Falamos nestes últimos dias sobre a portaria 303 da AGU, também chamada de AI-5 para os povos indígenas. Por isso, resolvi publicá-la na íntegra para que o leitor e a leitora possam perceber o quanto é maldosa tal portaria. Para facilitar, grifamos alguns pontos que julgamos ser agravantes e merecem uma atenção maior especialmente por parte dos indígenas. Sugiro às amigas e amigos indígenas e também apoiadores da causa indígena que façamos momentos de estudos sobre o tema e tomemos uma posição firme na defesa dos direitos dos povos indígenas, flagrantemente agredidos por essa portaria. Ao texto:
AGU:
PORTARIA Nº 303, DE 16 DE JULHO DE
2012
DOU de
17/07/2012 (nº 137, Seção 1, pág. 1)
Presidência da República
Advocacia-Geral da União
PORTARIA Nº 303, DE 16 DE JULHO
DE 2012
PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA
ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
DOU de 17/07/2012 (nº 137, Seção
1, pág. 1)
Dispõe
sobre as salvaguardas institucionais às terras indígenas conforme entendimento
fixado pelo Supremo Tribunal Federal na Petição 3.388 RR.
O ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO, no uso das atribuições
que lhe conferem o art. 87, parágrafo único, inciso II, da Constituição Federal
e o art. 4º, incisos X e XVIII, da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro
de 1993, e considerando a necessidade de normatizar a atuação das unidades da
Advocacia-Geral da União em relação às salvaguardas institucionais às terras
indígenas, nos termos do entendimento fixado pelo Supremo Tribunal Federal na
Petição 3.388-Roraima (caso Raposa Serra do Sol), cujo alcance já foi
esclarecido por intermédio do PARECER nº 153/2010/DENOR/CGU/AGU, devidamente
aprovado, resolve:
Art. 1º – Fixar a interpretação das salvaguardas às
terras indígenas, a ser uniformemente seguida pelos órgãos jurídicos da
Administração Pública Federal direta e indireta, determinando que se observe o
decidido pelo STF na Pet. 3.888-Roraima, na forma das condicionantes abaixo:
“(I) o usufruto das riquezas do solo, dos rios e
dos lagos existentes nas terras indígenas (art. 231, § 2º, da Constituição
Federal) pode ser relativizado
sempre que houver, como dispõe o art. 231, 6º, da Constituição, relevante interesse
público da União, na forma de lei complementar”.
“(II) o
usufruto dos índios não abrange o aproveitamento de recursos hídricos e
potenciais energéticos, que dependerá sempre de autorização do Congresso
Nacional”.
“(III) o
usufruto dos índios não abrange a pesquisa e lavra das riquezas minerais,
que dependerá sempre de autorização do Congresso Nacional assegurando-lhes a
participação nos resultados da lavra, na forma da Lei”.
“(IV) o
usufruto dos índios não abrange a garimpagem nem a faiscação, devendo, se
for o caso, ser obtida a permissão de lavra garimpeira”.
“(V) o
usufruto dos índios não se sobrepõe ao interesse da política de defesa nacional;
a instalação de bases, unidades e postos militares e demais intervenções
militares, a expansão estratégica da malha viária, a exploração de alternativas
energéticas de cunho estratégico e o resguardo das riquezas de cunho
estratégico, a critério dos órgãos competentes (Ministério da Defesa e Conselho
de Defesa Nacional), serão implementados
independentemente de consulta às comunidades indígenas envolvidas ou à FUNAI”.
“(VI) a
atuação das Forças Armadas e da Polícia Federal na área indígena, no âmbito
de suas atribuições, fica assegurada e se
dará independentemente de consulta às comunidades indígenas envolvidas ou à
FUNAI”.
“(VII) o
usufruto dos índios não impede a instalação, pela União Federal, de equipamentos públicos, redes de
comunicação, estradas e vias de transporte, além das construções
necessárias à prestação de serviços públicos pela União, especialmente os de
saúde e educação”.
“(VIII) o
usufruto dos índios na área afetada por unidades de conservação fica sob a
responsabilidade do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade”.
“(IX) o Instituto Chico Mendes de Conservação da
Biodiversidade responderá pela administração da área da unidade de conservação
também afetada pela terra indígena com a participação das comunidades
indígenas, que deverão ser ouvidas, levando-se em conta os usos, tradições e
costumes dos indígenas, podendo para tanto contar com a consultoria da FUNAI”.
“(X) o trânsito de visitantes e pesquisadores
não-índios deve ser admitido na área afetada à unidade de conservação nos
horários e condições estipulados pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da
Biodiversidade”.
“(XI) devem ser admitidos o ingresso, o trânsito e
a permanência de não-índios no restante da área da terra indígena, observadas
as condições estabelecidas pela FUNAI”.
“(XII) o ingresso, o trânsito e a permanência de
não-índios não pode ser objeto de cobrança de quaisquer tarifas ou quantias de
qualquer natureza por parte das comunidades indígenas”.
“(XIII) a cobrança de tarifas ou quantias de
qualquer natureza também não poderá incidir ou ser exigida em troca da
utilização das estradas, equipamentos públicos, linhas de transmissão de
energia ou de quaisquer outros equipamentos e instalações colocadas a serviço
do público, tenham sido excluídos expressamente da homologação, ou não”.
“(XIV) as terras indígenas não poderão ser objeto
de arrendamento ou de qualquer ato ou negócio jurídico que restrinja o pleno
exercício do usufruto e da posse direta pela comunidade indígena ou pelos
índios (art. 231, § 2º, Constituição Federal c/c art. 18, caput, Lei nº
6.001/1973)”.
“(XV) é vedada, nas terras indígenas, a qualquer pessoa
estranha aos grupos tribais ou comunidades indígenas, a prática de caça, pesca
ou coleta de frutos, assim como de atividade agropecuária ou extrativa (art.
231, § 2º, Constituição Federal, c/c art. 18, § 1º Lei nº 6.001/1973)”.
“(XVI) as terras sob ocupação e posse dos grupos e
das comunidades indígenas, o usufruto exclusivo das riquezas naturais e das
utilidades existentes nas terras ocupadas, observado o disposto nos arts. 49,
XVI e 231, § 3º, da CR/88, bem como a renda indígena (art. 43 da Lei nº 6.001/1973),
gozam de plena imunidade tributária, não cabendo à cobrança de quaisquer
impostos, taxas ou contribuições sobre uns e ou outros”.
“(XVII) é
vedada a ampliação da terra indígena já demarcada”.
“(XVIII) os direitos dos índios relacionados às suas
terras são imprescritíveis e estas são inalienáveis e indisponíveis (art. 231,
§ 4º, CR/88)”.
“(XIX) é assegurada a participação dos entes
federados no procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas,
encravadas em seus territórios, observada a fase em que se encontrar o
procedimento”.
Art. 2º – Os procedimentos em curso que estejam em
desacordo com as condicionantes indicadas no art. 1º serão revistos no prazo de
cento e vinte dias, contado da data da publicação desta Portaria.
Art. 4º – O procedimento relativo à condicionante
XVII, no que se refere à vedação de ampliação de terra indígena mediante
revisão de demarcação concluída, não se aplica aos casos de vício insanável ou
de nulidade absoluta.
Art. 5º – O procedimento relativo à condicionante
XIX é aquele fixado por portaria do Ministro de Estado da Justiça.
Luis Inácio Lucena Adams
Q retrocesso horrível! E onde se lê INTERESSE NACIONAL leia-se INTERESSE DE EMPRESAS AMIGAS DO GOVERNO
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