quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

DESABAFO DO BARBOSA frente ao deboche para com o povo brasileiro


O desabafo do Ministro Joaquim Barbosa revela o verdadeiro estado de deboche ao que estamos submetidos por um governo desleal, que se baseia na chacota, na humilhação do povo. Realmente, como disse o Ministro, uma tarde triste para este nosso país.

Eu tinha que publicar este vídeo. É o mínimo que posso fazer para manifestar, assim como o Ministro, a minha indignação, repulsa, asco, nojo...

Atualizando

Acrescento uma imagem que colhi da internet que ilustra bem o sentimento do povo brasileiro neste momento e, de outro lado nos ajudará a nunca mais esquecermos quem, quais foram os ministros que votaram na defesa dos quadrilheiros.

A cheia do Madeira e algumas verdades sobre o Acre

Israel Souza[1]
  Blog Insurgente Coletivo

 Não foi preciso mais que uns poucos dias de cheia do Madeira para jogar por terra uma década e meia de propaganda sobre o desenvolvimento do Acre.Ficou claro que não conseguimos nos alimentar sem contar com o que vem de fora, mesmo com tanta terra e gente disposta a trabalhar. Assim, até parece que somos um estado de indolentes.

Isto porque a atual política de desenvolvimento impôs uma especialização por essas bandas. Especializamo-nos em vender madeira e carne para os outros! Como é amplamente sabido, estas são atividades econômicas de grande impacto ambiental e contribuem para a concentração de terra e renda.

E que benefícios trouxeram para a população local? Que julgue o leitor, pois continuamos na dependência dos repasses do governo federal... 

Para entender melhor a relação da cheia do Madeira com o Acre, é preciso fazer ainda outras considerações. Lembremos, então, do papel ativo que Jorge Viana (PT-AC) desempenhou na defesa do projeto de construção das barragens (Santo Antônio e Jirau) em nosso estado vizinho.

Quando ali os movimentos sociais se levantaram contra o projeto, o senador pôs-se ao lado de Ivo Cassol (PP-RO), argumentando que Acre e Rondônia não abririam mão de estar dentro do projeto, que ele (o projeto) traria oportunidades incríveis para nosso estado (ver o documentário O chamado do Madeira e a entrevista do professor Elder).

Bem. Não sei que bons frutos chegamos a colher do projeto, mas os frutos ruins estão aí e a tendência é que se multipliquem e se tornem cada vez mais amargos. 

Agora, que parte da estrada que liga o Acre a Rondônia está alagada, Jorge Viana quer cobrar satisfação dos engenheiros responsáveis pela construção da BR. Não nos deixemos enganar por essa tentativa de distorcer os fatos e tirar o foco do que realmente ocorreu. Não foi a estrada que baixou. Foram as águas que subiram e subiram em razão das barragens que aguerridamente ele defendeu.

Francamente, a nosso ver, o senador deveria pedir desculpas ao povo acreano e aos nossos irmãos de Rondônia que estão sofrendo com a situação que ele ajudou a criar[2].

A atuação de Jorge de Viana no Senado tem contribuído enormemente para fazer da Amazônia uma espécie de colônia das regiões desenvolvidas do país[3]. No caso das barragens, estas regiões e as empresas ficam com a energia e os lucros. Nós ficamos com os prejuízos sociais e ambientais.

Cumpre ressaltar que, se os problemas estão acontecendo, não foi por falta de aviso ou conhecimento. Movimentos sociais, técnicos do IBAMA e vários cientistas alertaram sobre os perigos de tal obra. Já no século XIX, Engels (O papel do trabalho na transformação do macaco em homem) dizia que “Na natureza, nada acontece isoladamente: os fenômenos exercem entre si influências recíprocas, num movimento universal” (ENGELS: 1990, 31). Dizia ainda que “não nos deixemos entusiasmar apenas pelo fato de sermos vitoriosos em relação à natureza, pois a cada vitória assim conquistada, a sábia natureza prepara sua vingança” (ENGELS: 1990, 33).

Desse modo, se o problema está posto, foi em razão dos grandes interesses em jogo. De acordo com Boulos (Por que ocupamos? Uma introdução à luta dos sem-teto), 54%

dos deputados federais e senadoras eleitos em 2010 receberam ‘doações’ de grandes construtoras. As mais ‘generosas’ foram a Camargo Corrêa, que triplicou suas ‘doações’ em relação a 2006, chegando a R$ 80 milhões; e a Andrade Gutierrez, com R$ 58 milhões. As grandes empresas sozinhas representam 25% de todos os gastos com campanha eleitoral no Brasil (BOULOS: 2012, 34).

E, num pragmatismo que suplanta qualquer exclusivismo ideológico partidário, elas foram as principais financiadoras tanto da campanha de Dilma Roussef (PT) quanto da de José Serra (PSDB) (BOULOS: 2012, 34).

Uma vez chegando ao poder estatal, a força política financiada pelas construtoras deve então criar as “oportunidades” de obras que, num certo sentido, servem como “acerto de uma dívida”. Compreende-se, dessa maneira, porque pesquisas que apontam que, potenciando as usinas existentes, não haveria mais necessidades de construção de novas. 

No momento, o governo local se desdobra para acalmar a população e evitar o caos.  A busca de um Plano B ou C apenas mostrou que nós não temos um Plano A. E, independentemente do que o governo faça, a subida das águas do Madeira pôs a descoberto aquilo que faz tempo vimos denunciado: o fracasso de nosso modelo de desenvolvimento, um modelo que tanto tem de farsa quanto de tragédia

Amparados pela imprensa, as forças governistas têm chamado a atenção para a construção da bendita ponte que há de ligar os dois estados. Entretanto, segundo informações, a estrada já conta com 14 km inundados. Diante disso, poderá a ponte resolver o problema?

Na iminência de faltar alimento, senti uma vontade enorme de criar galinha, de resgatar a cultura de nossos avós e plantar uma horta num cantinho aqui do quintal. Farei isso e vou preparar também um fogareiro.

Ah... Ia esquecendo. O carnaval se aproxima e disseram que pode faltar cerveja. Vou me apressar e fazer meu rancho... Nesses dias de tantas águas, não quero passar a seco.

Sigo na esperança de que, como eu, a população acreana esteja cansada e queira mudar de enredo em nossa política. Por ora, vou cantarolando... “Apesar de você, amanhã há de ser outro dia”...



