segunda-feira, 23 de abril de 2012

CIMI: 40 ANOS



Quero hoje, dia 23 de abril de 2012, enquanto a Funai Regional do Acre está sob ocupação dos povos indígenas, lembrar o feliz aniversário do Cimi - as 4 letras danadas. 4 letras que já são senhoras, fazem 40 anos!! e pensar que ainda temos muito por fazer!!
 
23 de abril de 1972 surgia, em plena ditadura militar, o Cimi. Hoje, sob o julgo das mesmas repintadas ditaduras, segue com passos firmes desarticulando os canhões do preconceito, das diferentes formas (talvez novas de uma velha prática) de roubarem os territórios indígenas. Formas assumidas em PSA, REDD, manejos..., que chegam a se autodenominarem "sustentáveis".
 
Lamento que ainda seja preciso existir um organismo como o Cimi. Que bom seria se não mais fosse preciso denunciar as violações de direitos, os assassinatos, os estrupos, os suicídios por falta de perspectivas, as escolas abandonadas, a saúde na UTI, uma Funai que mais parece uma fábrica de caixões, governos mergulhados em corrupção. Mas, já que infelizmente ainda é preciso, que o Cimi siga sem jamais se curvar aos interesses de ideologias fáceis e à sedução do poder que assassina. 

Não tenho veia poética, tão pouco sou compositor. Então, faço minhas as palavras de D. Pedro Casaldáliga, expressas neste texto composto por ocasião dos 25 anos do Cimi. É tão atual que parece ter saído hoje mesmo desta mente profética.

Segue o texto:

Mesmo sendo tantos os motivos de indignação

em torno à CAUSA INDÍGENA

neste nosso Brasil e em toda nossa Abia Yala,

agora macrocolonizados pelo império neoliberal de satanás,

é hora de celebrarmos teus 25  (40) anos, querido e maltratado Cimi,

criatura do Deus dos pequenos,

sacramento da alteridade respeitada,

evangelho do Evangelho inculturado!

Tuas danadas 4 letras - C I M I,

que soam até a nome indígena de fruta ou de animal ou de ser mitológico da selva,

têm dado uma bonita batalha nesses densos 25 (40) anos...

Condenado como subversivo pelos carrascos da Segurança Nacional ou Continental, no Pretório;

perseguido acirradamente pelas udrs, as paranapanemas e as multinacionais,

acumuladoras de lucro e depredadoras da vida;

e quase excomungado, no Templo, pelos guardiães da Lei da Pureza;

tu vens sendo selado na verdade e na esperança do Reino

pelas testemunhas da Lei da Aliança:

Rodolfo, João Bosco, Vicente, Cleusa, Ezequiel...

e antes e com muito mais sangue pelos Marçais

de todas as tribos e das lutas antigas e novas.

Abertas as janelas pelo Vaticano II, mesmo sendo ainda um concílio primeiromundista

e abertas as consciências pelo concílio nativo de Medellin;

sacudida a Igreja missionária

pela profecia agnóstica dos antropólogos de Barbados

e pelas matanças da ditadura...,

não dava mais para seguir catequizando compulsoriamente.

Não se podia seguir dando cultura ocidental importada

por Evangelho supracultural e macroecumênico.

Já não era mais tolerável acompanhar Povos Indígenas inteiros

dando-lhes a unção da agonia como povos.

O Deus das Igrejas se auto-reivindicava no Deus das Aldeias.

O Verbo, que, ao se fazer carne e história, se fez palestino,


queria seguir fazendo-se carne e história, se fazendo índio.

E tu, Cimi querido e maltratado,

seria um pequeno grande “sim” providencial para essa nova Encarnação!

E nasceste, discreto, inseguro ainda, como um rebento marginal,

como um toquinho verde do Resto.

A partir da calada presença das Irmãzinhas azuis do Tapirapé

e das intuições e loucuras daqueles heróicos Iasis da primeira hora

e da entusiasmada generosidade da garotada da OPAN.

E possibilitaste as assembléias de chefes, para o reencontro das raízes;

suscitaste para a Causa militantes, assessores e jornalistas amigos;

agitaste a Igreja e a Sociedade,

anestesiadas por séculos de etnocentrismo, de colonialismo e de integração;

estimulaste a organização autônoma dos Povos Indígenas e suas federações,

multiplicaste, em parceria, os manifestos e os encontros, as denúncias e as convocações;

ajudaste a continentalizar a luta e a esperança ameríndias

e proclamaste a boa nova da Boa Nova

urgindo a Terra, a Cultura, a Autodeterminação, o Diálogo Inter-religioso

e a inculturação da Solidariedade e do Evangelho.

Por ti, “a utopia cativa” desabrochou

e o Y-Juca-Pirama (aquele que por decreto genocida devia morrer)

está vivo e resolveu crescer e ser ele e dar vida outra

e ajudar a criar um Céu Novo e uma Nova Igreja, uma Terra Nova e uma Nova Sociedade...

Por tudo isso e muito mais, querido Cimi maltratado,

apesar do sistema excluidor das diferenças e alternativas...,

é hora de celebrar mesmo este jubileu de barro cozido e de sangue militante

dos teus 25 (40) anos, tão pascais!

Bem é verdade, porém, que também é hora, jovem velho renovando Cimi,

de re-sacudir, de re-alistar, de re-inventar a utopia cativa,

de quotidianizar a causa, de ser aliança mais eficaz das novas reivindicações

dos Povos Indígenas do Brasil e do Continente.

Para glória do Deus de todos os nomes, cúmplice dos hapirús das tribus índias

e para a ressurreição esperançosa de Nossa Abia Yala.
 
 
Pedro Casaldáliga

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