quarta-feira, 27 de junho de 2012

Não ao REDD+! na RIO+20 – Uma Declaração para Descolonizar a Terra e o Céu

Aliança Global dos Povo Indigénas e Comunidades Locais sobre Mudança Climática contra o REDD+

Depois de mais que 500 anos de resistência, nós, os Povos Indígenas, as comunidades locais, camponeses e pescadores, e a sociedade civil, não estamos enganados pela assim-chamada Economia Verde e o REDD+, porque reconhecemos o colonialismo quando o vemos. Não obstante seus disfarces cínicos e mentiras vergonhosas, o colonialismo sempre resulta na violação e saque da Mãe Terra, na escravidão, na morte, na destruição, e no genocídio de seus povos. A Economia Verde da Rio+20 e o REDD+ constituem uma grilagem colonialista do planeta, mal disfarçada e maligna, que opomos, denunciamos e resistimos. Rio+20 não é uma Cúpula da Terra, é o OMC da Vida.[1]

Do mesmo modo que a ‘descobrimento’ foi utilizado para justificar a primeira onda de colonialismo, alegando que os Povos Indígenas não tinham almas, e que nossos territórios eram “terra nullius”, terra de ninguém, agora a Economia Verde e o REDD+ estão inventando uma premissa, também desonesta, para justificar essa nova onda de colonização e privatização da natureza. Os povos indígenas e os camponeses estão sendo assassinados, deslocados a força, criminalizados, e culpados pela mudança climática. Nossa terra está sendo classificada como “desocupada”, “degradada”, ou precisando de “conservação” e “reflorestamento”, para justificar grilagens massivas em nome de REDD+, de projetos de compensação de carbono e da biopirataria.

Mas, o que são exatamente a Economia Verde e o REDD+? A Economia Verde nada mais é do que o capitalismo da natureza; uma tentativa perversa de empresas, indústrias extrativas e governos, para tirar lucros da Natureza através da privatização, comercialização e venda do Sagrado, do céu, e de todas as formas de vida, inclusive o ar que respiramos, a água que bebemos e todos os genes, plantas, sementes tradicionais, árvores, animais, peixes, diversidade biológica e cultural, ecossistemas e conhecimentos tradicionais que fazem a vida na Terra possível e agradável.

A Economia Verde é um projeto guarda-chuva que abrange todas as maneiras de vender a natureza, incluindo o REDD+, o Mecanismo do Desenvolvimento Limpo, o comércio de carbono, PSA (Pagamento por Serviços Ambientais), a comercialização da natureza, o Regime Internacional sobre Acesso aos Recursos Genéticos, patentes sobre o ser vivo, TEEB (A Economia dos Ecossistemas e da Biodiversidade), o Capital Natural, bonos verdes, bancos de espécies, e “parcerias“ de governos e empresas (PPPs) com povos indígenas. Na Economia Verde até a chuva, a beleza de uma cachoeira ou o pólen carregado por uma abelha seriam reduzidos a um código de barras e vendidos a quem fizer amelhor oferta. Ao mesmo tempo, a Economia Verde promove e “pinta de verde” as indústrias extrativas, como madeireiras, mineradoras, e indústrias petroleiras, que produzem efeitos ambientais e sociais devastadores em nome do “desenvolvimento sustentável”. Nada poderia estar mais longe da verdade.

Como o comércio de carbono e o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, o REDD+ é uma solução falsa para a mudança climática promovida pelas Nações Unidas, o Banco Mundial e os criminosos climáticos, como a Shell e a Rio Tinto. Esse comércio permite que os poluidores continuem queimando combustíveis fosseis sem reduzir suas emissões nos pontos de origem. Oficialmente, o REDD+ significa Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação florestal. Mas, o REDD++ realmente significa Recolhendo lucros através de Expulsões, grilagem, Desmatamento e a Destruição da biodiversidade. REDD+ constitui grilagem em escala global e um gigante golpe de compensação de carbono.

