CEA 0523/17
Brasília, 28 de agosto de 2017
Nota de repúdio ao Decreto Presidencial que extingue a
RENCA
Ouvimos o grito
da terra e o grito dos pobres
A Rede Eclesial Pan-Amazônica (REPAM), ligada
ao Conselho Episcopal Latino-Americano
e do
Caribe (CELAM), e no Brasil organismo vinculado à Conferência Nacional
dos Bispos do Brasil (CNBB), juntamente com a Comissão Episcopal para a Amazônia, da CNBB, por meio de sua Presidência, unida
à Igreja Católica da Pan-Amazônia e à sociedade brasileira, em especial aos povos das Terras Indígenas Waãpi e Rio Paru
D'Este, vem a público repudiar o anúncio
antidemocrático do Decreto Presidencial, altamente danoso,
que extingue a Reserva Nacional de Cobre
e seus Associados (RENCA) na última quarta-feira (23).
A RENCA é uma área de reserva, na
Amazônia,
com
46.450 km2 – tamanho do território da Dinamarca. A
região engloba nove áreas protegidas, sendo três delas de proteção integral: o Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque, as Florestas Estaduais do Paru e do Amapá; a Reserva Biológica de Maicuru, a Estação Ecológica do Jari, a
Reserva Extrativista Rio Cajari, a Reserva
de Desenvolvimento Sustentável do Rio Iratapuru e as Terras Indígenas Waiãpi e Rio Paru d`Este. A
abertura da área para a exploração mineral de
cobre, ouro, diamante, ferro, nióbio, entre
outros, aumentará o desmatamento, a perda
irreparável da
biodiversidade e os impactos negativos contra os
povos de toda a região.
O Decreto de
extinção da
RENCA vilipendia a democracia brasileira, pois com o objetivo de atrair novos
investimentos ao país
o Governo brasileiro consultou
apenas empresas
interessadas em
explorar a região. Nenhuma consulta
aos povos indígenas e comunidades tradicionais foi realizada,
como manda o Artigo 231 da
Constituição Federal de
1988 e a Convenção 169, da
Organização Internacional do Trabalho (OIT). O Governo
cede aos
grandes
empresários da mineração que solicitam há anos sua extinção e
às
pressões da bancada de parlamentares vinculados às companhias
extrativas que
financiam suas campanhas.
Ao contrário do que afirma o Governo em nota, ao abrir a região para
o setor da mineração, não haverá como garantir proteção da floresta, das unidades de conservação e muito menos das terras indígenas – que serão diretamente atingidas de
forma violenta e
irreversível. Basta observar o
rastro de destruição que as mineradoras brasileiras e estrangeiras têm deixado na
Amazônia
nas últimas décadas: desmatamento,
poluição,
comprometimento
dos recursos
hídricos pelo
alto
consumo de água para a
mineração e sua contaminação com substâncias químicas, aumento de
violência, droga e prostituição,
acirramento dos conflitos
pela terra,
agressão descontrolada às
culturas e modos
de vida das comunidades indígenas e tradicionais,
com grandes
isenções de impostos, mas
mínimos
benefícios
para
as populações
da região.
Riscos ambientais e
sociais incalculáveis ameaçam o “pulmão do Planeta repleto de biodiversidade”
que é
a Amazônia, como nos lembra Papa Francisco na carta encíclica Laudato Si,
alertando
que “há propostas de
internacionalização da Amazônia que
só servem aos interesses
econômicos das corporações internacionais” (LS 38). A política
não
deve submeter-se à
economia e aos ditames e ao paradigma eficientista
da tecnocracia, pois a prioridade deverá
ser
sempre a vida, a dignidade da pessoa e o cuidado
com a Casa Comum, a Mãe Terra. Em Santa Cruz de la Sierra, na
Bolívia,
em
9 de julho de
2015, o papa Francisco não hesitou em proclamar: “digamos não a
uma economia de exclusão e
desigualdade, onde
o dinheiro reina em vez de
servir. Esta economia
mata.
Esta economia exclui. Esta economia destrói a mãe terra”.
Na LS, o papa Francisco alerta ainda que “o drama de uma política focalizada nos resultados
imediatos (...) torna necessário
produzir crescimento
a curto prazo" (LS 178).
Ao contrário, para
ele
“no debate, devem ter lugar privilegiado os moradores locais, aqueles mesmos
que se interrogam sobre o que desejam para si e para os seus filhos e podem ter em
consideração as finalidades que
transcendem o interesse econômico imediato” (LS
183).
A extinção da Renca representa uma ameaça política para o Brasil inteiro, impondo mais
pressão sobre as terras indígenas e Unidades de Conservação, e abrindo espaço para que outras
pautas sejam flexibilizadas,
como a
autorização para exploração
mineral em
terras
indígenas,
proibida pelo atual Código
Mineral.
Por todos esses motivos, nos unimos às Dioceses locais do Amapá e de Santarém, aos ambientalistas e à parcela da sociedade que, por meio de manifestações nas redes sociais e de
abaixo-assinados, pedem a imediata
sustação do Decreto Presidencial
que
extingue a Reserva.
Convocamos as senhoras e os senhores parlamentares a
defenderem a Amazônia, impedindo que mais mineradoras
destruam um dos nossos maiores
patrimônios naturais.
Não nos resignemos à degradação humana e ambiental! Unamos esforços em favor da vida
dos povos que vivem no bioma amazônico.
O futuro das gerações
vindouras está em nossas mãos!
Que Deus nos anime no mais fundo de nossos corações e
nos ilumine e confirme na busca da
tão sonhada Terra Sem Males.
Dom Claudio Cardeal Hummes
Presidente da REPAM
e da
Comissão Episcopal
para a Amazônia
Dom Erwin Krautler
Presidente da REPAM-Brasil e Secretário
da Comissão Episcopal para a Amazônia
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