Os crescentes desafios enfrentados pelos movimentos sociais no Brasil são decorrentes de perversas iniciativas políticas e econômicas dirigidas pelos interesses atrelados ao grande capital, articuladas com a atuação manipuladora orquestrada pela mídia, e agravadas pela sistemática de atuação adotada por órgãos oficiais de segurança.
A difusão indiscriminada de discursos políticos falaciosos, acompanhada da adoção habitual de decisões lesivas aos legítimos interesses da sociedade, propicia a perpetuação e ampliação de atividades econômicas danosas ao meio ambiente e aos direitos humanos.
O sufocante bloqueio das notícias favoráveis às causas populares, alternado com a divulgação tendenciosa, incompleta e deturpada dos fatos a elas relacionados, são práticas evidenciadas de forma reiterada por veículos de comunicação serviçais da exploração predatória.
A promoção antiética e inconstitucional de atividades de espionagem, desinformação, infiltração e cooptação dirigidas contra militantes e instituições dos movimentos sociais; assim como a realização de sabotagens e a produção de calúnias contra os mesmos, práticas típicas de regimes ditatoriais, continuam a ser a inaceitável tônica das atividades realizadas no Brasil por órgãos oficiais de segurança, conforme demonstrado na reportagem de capa exibida na edição número 668 da revista Carta Capital, datada de 19/11/2011 [1].
Dentre as diversas tragédias acarretadas por esta triste realidade, o agravamento da calamidade humanitária vivenciada pela população indígena é o quadro mais gritante e aterrador.
Tal calamidade é caracterizada pela impunidade das ameaças à vida, pelos martírios sofridos pelas comunidades e por evidências de genocídio [2] [3].
Neste cenário, de traços dantescos e kafkianos, um valoroso sopro de esperança advém do edificante exemplo que constitui o trabalho desenvolvido pelo Conselho Indigenista Missionário – CIMI.
As atividades do CIMI possuem imensa importância especialmente em razão da constante divulgação de denúncias e propostas filiadas à causa indígena, provida por meio da excelência na administração de seu site.
As notícias, artigos, ensaios e notas públicas estampadas quase diariamente pelo CIMI abordam, com admirável precisão e agilidade, fatos relacionados com os riscos e agressões prejudiciais aos direitos da população indígena, bem como de outras comunidades tradicionais.
A denúncia do atentado paramilitar que resultou na morte do líder religioso Nísio Gomes, pajé da etnia Kaiová Guarani, foi divulgada pelo CIMI em 18/11/2011, no mesmo dia da ocorrência do fato [4].
A coerência, coragem e agilidade da atuação do CIMI também podem ser observadas através da Nota Pública editada em 18/11/2011 [2], na qual é registrada e repudiada a deletéria responsabilidade do Estado brasileiro na gênese, na perpetuação e no agravamento da tragédia humanitária em marcha no Mato Grosso do Sul (MS) [5].
As denúncias divulgadas pelo CIMI apontam claramente a escalada do terrorismo paramilitar praticado pelos fazendeiros e seus asseclas [2][3][5].
Tal escalada é comprovadamente favorecida pela insipiência da atuação governamental e pelo aparelhamento político do Estado no MS [6] .
A coerência da postura política do CIMI é evidenciada inclusive na reiterada cobrança de intervenção federal no MS [7], em exigência firmemente amparada pelos incisos III e IV e pela alínea A do inciso VII do artigo 34 da Constituição Federal. Normas estas derivadas diretamente do inciso III do artigo 1º da referida Carta Magna, que estabelece expressamente a dignidade humana como um dos Princípios Fundamentais do Estado de Direito no Brasil.
Outra evidência do caráter potencialmente fértil da atuação do CIMI é sua eficiente articulação com outras instituições do governo e da sociedade civil voltadas para a defesa dos direitos ambientais e humanos, tais como o movimento político Aty Guasu, a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB e o Conselho Pastoral da Terra – CPT, entre outras.
A abrangência do trabalho desenvolvido pelo CIMI é evidenciada também pela atenção aos processos políticos, exemplificada pela resistência a alterações legislativas contrárias aos direitos sociais [8].
Por outro lado, a necessidade de atuação eficaz e perseverante dos movimentos sociais no Brasil é agravada pela ação negativa orquestrada pela mídia. Essa ação negativa é flagrantemente exibida no bloqueio e na manipulação das notícias relativas à violência contra a população indígena. E a débil veiculação do atentado que vitimou o pajé Nísio contrasta com a repercussão internacional do fato.