Originalmente, o REDD incluía apenas florestas e plantações, mas foi expandido para incluir árvores transgênicos, solos e agricultura. Por fim, o REDD+ poderia incluir e expropriar toda a superfície da Terra, inclusive a maioria das florestas, solos, campos, savanas, desertos, pântanos, mangues, algas marinas e oceanos, visando usá-los como esponjas para a poluição dos países industrializados. REDD+ também é o pilar da Economia Verde, sendo louvado absurdamente como “o coração espiritual” do “plano de negócios” que os governos do mundo estão escrevendo para o planeta. REDD+ transforma as fontes da vida na Terra em aterros de carbono; transforma os úteros do planeta em túmulos. Mas nós não vamos deixar isso acontecer!

Talvez a Economia Verde seja chamada de verde porque esta é a cor do dólar e talvez o REDD+ [red=vermelho em inglês] foi titulado assim em antecipação das suas consequências sangrentas. Pergunte à Olivia Mukamperezida, a mãe de Friday, um menino de oito anos da Uganda que, segundo o New York Times, morreu quando sua casa foi reduzida à cinzas enquanto 22.000 pequenos agricultores com escrituras foram violentamente expulsos por uma plantação de compensação de carbono. Pergunte ao agricultor Antônio Alves, que foi perseguido, detido a ponto de arma, e preso por 11 dias pela Força Verde, os guardas armados do projeto REDD+ da Chevron no Brasil, por cortar uma árvore para consertar o teto da casa de sua mãe. Pergunte ao Cacique Daniel Jiménez do povo Matsés da Amazônia peruana que foi criminalizado por defender seu povo perante um contrato explorador,escrito em uma língua estrangeira, que deu um comerciante de carbono controle total e perpétuo sobre a floresta e os meios de vida Mastés. Pergunte ao povo Pigmeu Batwa, submetidos à servidão na Plantação de Carbono Florestal Ibi-Batéké, um projeto do Banco Mundial na República Democrata do Congo. Pergunte ao povo NgajuDayak da Indonésia que denunciou o projeto REDD+ Kalimantan por gerar conflitos e violar seus direitos ao consentimento livre, prévio e informado, uma parte consagrada da Declaração dos Direitos dos Povos Indígenas da ONU.

Esses exemplos revelam as mentiras escandalosas e a propaganda usadas para esconder as verdades sobre o REDD+. Sabemos que o REDD+ não tem nada a ver com a salvação do clima, nem com a proteção das florestas, nem com a eliminação da pobreza, nem com a distribuição dos “benefícios”, nem com a capacitação das mulheres. Até a ONU admite que o REDD+ poderia resultar no “fechamento das florestas”, “a perda das terras”, “conflitos por recursos”, “novos riscos para os pobres” e “marginalização dos sem-terras”.

Na verdade, todos os impactos negativos do REDD+ que a ONU previu já estão acontecendo. Por exemplo, na África o REDD+, os créditos de carbono, os agrocombustíveis, e o cultivo para exportação estão impulsando enormes grilagens. Além disso, considerando que o REDD+ agora inclui plantações e agricultura, as plantações existentes, os agrocombustíveis e o cultivo para exportação poderiam se transformar em projetos de compensação de carbono. Os especialistas estão avisando que na África, três quartos da população e dois terços da terra estão sob ameaça, e o REDD+ poderia criar “gerações de sem terras”. Na África, o REDD+ está emergindo como uma nova forma de colonialismo, subjugação econômica, e como condutor de grilagens tão massivas que poderiam ser considerados como a expropriação de um continente.

Enquanto isso, a falta de ação sobre a mudança climática, mascarada por soluções falsas como o REDD+, está permitindo a temperatura da Terra subir por 2 graus ou mais, que efetivamentederrete o Ártico, queima a África e inunda o Pacífico. Nove países estão desaparecendo por baixo das ondas enquanto o nível do mar sobe no Pacífico, onde 90% da população é indígena. Isso é racismo climático e genocídio cultural numa escala sem precedente.