[1] Cientista Social com habilitação em Ciência Política, mestre em Desenvolvimento Regional e membro do Núcleo de Pesquisa Estado, Sociedade e Desenvolvimento na Amazônia Ocidental - NUPESDAO. E-mail: israelpolitica@gmail.com
[2] Ao que tudo indica, deve pedir desculpas também aos bolivianos. Ver Bolivianos culpam Brasil por enchentes.
[3] A proposta do Novo Código Florestal em que ele tomou parte ativamente é disso um exemplo. Embora não tenham conseguido tudo o que pretendiam com tal código, os ruralistas podem comemorar. Parte significativa de suas reivindicações encontrou ali acolhida.

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

“FRACKING”: para combater temos que conhecer - vamos juntos dizer NÃO!!

A ANP realizou a 12ª Rodada de Licitações no dia 28 de novembro de 2013, na cidade do Rio de Janeiro. Foram ofertados 240 blocos, localizados em 13 setores de 7 bacias sedimentares brasileiras: Acre-Madre de Dios, Paraná, Parecis, Parnaíba, Recôncavo, São Francisco e Sergipe-Alagoas. Nos quais:

I - 110 blocos exploratórios em áreas de Novas Fronteiras nas Bacias do Acre, Parecis, São Francisco, Paraná e Parnaíba; e

II - 130 blocos exploratórios em Bacias Maduras do Recôncavo e de Sergipe-Alagoas.

Os Blocos oferecidos na Décima Segunda Rodada de Licitações foram selecionados em bacias de novas fronteiras exploratórias e bacias maduras com os objetivos, conforme consta no site da ANP, de ampliar as reservas e a produção brasileira de gás natural, ampliar o conhecimento das bacias sedimentares, descentralizar o investimento exploratório no país, desenvolver a pequena indústria petrolífera e fixar empresas nacionais e estrangeiras no País, dando continuidade à demanda por bens e serviços locais, à geração de empregos e à distribuição de renda.

O edital contemplava os seguintes modelos exploratórios:

I – Blocos em Bacias de Novas Fronteiras tecnológicas ou do conhecimento, com o objetivo de atrair investimentos para regiões ainda pouco conhecidas geologicamente, ou com barreiras tecnológicas a serem vencidas, buscando a identificação de novas bacias produtoras. As bacias com áreas em oferta serão Acre-Madre de Dios, Paraná, Parecis, Parnaíba e São Francisco.

II – Blocos em Bacias Maduras, com o objetivo de oferecer oportunidades e aumentar a participação de empresas de pequeno e médio porte nas atividades de exploração e produção de petróleo e gás natural em Bacias densamente exploradas, possibilitando a continuidade dessas atividades nestas regiões onde exercem importante papel socioeconômico. As bacias com áreas em oferta serão Recôncavo e Sergipe-Alagoas.

Os blocos objeto da licitação estão localizados em bacias sedimentares com potencial para petróleo e gás natural. O exercício das atividades de Exploração e Produção de Petróleo e Gás Natural estão previstas em sistemas petrolíferos convencionais, possibilitando também, exercer atividades de Exploração e Produção em Recursos Não Convencionais conforme disposições contratuais e Legislação Aplicável.

O mais preocupante é que o método utilizado para explorar recurso não convencional é o frecking.Fracking (fraturamento hidráulico) é o método usado para extrair gás natural de reservatórios não-convencionais (como o que chamam de “gás de xisto”). Este método consiste em, após a perfuração do poço de onde sairá o gás, provocar explosões no subsolo e injetar água, areia e diversos produtos químicos tóxicos, em alta pressão, para fraturar as rochas subterrâneas, abrindo passagem para a extração do gás.

O problema é que muitos estudos científicos e documentos de órgãos ambientais públicos, especialmente nos Estados Unidos, demonstram graves impactos socioambientais provocados pelo fracking, como a contaminação de águas subterrâneas, rios e lagos por gás e produtos tóxicos (há casos em que a água se tornou inflamável de tão contaminada por gás), aumento da poluição do ar, destruição de vegetação ou expulsão da população das áreas onde é colocado em prática e até mesmo terremotos! E agora o governo federal e as petrolíferas multinacionais querem usar esta técnica no Brasil, colocando em risco a população e o meio ambiente, inclusive o Aquífero Guarani, uma das maiores reservas de água doce do mundo.

Nem todos os blocos foram leiloados. Os estados com maior quantidade de blocos leiloados foram: Bahia, Sergipe, Alagoas e Paraná. No Acre e no Piauí foi leiloado apenas um bloco em cada estado, conforme apresentado nos resultados consolidados no site da ANP:




Precisamos impedir que este crime socioambiental seja colocado em prática no Brasil. Acompanhe a nossa página (https://www.facebook.com/brasilcontraofracking), conheça mais sobre o assunto, divulgue os riscos do fracking, e participe da luta por um Brasil livre de fracking.

Por um Brasil livre de fracking é uma campanha impulsionada pela ASIBAMA (Associação que representa os servidores públicos federais da área ambiental – IBAMA, ICMBio e MMA), conheça a posição da ASIBAMA em seu site:
http://www.asibamanacional.org.br/wpcontent/uploads/2013/09/Resolu%C3%A7%C3%A3o_Petr%C3%B3leo_-Vers%C3%A3o-Final11.pdf


          (O ponto 5 é que trata especificamente do fracking, págs 49-55)
        - O Parecer do MPF do Piauí (suspendeu o leilao no Piauí) está disponível aqui: http://www.socioambiental.org/sites/blog.socioambiental.org/files/nsa/arquivos/parecer_tecnico_no_242.2013.pdf

No Dia Mundial da Justiça Social, nada a declarar?

Iara Tatiana Bonin
Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da ULBRA;
Doutora em Educação pela UFRGS.