A revista Carta Capital tem o mérito de, em sua edição de número 674, datada de 30/11/2011, haver apresentado uma denúncia do abominável atentado que vitimou o líder religioso da etnia Kaiová Guarani, bem como da escalada da violência contra os indígenas, da violação de direitos constitucionais e da desídia do poder público [9].
O silêncio ensurdecedor, mantido pelos demais grandes veículos de comunicação, foi excetuado também por uma reportagem da Revista Época, publicada em sua edição número 707, datada de 05/12/2011 [10]. A referida reportagem teve alguma divulgação no portal de notícias da Rede Globo, mas, apesar da gravidade dos fatos, informações sobre o assassinato do líder indígena e sobre a calamidade humanitária no MS não apareceram em nenhum dos outros grandes portais de notícias.
A supra referenciada reportagem da Revista Época padece do mal de apresentar uma visão preconceituosa e depreciativa das exauridas comunidades indígenas, e também carece de críticas severas por parecer minimizar a gravidade do inadmissível terrorismo dos ruralistas.
Todavia, a mencionada reportagem merece relativo apreço por explicitar as responsabilidades do Estado brasileiro na geração e no agravamento dos infortúnios a que está submetida a população indígena. Além de fazer referência à perpetuação das pendências processuais vinculadas à demarcação de terras indígenas, e a evidências de racismo, segregação e discriminação que afetam os índios.
Já a revista Scientific American Brasil, na edição de número 44, destaca que o pungente drama vivido hoje em nosso país lembra a luta de lideranças indígenas dos tempos da extinção de populações inteiras de índios norte americanos, ocorrida no século XIX – denunciada de forma contundente na excelente obra de Dee Brown sobre o tema [11].
A referida revista destaca que a calamidade humanitária vivida no Brasil pela população indígena é intensificada pelo avanço do desmatamento, decorrente tanto da exploração ilegal de madeira quanto da expansão do agronegócio e dos latifúndios. E os danos resultantes abrangem o assoreamento dos leitos fluviais, a contaminação dos rios por agrotóxicos, o aumento da violência no campo e a dilapidação da cultura indígena. [12].
Para encerrar, vale dizer que os crescentes desafios enfrentados atualmente pelos movimentos sociais no Brasil evidenciam a necessidade urgente de prover o indispensável avanço dos níveis de consciência, mobilização e organização da sociedade brasileira.
CIDADANIAS E LIBERDADES.
REFERÊNCIAS
1. Nós, os Inimigos. Leandro Fortes. Revista Carta Capital, n. 668, 19/10/2011, p. 28,http://www.cartacapital.com.br.
2. Governo é Responsável por mais uma Chacina de Indígenas. Conselho Indigenista Missionário. www.cimi.org.br, 07/12/2011;
3. Carta Pública CPT: Mais um massacre de Indígenas. Coordenação Nacional da Comissão Pastoral da Terra. www.cimi.org.br, 18/11/2011;
4. MPF/MS: Indígena Desaparace Após Ataque a Comunidada [...].Conselho Indigenista Missionário. www.cimi.org.br, 18/11/2011;
5. MPF Vai Recorrer ao Supremo pelo Direito do Índios. [...]. Conselho Indigenista Missionário. www.cimi.org.br, 09/11/2011;
6. Mato Grosso do Sul Assumiu Luta Anti-Indígena [...]. Gabriel Brito e Valéria Nader.www.cimi.org.br, 06/12/2011;
7. CIMI Rebate Acusações e Pede Intervenção Federal [...]. Conselho Indigenista Missionário. www.cimi.org.br, 21/11/2011;
8. PEC que Condiciona a Demarcação de Terras [...]. Paulo Machado Guimarães.www.cimi.org.br, 30/11/2011;
9. Tensão em Terras Acestrais. Spensy Pimentel. Revista Carta Capital, n. 674, 30/11/2011, p. 60, http://www2.uol.com.br/sciam;
10. Uma Tragédia Indígena. Ricardo Mendonça e Mariana Sanches. Revista Época, n. 707, 05/12/2011, p. 48, http://revistaepoca.globo.com;
11. O Aperto da Sucuri. Ulisses Capozzoli. Revista Scientific American Brasil, n. 44, p. 10, Edição Especial, 2011, http://www2.uol.com.br/sciam;
12. A Sombra Longa do Homem Branco. Ulisses Capozzoli. Revista Scientific American Brasil, n. 44, p. 18, Edição Especial, 2011, http://www2.uol.com.br/sciam.
Nenhum comentário:
Postar um comentário