A
PEC que transfere ao Executivo a demarcação de terras indígenas e
tantos outros projetos tentam favorecer o uso delas pelo agronegócio
Artigo assinado por Dom Erwin Krautler, presidente do Cimi, e Dom Enemésio Lazzaris, presidente da CPT, em resposta a artigo da senadora e presidente da Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Kátia Abreu (PSD-TO)
Aos ruralistas, seja na tribuna do Congresso Nacional ou nos jornais, não há o que os leve mais ao descontrole do que a causa indígena.
Descontrole expresso em uma escalada de recursos contra os direitos desses povos e de comunidades tradicionais garantidos pela Constituição Federal, que está prestes a completar 25 anos.
Um desses recursos é a PEC (proposta de emenda constitucional) 215/00, que transfere a competência da demarcação de terras indígenas do Poder Executivo para o Congresso Nacional.
Essa PEC, segundo nota técnica do Ministério Público Federal (MPF), afronta "cláusulas pétreas da Constituição da República" e viola o núcleo essencial de direitos fundamentais. Fere a divisão dos Poderes e anula o direito originário à terra, sendo a demarcação ato administrativo, segundo os juristas Carlos Frederico Marés e Dalmo de Abreu Dallari.
À PEC 215, somam-se dezenas de outros projetos de lei, que tentam impedir o reconhecimento de terras indígenas e favorecer o uso delas pelo agronegócio.
Nada parece deter os ruralistas, que ostentam uma bancada de 214 deputados e 14 senadores, com campanhas eleitorais financiadas pelo capital estrangeiro da Monsanto, Cargill e Syngenta, além da indústria de armas e frigorífico, conforme dados da Transparência Brasil.
O que esperar dos povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais a não ser a resistência, tal Davi contra Golias, em defesa de seus direitos?
Assim foi em abril, quando indígenas ocuparam a Câmara dos Deputados, e assim tem sido na retomada de terras tradicionais, com procedimentos demarcatórios paralisados pelo Executivo.
É o caso da terra indígena tupinambá de Olivença (BA). Seu procedimento administrativo está encerrado desde 2009. O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, no entanto, nega-se a assinar a portaria declaratória. País afora a situação é dramática.
No Mato Grosso do Sul, a terra Kadiwéu, demarcada há cem anos e homologada há quase 40, continua invadida. Relatório do Cimi (Conselho Indigenista Missionário) registra que, de 2003 a 2012, ocorreram no Estado 317 assassinatos de indígenas, dos 563 ocorridos no país nesse período.
No caso da morte de Nísio Gomes Guarani Kaiowá, o MPF apontou como mandantes ao menos seis "produtores rurais". O confinamento às margens de rodovias ou em minúsculas reservas levou ao suicídio, entre 2000 e 2012, de 611 indígenas, jovens entre 14 e 25 anos, de acordo com dados do Dsei (Distrito de Saúde Indígena).
A Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil) convoca, entre 30 de setembro e 5 de outubro, uma mobilização nacional contra a ofensiva à Constituição e aos direitos indígenas. Cimi e CPT (Comissão Pastoral da Terra) apoiam o ato, fundamentados nos valores do Evangelho e por dever de justiça e solidariedade a quem tem sido espoliado de seus territórios e de seus direitos há tanto tempo.
A senadora Kátia Abreu (PSD-TO), em coluna nesta Folha ("Causa Inconfessável", 7/9) tenta desqualificar a ação dessas pastorais taxando-as de "ideológicas".
O assentamento de famílias sobre terras indígenas, inclusive com a emissão de títulos de propriedade do Estado, não nega o esbulho dos territórios.
Isso não ocorre somente no caso de terras tradicionalmente indígenas. A senadora e familiares foram beneficiados pelo governo do Tocantins com terras ocupadas por posseiros. Além de atentar contra o direito à terra dos povos e de posseiros, Kátia Abreu milita contra o direito à identidade coletiva.
A senadora protocolou na Casa Civil pedido para que a Funai (Fundação Nacional do Índio) paralise o processo de identificação étnica do povo Kanela do Tocantins.
Os indígenas não estão solitários em suas mobilizações, pois a sociedade está atenta ao escândalo do latifúndio ruralista brasileiro.