Seguindo para o trabalho, um tanto irritada com os congestionamentos decorrentes das obras da Copa, escutei, no rádio, que hoje (dia 20 de fevereiro) era o Dia Mundial da Justiça Social, data instituída pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 2009. Conforme a reportagem, a data deveria motivar os governos para a promoção de medidas efetivas de combate à pobreza, à fome, ao desemprego, à exclusão social. Coincidentemente o sinal fechou numa movimentada avenida no centro de Porto Alegre e dois pequenos meninos, com seus corpos maltratados pela miséria, se aproximaram e pediram “um trocadinho pra comprar comida”. Perto dali, vi os primeiros movimentos no amanhecer de famílias que ocupam a parte inferior de um viaduto, seus corpos castigados pelo completo abandono e pelo sono em alerta, temendo a violência.
Também escutei pelo rádio, a notícia de que a presidente Dilma Rousseff, estava no Rio Grande do Sul. Os eventos de sua agenda cheia, devido ao período pré-eleitoral, não indicavam que a presidente nem ao menos sabia da comemoração do Dia Mundial da Justiça Social! Não transitou pelas ruas, nem escutou a voz daquele esfomeado menino porque estava, logo cedo, numa visita inaugural ao Estádio Arena Beira-Rio, em Porto Alegre/RS. O estádio receberá cinco jogos da Copa e, para a sua reforma, contou com um investimento de R$ 330 milhões, sendo R$ 275,1 milhões financiados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Depois de apreciar a obra monumental, a presidente Dilma prosseguiu em sua rápida turnê pelas querências deste estado e chegou a Caxias do Sul (RS). Almoçou em um dos mais conceituados restaurantes da região, onde se serviu polenta – comida de imigrante italiano pobre, convertida em iguaria e inserida num refinado cardápio. Depois participou da cerimônia de abertura da 30ª Festa da Uva e da 24ª Feira Agroindustrial. Em seu discurso, nenhuma palavra sobre justiça social! Sob o caloroso aplauso dos presentes, declarou: “Vocês têm uma presidente que é parceira da produção agrícola e industrial dessa região” dando destaque, também, ao volume crescente de crédito concedido pelo governo para o setor agroindustrial, que chega a 150 bilhões. Ironicamente a agenda da presidente, no Dia Mundial da Justiça Social, parece ser a síntese das opções feitas pelo seu governo.
A agenda da presidente entre os gaúchos me fez lembrar outra ocasião, em 11 de fevereiro de 2014, quando ela esteve na cidade de Lucas do Rio Verde (MT), participando da Cerimônia de abertura oficial da colheita da safra brasileira de grãos 2013-2014 e início do plantio da 2ª safra. Em seu discurso, antes de cumprimentar as autoridades presentes, ela dirigiu a palavra aos produtores rurais: “Quebro o protocolo e começo cumprimentando esses produtores e essas produtoras responsáveis pelo sucesso e pela vitória do nosso agronegócio. (...) É uma imensa alegria assistir aquela quantidade de soja jorrando pela colheitadeira”. Nas palavras da presidente, o espetáculo da super-safra mostra que o Brasil é viável, quando asseguradas certas condições, dentre as quais destacou a terra, o empreendedorismo dos produtores do agronegócio e o financiamento dos equipamentos e das máquinas com tecnologia de ponta. E a presidente finalizou seu discurso declarando: “Essa vitória é o que nós estamos celebrando hoje aqui também. É uma vitória do agronegócio do Brasil e é uma vitória do agronegócio do Mato Grosso”.
Não por acaso, a agenda da presidente contemplou vários eventos ligados ao agronegócio, um dos setores considerados mais lucrativos no contexto brasileiro e também um dos segmentos que, para prosperarem, têm recebido variados tipos de incentivos e linhas de financiamento (destaque feito no próprio discurso da presidente, citado anteriormente). A produtividade dos empreendimentos agroindustriais e a capacidade de gerar lucro têm sido enaltecidas como motivos de “orgulho nacional” em discursos proferidos por vários representantes do governo. O agronegócio é, assim, alçado à condição de alavanca capaz de tornar o Brasil competitivo.
Governando numa perspectiva desenvolvimentista e para salvaguardar os setores considerados produtivos e superavitários, resta pouco espaço na agenda do governo federal para planejar medidas efetivas de promoção da justiça social. Obviamente que os recursos financeiros são canalizados para assegurar a lucratividade e a competitividade de setores que supostamente colocariam o Brasil numa condição de “primeiro mundo”, enquanto são contingenciados e pouco aplicados os recursos destinados às políticas sociais.
A terra é destacada pela presidente como condição indispensável para que o agronegócio – menina dos olhos deste governo – prospere. A terra, então, é vista como um recurso, a ser maximizado, pensamento que posiciona como obsoletos os direitos assegurados na Constituição Federal aos índios, quilombolas, comunidades tradicionais. Uma evidência disso é o fato de que, em 2013, apenas uma área indígena, pertencente ao povo Kayabi, foi homologada pela presidente, e mesmo assim o registro desta área foi impedido pelo ministro Luiz Fux, do STF.
A demarcação das terras indígenas é uma questão de justiça social. Pode-se então “medir” o desempenho do governo nas ações de demarcação, observando-se, por exemplo, os dados de execução orçamentária de 2013: na ação “Fiscalização e Demarcação de Terras Indígenas, Localização e Proteção de Índios Isolados e de Recente Contato” os recursos disponibilizados foram da ordem de R$ 87.863.432,00, sendo liquidados somente R$ 17.402.383,22 (o equivalente a apenas 19,8% dos recursos disponíveis). Nos desdobramentos desta ação, existe o item “Delimitação, Demarcação e Regularização de Terras Indígenas”, cuja dotação orçamentária em 2013 foi de R$ 21.642.811,00, mas foram liquidados apenas R$ 5.403.834,59 (ou 24,06% do montante).
Uma questão atinente à justiça social, utilizada inclusive para incitar a população contra as demarcações, é a justa indenização das benfeitorias que resultam de ocupação de boa fé em terras indígenas. Sobre esse aspecto, embora exista uma infinidade de processos de indenização em curso (e conheço alguns agricultores do município de Chapecó/SC, por exemplo, que estão aguardando indenizações há mais de 15 anos!), nenhum centavo foi pago, em 2013, da ação “- Indenização aos Atuais Possuidores de Títulos das Áreas sob Demarcação Indígena, cuja dotação foi de R$ 20.000.000,00.
A reforma agrária é também uma questão de justiça social, e se liga igualmente ao problema da terra e de sua destinação. Recorrendo novamente aos dados de execução orçamentária, vale observar que, no programa “Reforma Agrária e Ordenamento da Estrutura Fundiária”, elencam-se ações voltadas à concessão de créditos às famílias assentadas, ao desenvolvimento dessas famílias e à desapropriação de imóveis rurais para a reforma agrária. Dos R$ 2,5 bilhões autorizados em orçamento, apenas R$ 975,2 milhões foram aplicados, o que representa 38,7% do total. A situação é tão grave que, no dia 13 de fevereiro, cerca de 15 mil integrantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) protestaram no centro de Brasília e exigiram mudanças nas políticas agrárias. As lideranças do movimento reclamam do baixo número de famílias assentadas por desapropriações e da burocracia para ingressarem em programas sociais básicos.
A superação das desigualdades é uma questão de justiça social. Para isto, é necessário que se promova uma mudança de rota, um novo “mapa do desenvolvimento” deve ser traçado, cuja orientação seja a promoção da justiça social e da dignidade humana. De acordo com a Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE),  o Brasil é hoje o quarto país no mundo em desigualdade entre pobres e ricos. Registra-se nesta pesquisa que, no ano de 2012, 10% da população mais rica concentrava 42% da renda do país. No atual modelo de governo privilegiam-se setores lucrativos, o que acentua o fosso que separa ricos e pobres.
As desigualdades, que nos discursos oficiais sempre aparecem atenuadas, já não podem ser vistas como efeitos colaterais do modelo desenvolvimentista – elas têm sido constituídas no jogo da concorrência. Quando a concorrência (entre empresas, entre trabalhadores, entre setores da sociedade) é o princípio de organização do mercado e do governo, não se pode vislumbrar a superação das desigualdades. A concorrência é, no atual modelo de governo, um jogo que deve ser continuamente alimentado e sustentado. Por esta razão, a agenda da presidente está lotada de compromissos vinculados aos setores que, na concorrência, se mostram fortes e produtivos. O agronegócio é, neste contexto, um setor alimentado e nutrido, que recebe atenção especial do governo.
Não é possível vislumbrar a conquista e a garantia de direitos em um modelo concorrencial, pois neste, há sempre vencedores e perdedores. No jogo da concorrência, os povos indígenas, os quilombolas, as comunidades tradicionais não são tidos como “setores viáveis”, e sim como grupos residuais. Assim, o que se oferece (quando muito) a estes grupos, são ações de “gestão das desigualdades”, ou seja, ações assistenciais, paliativas, de impacto momentâneo, que não conduzem à conquista efetiva dos direitos – em especial do direito à terra.
É necessário, portanto, retomar a pauta da justiça social, reconhecendo que um governo existe para proporcionar bem estar e segurança para toda a sua população, e para promover a estes o acesso a bens, recursos, tecnologias, resguardando direitos humanos que não podem ser subvertidos e adequados a uma lógica empresarial.

