Oposição, o talismã do governo
Nos
últimos dias foram muitas as análises que surgiram a fim de explicar o
resultado destas eleições. Parte considerável delas deu grande ênfase à
estrutura de campanha da FPA (Frente Popular do Acre). Analistas
argumentavam que Bocalon era uma espécie de “Davi lutando contra
Golias”.
De
nossa parte, não resta dúvida de que a estrutura de campanha pesou
enormemente em favor da FPA. Convencidos ou tocados por ameaças, os
cargos comissionados lutaram como leões nesta campanha, defendo
simplesmente o pão (os de menor ganho) ou os privilégios de
super-salários.
Também
destacado foi o uso dos meios de comunicação. Alguns deles divulgaram
pesquisas mais que tendenciosas e/ou sem o devido registro para ajudar o
candidato do governo. Preferiram, assim, pagar multas a deixar seu
patrão maior sem seus prestimosos serviços.
No
mesmo sentido favorável ao governo contou a estreita vinculação do
Programa Ruas do Povo à figura de Marcus Alexandre (PT), este boneco de
ventríloquo de velhos e novos coronéis. Em bairros onde o programa
estava ou estaria em andamento (às vezes, só em promessas), a campanha
era mais facilmente articulada.
Tudo isso contou a favor do governo. Mas é preciso não deixar na sombra como a própria oposição contribuiu para isso.
A
candidatura da professora Peregrina expressou, mais uma vez, as
dificuldades do Psol estadual, solo infértil para lideranças. Leôncio
(PMN) usou como mote de sua campanha o originalíssimo Sim, nós podemos. Mas bem poderia ter usado o Se colar, colou.
Trata-se de um sujeito de “espírito aventureiro”, para usar a expressão
do historiador brasileiro Sérgio Buarque de Holanda (ver Raízes do Brasil). Pretende colher onde não plantou.
Fernando Melo (PMDB) não saiu do Vamos cuidar do que tá bom e arrumar o que tá mal feito.
Figura insulsa e “lisa”, não chegou sequer a entrar no mérito do que
estaria “bom” e do que estaria “mal feito”. Não surpreende que o apoio
de Petecão (PSD) - que, nas eleições de 2010, ganhou mais votos para o
Senado do que Tião Viana (PT) para o governo - tenha-lhe sido tão sem
proveito.
Por
seu turno, Antônia Lúcia (PSC) foi abandonada pelo vice em plena
disputa. Ademais, sempre envolvida em escândalos, a missionária começa a
sofrer resistência ostensiva e organizada entre os evangélicos, estes
que, em tese, formariam sua base. Certa feita, um “fiel” bem definiu a
atuação da missionária. Dizia que ela “parece papel higiênico. Quando
não tá no rolo, tá na m...”.
O susto ficou por conta de Bocalon (PSDB). Todavia, também este contribuiu com o governo.
Grosso
modo, seu capital político advém de duas fontes: 1) da “memória
eleitoral”. Por ter se candidatado por mais de uma vez, é já conhecido
dos eleitores. Isso lhe permitiu sair à frente do candidato do governo
nas intenções de voto; 2) a insatisfação com o governo, difusa na
sociedade (ver Eleições 2010: um olhar a partir “dos de baixo” e Hegemonia em declínio e subversivismo no governo da FPA).
A
oposição que, junta, poderia ter ajudado a multiplicar esse capital,
saiu fragmentada. Por outro lado, além de desprovido de carisma, Bocalon
apresentou o discurso de sempre, rude, tosco, antipático a muitos.
Pensa ele que basta falar a verdade - ou que acha ser a verdade -, com
quaisquer palavras ou tons, para convencer o eleitor.
Mas
não, não basta. Maquiavel já dizia, nos albores da modernidade, que em
política não basta ser. É preciso também parecer (ver O príncipe).
Não basta ter razão. É preciso convencer de que se está com a razão.
Por força disso, há muitos que, embora mentindo, convencem mais que
aqueles que falam a verdade.
Sem
surpresa, o candidato do PSDB não apresentou nenhum projeto que
suscitasse entusiasmo no eleitor. Continuou fazendo referência a sua
Acrelândia. Não compartimos a tese de que por ter governado Acrelândia,
cidade de pequeno porte, ele não teria condições de governar a capital
acreana, cidade bem maior.
Há
pessoas que nunca governaram uma cidade e, entretanto, isso não
significa que não tenham condições de fazê-lo. Trata-se de dizer que
referir-se apenas à Acrelândia é um discurso pisado e repisado, embotado
pelo tempo, maçante até.