Infelizmente, o REDD+ afeta todas as regiões do mundo e todos os setores sociais. Para os pequenos agricultores, o REDD+ constitui uma contra reforma agrária mundial, distorcendo a tarefa de cultivar alimentos em “agricultura de carbono”. “Agricultura Climática Inteligente” não é inteligente, é estúpida. Além do mais, sementes “climaticamente prontas” e outras supostas soluções climáticas transgênicas são simplesmente novas tentativas por parte da Monsanto, da indústria de biotecnologia, e do agronegócio de deformar, patentear, e controlar nossas sementes, agarrar nossos campos e transformar-nos em peões escravos sem terra.

Aplicando um análise de gênero ao REDD+, fica claro que o REDD+ também é uma nova forma de violência contra mulheres, porque limita ou proíbe o acesso das mulheres às terras onde cultivamos, colhemos comida, e tiramos agua para alimentar e saciar nossas famílias. Da mesma maneira, para os povos indígenas, o REDD+ ameaça nossa sobrevivência cultural e poderia ser considerado genocídio, porque os proponentes do REDD+ querem expropriar e controlar a maioria das florestas e 80% da biodiversidade do mundo que se encontram nas nossas terras e territórios. Para pescadores e comunidades litorâneas, o REDD+ Azul, quer dizer que projetos de REDD+ nos oceanos e águas doces, poderia limitar profundamente nossa pesca, assim subvertendo nosso sustento e meio de vida. Para os trabalhadores, sabemos que os empregos criados por projetos de plantações tipo-REDD+ tendem de ser menos que o prometido, os salários e condições de trabalho péssimos, o direito de formar sindicatos frequentemente violado, e a exposição aos pesticidas carcinogênicos alta.

Mas o REDD++ não é destrutivo apenas para adultos. Para crianças, jovens e futuras gerações, o REDD+ e outras falsas soluções à mudança climática, como grandes hidroelétricas como Belo Monte, agrocombustíveis, carvão “limpo”, energia nuclear, gás natural, nanotecnologia, biologia sintética, bioenergia, biomassa, biochar e geo-engenharia, colocam em perigo o futuro e a vida como conhecemos. Em vez de ajudar a reduzir o aquecimento global, eles envenenam e destroem o meio ambiente e permitem que a crise climática aumente descontroladamente, o que poderia deixar o planeta praticamente inabitável.

Nós não podemos permitir que as falsas soluções à mudança climática como o REDD+ e a Economia Verde acabem com o equilíbrio da Terra, assassinem as estações do ano, desencadeiem um caos climático, privatizem a vida e ameacem a verdadeira sobrevivência da humanidade. O REDD+ e a Economia Verde são crimes contra a humanidade e a Terra. Mesmo assim, nós não seremos os condenados da Terra e não permitiremos que a Terra seja condenada.

Atendendo à sabedoria dos nossos anciões e às profecias dos nossos ancestrais, lançamos esse apelo a dizer Não ao REDD+! na Rio+20 e convidamos vocês a se juntarem conosco para plantar essa semente na consciência dos povos do mundo. A Mãe Terra, ferida e atormentada por febres induzidas pela poluição, nos implora à mudar os paradigmas. Apenas um caminho que:
  • Rejeita o REDD++ e a Economia Verde como privatização da natureza;
  • Descoloniza a vida, a terra e o céu;
  • Defende a vida e a liberdade;
  • Respeita os direitos humanos y
  • Garante os direitos dos Povos Indígenas;
  • Honra a Mãe Terra e
  • Protege o Sagrado,
poderia salvar o mundo e nos permitir a viver bem e criar o “futuro que queremos”.

Publicado em Alerta Socioambiental

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