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

VALE A PENA :Cientista Politico Elder Andrade e a catástrofe das hidrelétricas do Madeira


Aqueles que defendiam e defendem as hodrelétricas, incluíndo os políticos do Acre - Jorge Viana, Tião Viana, Sibá Machado... Sibá Machado, não esqueçam, foi "escolhido" representante de Furnas.

Reproduzo aqui matéria vinculada pela imprensa acreana, (Pagina 20) onde fica claro o posicionamento dos empresários e o governo do Acre sobre esta questão. A matéria foi publicada ainda em 2007.

Hidrelétricas prometem movimentar economia
Empresários estão atentos aos benefícios que o investimento pode trazer ao Estado


Renata Brasileiro
Regiclay Saady
Empresários de diversos 
setores estiveram reunidos ontem 
na sede da Federação das Indústrias
Um dos projetos mais importantes contidos dentro do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) é o de construção de duas usinas hidrelétricas no Rio Madeira, o principal afluente do Rio Amazonas, situado em Rondônia.
A proposta, que chama a atenção de todo o Brasil, com a geração de quase 3,5 mil megawatts de energia, é objeto de estudo dos empresários acreanos para a movimentação da economia local, já que o investimento previsto no empreendimento é de algo em torno de R$ 20 bilhões.
Para discutir as possibilidades de o Acre ser inserido na execução do projeto, empresários acreanos de diversos setores estiveram reunidos na tarde de ontem, juntamente com o presidente do Fórum do Desenvolvimento, Jorge Viana.
A reunião aconteceu na Federação das Indústrias e abordou aspectos gerais, bem como o Acre poderá oferecer seus serviços para a construção da obra, qual a estrutura que há para a dedicação desse serviço e de que forma o Estado poderá ser inserido no projeto.
“É necessário nesse momento que nós, empresários acreanos, mostremos o nosso total apoio para a construção das duas hidrelétricas, bem como o nosso interesse em participar deste momento tão importante. Uma obra como essa será talvez a maior em termos de investimento já feito na região e não podemos ficar de fora deste projeto”, destacou o presidente da federação, Francisco Salomão.
Segundo o presidente do Fórum do Desenvolvimento, Jorge Viana, há um mundo de oportunidades oferecido pelo projeto de construção das hidrelétricas que ainda precisam ser descobertos, com vistas a beneficiar o Acre.
Para tratar mais especificamente do assunto e torna-lo mais claro à sociedade acreana é que uma reunião está marcada para acontecer no próximo dia 11, no Teatro Plácido de Castro, na qual todos os interessados poderão tirar todas as suas dúvidas e fazer questionamentos sobre o investimento a ser feito pelo Governo Federal.
Representantes do Ministério de Minas e Energias, de Furnas e da Odebrecht, que são os responsáveis pela execução do projeto serão os principais convidados do evento. Os representantes falarão entre outros assuntos sobre a avaliação de impacto ambiental do projeto de instalação das duas usinas, o que vem sendo objeto de disputa dentro do governo federal.

Agilidade no processo

Outra participação que o Estado deverá ter dentro do projeto é na parte pública, pressionando políticos para que as obras venham a acontecer o mais rápido possível. Por enquanto, ainda não há previsões para este início e os próprios empresários acreanos acreditam que um apoio poderá agilizar o processo.
“O setor produtivo inteiro está mobilizado para chamar a atenção dos políticos e fazer com que essas obras saiam logo. Quanto mais cedo começarmos a trabalhar, mais cedo movimentaremos a economia do Estado”, destacou Salomão.
Por enquanto, um dos empecilhos para que o projeto saia logo do papel é o estudo de impacto ambiental. É o Instituto Brasileiro de Recursos Naturais Renováveis (Ibama) que está responsável pela avaliação.


E agora, senhores, vão ou não vão assumir suas responsabilidades?