Além
disso, falta-lhe inteligência política. Mesmo pessoas próximas a ele o
chamam de “cabeça dura”. Talvez ele pense que isso é ter personalidade.
Pode ser. Importa considerar, no entanto, que sujeitos com esse perfil,
sem poder, flertam com a idiotice. Com poder, desposam a tirania.
A
verdade é que, de si mesmo, Bocalon pouco agrega às duas fontes de seu
capital político. Ele cresce em razão da negação/insatisfação com a FPA.
Falta-lhe, porém, crescer também por afirmação própria, isto é, atrair
eleitores por si mesmo e não por descontentamento com as forças
governistas. Uma e outra coisa são importantes e precisam ser
conjugadas, o que não vem ocorrendo.
Por
isso, uma vez desatado o processo eleitoral, “dinheiro na mão é
vendaval”. O capital vai se gastando, tomado pelos outros candidatos.
Estes colhem mais no campo de Bocalon do que este no deles.
Com
efeito, neste segundo turno, ele deve lutar para manter sua votação, e
conseguir votos dos outros oposicionistas, dos que não votaram ou
votaram em branco ou nulo. E, não obstante, colher na seara petistas
e/ou torcer para que algo aí se perca. Tarefa hercúlea, talvez
inglória...
A
bem da verdade, para o segundo turno, há de se esperar que os votos da
oposição, em que pese o apoio dos outros candidatos, não apenas não
migrem in totus para Bocalon, como mesmo se “espatifem”.
Outro
fator a pesar em seu desfavor é que seus eleitores, em geral, não têm
espírito militante. Até votam. Mas dificilmente saem às ruas ou vão ao
vizinho pedir voto. Portanto, não multiplicam os votos.
Por
tudo isso, além da estrutura de campanha da FPA, importa tomar em conta
a contribuição que a oposição dá às forças governistas. Desse modo, não
é exagero dizer que a oposição é uma espécie de talismã do governo.
Sem
a menor pretensão de predizer o futuro, afirmamos que o conjunto das
coisas aqui discutidas aponta para uma vitória da FPA na capital
acreana. Talvez apenas um escândalo de grande monta ou coisa que o valha
poderia reverter esta tendência.
Caso
ganhe o boneco de ventríloquo, a memória eleitoral que, até aqui, tem
sido favorável a Bocalon pode voltar-se contra ele. Não é bom ser
lembrado como o vencido. A ninguém ajuda um curriculum tão marcado por derrotas.
Para
não cair no ostracismo, melhor seria para ele concorrer a deputado,
estadual ou federal. Já as forças oposicionistas, para seu bem, deveriam
encontrar novo “messias” em quem depositar suas esperanças.
O
cenário estadual perece lhe ser mais favorável. Afinal, ter ganhado
apenas 9 prefeituras das 22 em disputa nestas eleições, mostra que,
efetivamente, a hegemonia da FPA está em declínio. Isso fortalece a
oposição. Mas em parte.
Convém
não congelar e supervalorizar o fato. É que não raro o governo coopta
os oposicionistas. A exemplo do que acabou de fazer o deputado estadual
Luis Tchê (PDT), estes, recebendo vantagens do lado de lá e percebendo a
confusão em seu derredor, não costumam perder tempo ou sono com o tema
da fidelidade.
Na
política como na história, a dinâmica das coisas é como o rio de
Heráclito, em contínuo movimento... Os que acreditamos nas forças
populares seguimos em expectação.
[1]
Cientista Político e Membro do Núcleo de Pesquisa Estado, Sociedade e
Desenvolvimento na Amazônia Ocidental (NUPESDAO). Email:
israelpolitica@gmail.com
Meu comentário: São verdadeiros os limites da oposição apresentados nesta bela análise. Entretanto, penso eu, pesa contra o "ventríloquo" duas outras questões não menos importantes: 1. Para o segundo turno, as composições possíveis à FPA são mínimas, se é que exista alguma. 2. O principal cabo eleitoral da FPA terá menos destaque porque não conseguirá "inaugurar" tantas ruas e, por isso mesmo não terá tanto tempo de exposição para propaganda política em forma de "notícias", além de pesar contra o próprio governador a pecha de não respeitar a vontade popular por ocasião do voto pela volta ao horário. Isso sem falar na possibilidade de haver influência dos mensaleiros do PT.
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