ERWIN KRÄUTLER, 74, é bispo da prelazia do Xingu (PA) e presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi)
ENEMÉSIO LAZZARIS, 64, é bispo da diocese de Balsas (MA) e presidente da Comissão Pastoral da Terra (CPT)
Artigo assinado por Dom Erwin Krautler, presidente do Cimi, e Dom Enemésio Lazzaris, presidente da CPT, em resposta a artigo da senadora e presidente da Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Kátia Abreu (PSD-TO)
Aos ruralistas, seja na tribuna do Congresso Nacional ou nos jornais, não há o que os leve mais ao descontrole do que a causa indígena.
Descontrole expresso em uma escalada de recursos contra os direitos desses povos e de comunidades tradicionais garantidos pela Constituição Federal, que está prestes a completar 25 anos.
Um desses recursos é a PEC (proposta de emenda constitucional) 215/00, que transfere a competência da demarcação de terras indígenas do Poder Executivo para o Congresso Nacional.
Essa PEC, segundo nota técnica do Ministério Público Federal (MPF), afronta "cláusulas pétreas da Constituição da República" e viola o núcleo essencial de direitos fundamentais. Fere a divisão dos Poderes e anula o direito originário à terra, sendo a demarcação ato administrativo, segundo os juristas Carlos Frederico Marés e Dalmo de Abreu Dallari.
À PEC 215, somam-se dezenas de outros projetos de lei, que tentam impedir o reconhecimento de terras indígenas e favorecer o uso delas pelo agronegócio.
Nada parece deter os ruralistas, que ostentam uma bancada de 214 deputados e 14 senadores, com campanhas eleitorais financiadas pelo capital estrangeiro da Monsanto, Cargill e Syngenta, além da indústria de armas e frigorífico, conforme dados da Transparência Brasil.
O que esperar dos povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais a não ser a resistência, tal Davi contra Golias, em defesa de seus direitos?
Assim foi em abril, quando indígenas ocuparam a Câmara dos Deputados, e assim tem sido na retomada de terras tradicionais, com procedimentos demarcatórios paralisados pelo Executivo.
É o caso da terra indígena tupinambá de Olivença (BA). Seu procedimento administrativo está encerrado desde 2009. O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, no entanto, nega-se a assinar a portaria declaratória. País afora a situação é dramática.
No Mato Grosso do Sul, a terra Kadiwéu, demarcada há cem anos e homologada há quase 40, continua invadida. Relatório do Cimi (Conselho Indigenista Missionário) registra que, de 2003 a 2012, ocorreram no Estado 317 assassinatos de indígenas, dos 563 ocorridos no país nesse período.
No caso da morte de Nísio Gomes Guarani Kaiowá, o MPF apontou como mandantes ao menos seis "produtores rurais". O confinamento às margens de rodovias ou em minúsculas reservas levou ao suicídio, entre 2000 e 2012, de 611 indígenas, jovens entre 14 e 25 anos, de acordo com dados do Dsei (Distrito de Saúde Indígena).
A Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil) convoca, entre 30 de setembro e 5 de outubro, uma mobilização nacional contra a ofensiva à Constituição e aos direitos indígenas. Cimi e CPT (Comissão Pastoral da Terra) apoiam o ato, fundamentados nos valores do Evangelho e por dever de justiça e solidariedade a quem tem sido espoliado de seus territórios e de seus direitos há tanto tempo.
A senadora Kátia Abreu (PSD-TO), em coluna nesta Folha ("Causa Inconfessável", 7/9) tenta desqualificar a ação dessas pastorais taxando-as de "ideológicas".
O assentamento de famílias sobre terras indígenas, inclusive com a emissão de títulos de propriedade do Estado, não nega o esbulho dos territórios.
Isso não ocorre somente no caso de terras tradicionalmente indígenas. A senadora e familiares foram beneficiados pelo governo do Tocantins com terras ocupadas por posseiros. Além de atentar contra o direito à terra dos povos e de posseiros, Kátia Abreu milita contra o direito à identidade coletiva.
A senadora protocolou na Casa Civil pedido para que a Funai (Fundação Nacional do Índio) paralise o processo de identificação étnica do povo Kanela do Tocantins.
Os indígenas não estão solitários em suas mobilizações, pois a sociedade está atenta ao escândalo do latifúndio ruralista brasileiro.
ERWIN KRÄUTLER, 74, é bispo da prelazia do Xingu (PA) e presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi)
ENEMÉSIO LAZZARIS, 64, é bispo da diocese de Balsas (MA) e presidente da Comissão Pastoral da Terra (CPT)
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