Que Estado é este que se ficar sem estrada por apenas 10 dias fica sem alimentos básicos?

domingo, 23 de fevereiro de 2014

BOLIVIANOS CULPAM BRASIL POR ENCHENTES

EXCLUSIVO: BOLIVIANOS CULPAM BRASIL POR ENCHENTES E DESEJAM PROCESSAR O PAÍS POR DANOS E PREJUÍZOS DE BILHÕES DE DÓLARES

Walter Justiniano: esta tragédia é como a Crônica de Uma Morte Anunciada, de Gabriel Garcia Marquez
Walter Justiniano: esta tragédia é como a Crônica de Uma Morte Anunciada, de Gabriel Garcia Marquez
Mais um imbróglio vem aí pela frente envolvendo as usinas do rio Madeira, o progresso e a discórdia. O consultor ambiental boliviano, Walter Justiniano Martinez, 54, de Guayaramerin (Bolívia), tem em mãos um relatório onde consta que o Brasil é o culpado pelas enchentes na Bolívia, que culminou com 60 pessoas mortas e 90 mil cabeças de gados perdidas. O prejuízo é de cerca de 50 bilhões de dólares e mais de 40 mil hectares de culturas agrícolas afetadas. Segundo ele, “o governo boliviano sabia dos problemas que seriam provocados pelas barragens das usinas de Jirau e Santo Antônio e não fez nada a este respeito”. Explicando, as represas de Jirau e Santo Antônio não deixam a água escoar, culminando com enchentes rio acima, pegando o Beni. As fortes chuvas que caem sobre a Bolívia agravaram ainda mais o problema. Veja no mapa abaixo.
As represes de Jirau e S. Antônio alagaram o Beni
As represes de Jirau e S. Antônio alagaram o Beni
Bolívia conhecia os efeitos de barragens brasileiras na Amazônia.  O governo sabia que as barragens construídas na bacia do rio Madeira causariam grandes inundações no país por mais de seis anos.
Em 2006, o ministro dos Negócios estrangeiros David Choquehuanca, enviou uma carta para seu homólogo brasileiro manifestando o o perigo da construção destas barragens para a Bolívia. O governo boliviano  já tinha alertado sobre os impactos há mais de sete anos.
Cerca de 90 mil cabeças de gado perdidas
Cerca de 90 mil cabeças de gado perdidas
Na nota enviada por Choquehuanca, citado em La Razón (jornal boliviano), argumentou-se que entre os impactos prováveis “é considerado a inundação do território boliviano, como um efeito dos reservatórios que afetarão, de um lado, a existência da Floresta Amazônica, na bacia do Madeira, as riquezas em castanha”.
O processo de consulta bi-nacional com vários encontros e reuniões presidenciais, ministeriais e técnicas foi lançado em novembro do mesmo ano. O II encontro técnico realizado nos dias 30 e 31 de outubro de 2008, em La Paz, a troca de informações sobre os projetos hidrelétricos Jirau e Santo Antonio. Bolívia, então, expressa seu aborrecimento pela ausência de delegados técnicos suficientes, do Brasil, apesar do compromisso.
No mesmo tempo, organizações camponesas da Bolívia e do Brasil criaram o movimento em defesa da bacia do Rio Madeira e a Região Amazônica.
Estudos e declarações de organizações de proteção ambiental também alertaram para os riscos, incluindo a Liga de Defesa do Ambiente (Lidema), que, em 2009, exortou o governo “em conformidade com os acordos internacionais, independentemente da agenda positiva com o governo brasileiro”.
Em 2011, um seminário sobre projetos de energia no Brasil, o Vice Ministro Juan Carlos Alurralde, disse à Reuters que o governo não estava satisfeito com os relatórios do Brasil em defesa da hidrelétrica e esperava mais esclarecimentos e garantias.

Um prejuízo de 50 bilhões de dólares
Prejuizo de 50 bilhões de dólares
Então, o primeiro secretário da Embaixada do Brasil na Bolívia, Ruy Ciarlini, disse à Reuters que eles tinham “dados científicos que mostram que não há nenhum risco”. Até ontem, em Beni foram relatadas 84 mil carcaças (gado) e perdas de 50 bilhões de dólares. Mais de 39 mil hectares de culturas afetadas, enquanto o número de vítimas cresce dia a dia devido às enchentes.
O presidente Evo Morales, solicitou na terça-feira,  investigações sobre o impacto das enchentes  no Beni.
Fonte: +RO www.maisro.com 

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Do Acre para o Brasil, o arauto do “estado de exceção”

