproveitar da crise para ganhar dinheiro. Se outros trabalhos da economista fossem lidos, ficaria clara a posição dela em favor de soluções que superam o neoliberalismo em benefício honesto para o ambiente e os grupos humanos desfavorecidos...”
Por Arthur Soffiati
Pela primeira vez na sua história, a Terra vive uma crise socioambiental plantaria produzida por uma única espécie agindo de forma coletiva. Esta espécie é o “Homo sapiens”, da qual fazem parte tanto os construtores dos sistemas capitalista e socialista, ambos responsáveis pela crise, quanto os verdadeiros críticos dela.
Acuado em poucos países, o socialismo já deu contribuição maior à crise socioambiental planetária da atualidade. Hoje, só a China, que ainda se proclama socialista, mas que desenvolveu uma economia de mercado profundamente agressiva ao ambiente, pode ser apontada como representante de uma experiência fracassada. No mais, o capitalismo, na sua versão neoliberal, se expandiu e criou um mundo globalizado, com seus lucros e crises.
A crise socioambiental planetária da atualidade tanto pode se constituir num fértil campo a críticos que buscam saídas honestas para os problemas sociais e ambientais quanto abre grandes oportunidades para ampliar os lucros e aprofundar mais ainda a crise. Os conceitos de “desenvolvimento sustentável” e de “economia verde” são enganosos, pois que usados para convencer os incautos de que os grandes grupos empresariais e os governos estão empenhados no combate à crise.
Estes conceitos procuram demonstrar que a transformação de todos os bens naturais em mercadoria será benéfica para todos. Bens antes considerados completamente fora do mercado, como o ar, a fotossíntese, a capacidade de troca catiônica, a polinização, enfim, os bens e serviços ambientais gratuitos, começam a ser mercadorizados para permitir o avanço do capitalismo e do lucro.
É preciso separar claramente o joio do trigo. Na pertinente análise feita por Célia Maria Motta no artigo “A atualização da crise neoliberal”(*), esta separação foi bem feita. No entanto, ao incluir a economista Amyra El Khalili no joio, Célia foi apressada. Primeiramente por se valer de apenas um título de Amyra, o que é insuficiente para considerá-la uma pensadora que ensina a se aproveitar da crise para ganhar dinheiro. Se outros trabalhos da economista fossem lidos, ficaria clara a posição dela em favor de soluções que superam o neoliberalismo em benefício honesto para o ambiente e os grupos humanos desfavorecidos.
Em segundo lugar, Célia dissociou o pensamento de Amyra da sua ação. A economista não se refugia nos fortins da academia como mera observadora do mundo. Bem ao contraio, ela está no mundo. Ela toma partido. Não é por falar em commodities que apressadamente se pode julgá-la como defensora do neoliberalismo. Quem acompanha a trajetória de Amyra, como é o meu caso, sabe que ela deixou uma carreira brilhante em bolsas de valores para, na sua vida monástica atual, posicionar-se ao lado das comunidades tradicionais, das comunidades quilombolas e das nações indígenas. Como ser humano, mulher e palestina, Amyra defende a causa dos pobres, das mulheres e das nacionalidades humilhadas, como é o caso da Palestina.
Para quem não tira os pés da academia, é fácil cometer injustiças. Como eu tenho um pé na academia e outro fora dela, sei bem como funciona a lógica acadêmica. Mas sei também como é difícil combater verdadeiramente a crise socioambiental da atualidade buscando um mundo melhor para a natureza e para a humanidade. Em sala de aula, Amyra nunca perde de vista a realidade externa. Fora dela, Amyra colhe subsídios e experiências para levar aos seus alunos.
(*) O artigo de Célia Maria Motta, “A atualização da crise neoliberal” pode ser acessado no site da PUC/SP em: http://www.pucsp.br/neils/ downloads/1_celia.pdf
Arthur Soffiati é doutor em História Social com concentração em História Ambiental pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Professor aposentado da Universidade Federal Fluminense, integra o Núcleo de Estudos Socioambientais da mesma universidade. Publicou dez livros, além de vários capítulos de livros, de artigos em revistas especializadas e de artigos jornalísticos semanais. Está lançando os livros MÍNIMA POÉTICA e as LAGOAS DO NORTE FLUMINENSE e será lançada também uma edição comentada do ROTEIRO DOS SETE CAPITÃES, documento fundamental para a história colonial do norte do Estado do Rio de Janeiro.
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