Israel Souza[1]
Blog Insurgente Coletivo
Incoerência e oportunismo barato elevados ao cubo. Assim os posicionamentos de Jorge Viana (PT-AC) no Senado. Parece que ninguém segura esse “menino do PT”...
Não faz muito, quando começaram as manifestações de rua que tomaram conta do Brasil no mês de junho do ano passado, ele alarmou: “Nossa população não pode ser tratada como bandida”.
O senador falava isso em razão da truculência com que a polícia estava tratando manifestantes e jornalistas. A agressão era tão gratuita e desmedida que mesmo a grande imprensa - a seu modo e segundo seus interesses - começou a condená-la.
Jorge Viana viu ali a possibilidade de aparecer como defensor da democracia. Em um texto (A democracia de Jorge Viana), dizíamos que nem parecia aquele em cujo governo a polícia deteve e reprimiu vários manifestantes em 7 de setembro de 2005. Concluíamos o texto dizendo que a democracia que o senador defendia para o Brasil não era a mesma que ele queria para o Acre.
Passados alguns poucos meses apenas, aquele mesmo “defensor da democracia” veio defender a aprovação de uma “lei antiterrorismo”. Claro. O sujeito aqui em questão tenta “surfar” na comoção - midiaticamente – alimentada pela morte do cinegrafista Santiago Andrade[2]. Resta, porém, que suas supostas inclinações democráticas mostram-se cada vez mais insustentáveis.
Deixando o senador de lado, por enquanto, cabe perguntar o que representa para a democracia a proposta por ele defendida. Comecemos com a definição de “terrorismo” e os problemas daí advindos.
Tratando do problema em mais amplo âmbito, Domenico Losurdo (A linguagem do império: léxico da ideologia estadunidense) argumenta que “não há nenhum esforço para esclarecer o que significa o termo terrorismo”. Trata-se de algo proposital, pois quanto “mais vaga a acusação, tanto mais fácil para sua validade se impor de modo unilateral e tanto mais inapelável se torna a sentença pronunciada pelo mais forte” (LOSURDO: 2010, 15).
O mesmo autor argumenta que “seria ingênuo esperar equilíbrio na utilização das categorias, chamadas, na realidade, para rotular o inimigo e seus cúmplices e, portanto, empunhadas e brandidas como armas de guerra” (LOSURDO: 2010, 14).
Trilhando caminho similar, Noam Chomsky (O império americano: hegemonia ou sobrevivência) destaca que o “termo terrorismo (itálico do autor) é extremamente difícil de definir”, considerando-o “particularmente obscuro” (CHOMSKY: 2004, 190).
Assim como Losurdo, Chomsky ressalta como o modo vago de definir o termo é uma estratégia usada pelos de cima a fim de que, desse modo, possam manuseá-lo a seu talante contra aqueles que os ameaçam ou simplesmente a eles não se submetem. Não surpreende que mesmo Nelson Mandela tivesse sido acusado de “terrorismo” ao lutar pelo fim da segregação racial na África do Sul.
Sabe-se que, historicamente, quando dada ordem encontra-se em crise, os que nela dominam costumam apontar “inimigos” (reais ou não), atribuindo a eles toda culpa pelos problemas atravessados e declarando-lhes guerra sem trégua. Há anos atrás, tais “inimigos” eram os comunistas. Hoje - e inclusive no Brasil! - são os “terroristas”.
O resultado disso é a emergência de um escancarado “estado de exceção”[3] em que são “enquadrados” os “inimigos” e os “não integráveis ao sistema político”. Como alertou Giogio Agamben (Estado de exceção), em razão das crises, das resistências populares (das mais diversas colorações ideológicas e das mais diversas opções de luta) e das reações dos de cima, o “estado de exceção tende cada vez mais a se apresentar como paradigma de governo dominante na política contemporânea”. Ele vem deixando de ser “uma medida provisória e excepcional” para ser uma “técnica de governo” (AGAMBEN: 2004, 13).
Ao “anular radicalmente todo estatuto jurídico do indivíduo”, o estado de exceção se configura, não como um “direito especial”, mas como “suspensão da própria ordem jurídica” (AGAMBEN: 2004, 14-15). Por essa razão, o estado de exceção se apresenta como um “patamar de indeterminação entre democracia e absolutismo” (AGAMBEN: 2004, 14).
Sintetizando: o estado de exceção vem se tornando uma técnica de governo, usada permanentemente. A atual crise[4] impõe ao governo (se este assume a defesa da ordem - por carcomida e antidemocrática que esta seja - como sua principal tarefa) que a utilize. E a vaguidade da definição do termo “terrorismo” e a suspensão da ordem jurídica permitem que ele a utilize quase sem peias.
Em verdade, a proposta do senador acreano e consortes mostra como andam aparvalhadas as elites brasileiras diante das manifestações que elas não conseguem domesticar. Mostra igualmente como hoje os petistas entendem e tratam a democracia. Se lhes convém, defendem-na; se lhes incomoda ou ameaça, atacam-na sem medir palavras ou esforços. E assim as elites e seus representantes no Congresso preparam sua reação contra as “ruas”.  
Acreanizar o Brasil! Ao que tudo indica, essa é a contribuição política que Jorge Viana quer dar ao país. Pois aqui, em nossa terrinha, faz tempo o “estado de exceção” é a regra. Quanto a isso e dado que a democracia não lhe cheira bem, dificilmente poderiam encontrar arauto mais credenciado.


[1] Cientista Político e Mestre em Desenvolvimento Regional pela Universidade Federal do Acre – UFAC.
[2] Para tratar o assunto aqui em foco a partir desse ponto, recomendo os textos Jorge Viana revisita o passado ao defender projeto de lei anti-terrorismoLegislador faz terrorismo com o terrorismo e Terrorismo faz senador confundir papel do buchuchu e da urtiga.
[3] Embora nos valendo aqui de Giogio Agamben, conjugamos suas reflexões com as de Walter Benjamin. Este tem uma noção historicamente mais ampla de estado de exceção, colocando no centro de suas análises a opressão e a exploração de classe. Para mais sobre o pensamento deste autor último ver Walter Benjamin: aviso de incêndio: uma leitura das teses “Sobre o conceito de história”. Nesta obra, o leitor encontrará as teses sobre história (onde ele formula seu conceito de estado de exceção) do próprio Walter Benjamin acrescidas de comentários de Michael Löwy.
[4] No calor das manifestações de rua ano passado, alguns passaram a falar de “crise de representatividade”. Além dos autores já citados, recomendamos a leitura de Para além do capital, do filósofo István Mészáros, obra em que o autor fala da “crise estrutural” pela qual vem passando o sistema capitalista.

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Vigência da Portaria 303/2012 desrespeita decisão do STF e agride direitos dos povos indígenas

A Portaria 303/12 da Advocacia Geral da União (AGU) está em vigor, de fato e de direito, desde o dia 05 de fevereiro de 2014. Isso ocorre uma vez que a Portaria 415, de 17 de setembro de 2012, havia suspendido os efeitos da mesma até o “dia seguinte ao da publicação do acórdão nos embargos declaratórios a ser proferido na PET 3388-RR que tramita no Supremo Tribunal Federal". O referido acórdão foi publicado no dia 04 de fevereiro.
Como é de conhecimento público, ao julgar os embargos declaratórios da Petição 3388-RR, a mais alta corte do Poder Judiciário brasileiro, o STF, decidiu que as “Condicionantes” valem para o caso julgado e não têm efeito vinculante às demais terras indígenas. O Poder Executivo, por meio da AGU, ao dar vigência à Portaria 303/2012, estabelece esta vinculação das ditas “Condicionantes” a todas as terras indígenas do Brasil.
Em vez de revogar a Portaria 303/2012, o AGU publicou, no último dia 07 de fevereiro, a Portaria número 27/2014, por meio da qual determina “à Consultoria-Geral da União e à Secretaria-Geral de Contencioso (SGCT) a análise da ‘adequação’ do conteúdo da Portaria AGU nº 303”, aos termos do acórdão proferido pelo STF no julgamento dos embargos de declaração opostos na Petição nº 3388. Qual o sentido de “adequar” a Portaria 303/2012 ao conteúdo da decisão do STF?
A vigência da Portaria 303/2012 é incompreensível e injustificável. Trata-se de uma decisão política do Poder Executivo Federal que desrespeita e atenta contra decisão do STF, determinando práticas na atuação dos Advogados da União, inclusive em processos judiciais que envolvem disputas fundiárias relativas ao direito dos povos indígenas às suas terras tradicionais.
A Portaria 303/2012 é altamente prejudicial aos povos indígenas. Em respeito à decisão do STF e aos direitos destes povos, é fundamental que a mesma seja imediata e definitivamente revogada pelo governo federal.
Brasília – DF, 20 de fevereiro de 2014.
Conselho Indigenista Missionário – Cimi

O vilão é o modelo mercantil do setor elétrico

Heitor Scalambrini Costa
Professor da Universidade Federal de Pernambuco


Tentar entender o que se passa com o setor elétrico brasileiro, significa conhecer melhor um passado recente em que decisões errôneas foram tomadas, resultando atualmente em tarifas caras, fornecimento e abastecimento precários, e risco crescente de racionamento de energia. Além de um setor sem credibilidade, sem democracia, sem competência.

Em fevereiro de 1995, teve inicio o que ficou conhecido como a Reestruturação do Setor Elétrico, com a aprovação pelo Congresso Nacional da Lei nº 8987, que trata do regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos.

Iniciou assim um modelo “de mercado”. Ou seja: a reestruturação foi baseada no preceito de que a ação empresarial “concorrencional”, motivada pela perspectiva do lucro econômico, aportaria ao setor elétrico, eficiência e qualidade dos serviços prestados e tarifas módicas. A idéia que está por trás desta suposta lógica é que o lucro seria um sinal suficiente para garantir os investimentos. Essa assertiva não é inteiramente verdadeira, pois as empresas do setor andam ganhando “rios de dinheiro” sim (basta acompanhar os balancetes anuais), mas seus investimentos ficam somente nos discursos, já que o BNDES (leia-se: o tesouro nacional, o dinheiros dos impostos) tem sido o “Papai Noel” fora de época para as empresas do setor elétrico.

Com o racionamento de energia elétrica ocorrido em 2001/2002, com a deterioração da qualidade do abastecimento causado por dezenas (e centenas) de apagões e apaguinhos (interrupções no fornecimento de energia elétrica) ao longo daquele período e com a explosão tarifária, chega-se à conclusão, sem precisar ser um grande especialista, que o modelo não funcionou.

Desde aquele episodio do (longo) racionamento de energia elétrica, sem dúvida uma consequência direta das transformações impostas ao setor elétrico, a sociedade brasileira teve a oportunidade de um grande debate sobe o tema, para rever a política do Governo Federal para o setor. Técnico e especialistas que se opunham ao modelo mercantil se uniram em torno do partido político à época, o atual gestor do Estado brasileiro, e chegaram à conclusão de que o modelo implantado deveria ser totalmente reformulado, inclusive defenestrando os gestores daquele modelo, com comportamentos (a)éticos que comprometia as mudanças pretendidas. Este programa de energia foi lançado no Clube de Engenharia do Rio de Janeiro em 30 de abril de 2002.

As mudanças substantivas propostas naquele programa, pugnavam inclusive pela transformação das empresas estatais de serviços públicos, em empresas públicas e cidadãs (empresas que não seriam nem estatais, nem privadas, mas sim sujeitas a instrumentos e mecanismos autônomos de controle da sociedade) não ocorreram. Chegando ao poder, como é de práxis no Brasil, a historia foi diferente. Acabou prevalecendo para o setor a continuidade do modelo mercantil. Eufemisticamente, este novo-velho modelo remendado foi chamado na época de “modelo híbrido”. Inclusive acabou prevalecendo a permanência daqueles que defendiam a continuidade do modelo mercantil, com a justificativa de atender às necessidades fisiológicas das alianças partidárias, ou seja: a tal da “governabilidade”.

Portanto, “tudo ficou como dantes no quartel de Abrantes”. Com a manutenção do modelo mercantil, houve a criação de inúmeros encargos, uns com caráter compensatórios, outros como subsídios, e a maioria decorrentes de custos para “alimentar” o próprio modelo. Além da privatização das empresas do setor (100% das distribuidoras, 50% das transmissoras e 20% das geradoras).

O que se constatou ao longo desses anos todos é que, com tais encargos, houve uma significativa evolução para cima das tarifas de energia elétrica. Ou seja: os “encargos de mercado” do modelo mercantil contribuíram significativamente para a explosão tarifária. 

Outra questão pertinente, e mal resolvida pelos gestores do setor elétrico nos últimos 12 anos, foi à falta de incentivos à diversificação da matriz energética, que baseia 80% da geração elétrica via hidroelétricas, e 20% via termoelétricas. Ambas formas de geração centralizada através de grandes, mega centrais, sendo necessário “exportar” esta energia, através das linhas de transmissão, até os centros consumidores.

A culpa pela situação a que chegou o setor elétrico brasileiro hoje, não é de São Pedro, é sim dos homens, da ganância, da dominação do homem sobre ele mesmo. Temos condições de promover as mudanças necessárias no modelo elétrico, que beneficie a maioria da população, de promover as novas fontes de energia (sol e vento), de incentivar o uso racional de energia, diminuindo assim o desperdício, de fortalecer a inovação com o uso de iluminação e de motores mais eficientes, de regionalizar o planejamento energético, democratizando as tomadas de decisões? São escolhas, como foram as que nos levaram para os riscos atuais cada vez maiores de racionamento de energia.

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

COMIN E CIMI: Em favor dos povos indígenas

O Conselho de Missão entre Povos Indígenas (Comin) e o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) manifestam total solidariedade aos povos indígenas do Brasil, em especial, às comunidades indígenas do Rio Grande do Sul, diante do desrespeito, preconceito e violência dos quais têm sido alvos nos últimos tempos. Durante o ano de 2013, o Comin e o Cimi se manifestaram diante de várias situações violentas sofridas pelas comunidades Kaingang e Guarani, por vezes junto a outros grupos minoritários. Contudo, a lentidão ou omissão das autoridades competentes para atender as demandas reivindicadas e de direito (demarcação de terra; políticas públicas condizentes; investigação e julgamento dos atentados a tiros, ameaças de morte, coerção e do abuso de poder de servidores público; e outras violências) criou possibilidades para que as declarações e incitações violentas ocorressem no dia 29 de dezembro de 2013, em Vicente Dutra (RS).
As declarações ocorreram durante a realização da Audiência Pública da Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural (CAPADR), da Câmara dos Deputados Federais. A audiência foi conduzida e coordenada pelo deputado Vilson Covatti (PP/RS), com participação dos deputados federais Alceu Moreira (PMDB/RS) e Luiz Carlos Heinze (PP/RS). O tema da audiência era os conflitos oriundos do processo de demarcação das terras de ocupação tradicional kaingang, a Terra Indígena (TI)Rio dos Índios, de 715 hectares. Contudo, durante a audiência, que não teve a participação da comunidade kaingang ou de entidades de defesa dos direitos humanos ou dos povos indígenas, somente os setores políticos, sindicais e dos agricultores se manifestaram. Todos contrários à homologação da TI Rio dos Índios. Os discursos incitavam a comunidade não indígena de Vicente Dutra e região a resistir e desconhecer a presença histórica e legitimidade da reivindicação da comunidade indígena.
A publicação do vídeo, com cerca de três minutos, na última semana, é uma amostra dos discursos e falácias proferidas durante duas horas. Os três deputados federais ocuparam maior tempo, porém representantes de prefeituras, sindicatos e das famílias agricultoras também se manifestaram. A íntegra da audiência pode ser visualizada no sítio eletrônico do youtube, sob o título “Audiência Pública em Vicente Dutra (RS)” – [Parte 1 até Parte 6]. Além das barbaridades já divulgadas, ocorreram outras. Inclusive, propaganda eleitoral ao governo estadual do Rio Grande do Sul, em que se afirma que as pré-candidaturas de Ana Amélia Lemos (PP/RS) e José Ivo Sartori (PMDB/RS) orientariam a Brigada Militar a defender a propriedade privada e não permitiriam a continuidade dos processos e manifestações das comunidades indígenas. Desrespeitam, assim, a legislação brasileira e as prerrogativas do direito fundamental de acesso e permanência na terra dos povos indígenas, como estipulado pela Constituição Federal do Brasil, a declaração da Organização das Nações Unidas (ONU) e a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Ressalta-se que a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas define no artigo 2o: “Os povos e pessoas indígenas são livres e iguais a todos os demais povos e indivíduos e têm o direito de não serem submetidos a nenhuma forma de discriminação no exercício de seus direitos, que esteja fundada, em particular, em sua origem ou identidade indígena”. Da mesma forma a Constituição Federal do Brasil, constituído como Estado Democrático de Direito, estabelece como um dos objetivos fundamentais, “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” (art. 3º, inciso IV da CF 88). Assim, a discriminação e o preconceito se constituem em crime, como tipificado pelo artigo 20 da lei nº 7.7716/89 (Lei do Crime Racial): “Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”.
O Comin e o Cimi referendam o documento elaborado pelas lideranças indígenas entregue ao Ministério Público Federal/Passo Fundo, durante o Encontro de Lideranças Indígenas, realizado na Comunidade Kaingang RêKuju, nos dias 13 e 14 de fevereiro de 2014. Reafirmamos e também “exigimos punição severa a esses deputados contra os crimes de preconceito racial, étnico, apologia ao crime e a violência, discriminação social, econômica, de gênero, religiosa e formação de milícias. A incitação preconceituosa e violenta, aliada a interesses eleitorais, representa uma ameaça aos direitos humanos dos povos indígenas e promove uma opinião contrária e irreal sobre as comunidades e os povos indígenas”, como expresso no documento das lideranças indígenas. ‘O que não presta’ é o preconceito e a incitação à violência. A luta por uma sociedade plural, cidadã e com justiça social é o que se quer para a sociedade brasileira. 
Fevereiro de 2014 
Conselho de Missão entre os Povos Indígenas (Comin) 
Conselho Indigenista Missionário (Cimi).

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

POVOS INDÍGENAS DO ACRE PEDEM SOCORRO:Jaminawa da Aldeia São Paolino: ameaçados por fazendeiros ainda enfrentam constantes alagações


Este vídeo produzido por Patrícia Ferreira e por Ninawa Huni Kui mostra mais uma vez a triste realidade vivida pelo povo Jaminawa da Aldeia São Paolino, município de Sena Madureira, estado do Acre. Esse povo há mais de trinta anos trava uma luta pela demarcação de seu território tradicional e que se encontra invadido por fazendeiros. Por causa da invasão dos fazendeiros a comunidade precisa viver em apenas uma faixa de terra entre o Rio Purus e a "fazendo" do invasor. Por essa razão, basicamente todos os anos, os jaminawa sofrem com alagações nas quais perdem o pouco que conseguem plantar em uma faixa tão pequena de terra.


Este blog mesmo já fez várias denúncias sobre o descaso e as ameaças sofridas por este povo. Até o presente momento quase nada foi feito. Não consigo entender, por exemplo, porque a Funai insiste em se calar diante da situação. 

Recentemente a presidente da Funai veio ao Acre, precisamente no dia 07 último, e fez um discurso agradecendo o governador Tião Viana por ter, segundo ela, ajudado a "superar todos os problemas enfrentados pelos povos indígenas do Estado". O que ela se esqueceu é que temos neste exato momento mais de 20 terras sem serem demarcadas, os pólos e DSEIs ocupados por falta de atenção à saúde, quase que total desassistência nas aldeias e inúmeros indígenas vagando pelas cidades, sem assistência, além de outro tanto acampados. 

As ameaças de morte contra líderes deste povo não cessam e, ao contrário, se acentuam na medida em que a Funai não toma providências. Para entender melhor a situação jaminawa acessem os links AQUIAQUIAQUIAQUI e AQUI além de tantas outras denúncias levadas inclusive ao Ministério Público e à Polícia Federal.

Contradizendo a fala da presidente da Funai, um grupo de mais de 100 lideranças se encontra neste exato momento ocupando o centro de antropologia da UFAC na tentativa de forçar uma negociação com a SESAI - Secretaria Nacional de Saúde Indígena e com representante do governo do Estado. Os indígenas exigem melhorias  no atendimento à saúde e, como parte desta melhoria, exigem a imediata demissão do administrador Sr. Costa.

São inúmeras denúncias contra este senhor e nenhuma providência foi tomada. O cargo que ele ocupa, assim como o da coordenadora local da Funai é tido pelos indígenas como cargo de confiança do governador. Vejam as principais motivações da atual mobilização resumidas neste documento.


segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Nota dos bispos do Tocantins sobre o conflito de terra em Campos Lindos

“Se eu saio para os campos, eis as vítimas da espada; se eu entro nas cidades, eis as vitimas da fome” (Jer 14,18). Leia o documento:
Nós, bispos das cinco dioceses do Regional Norte III, da CNBB, no Estado do Tocantins, ao tomarmos conhecimento do acirrado conflito de terra e dos problemas ambientais, com ameaças de despejo de mais de 80 famílias, no município de Campos Lindos, vimos, em nome de Jesus Cristo, pedir as partes em conflitos, diálogo, amor, justiça e reconciliação. Para tudo isto, nos colocarmos à inteira disposição das duas partes para mediar este conflito.
O município de Campos Lindos é um grande celeiro, a céu aberto, de soja, no Estado do Tocantins. No entanto, apesar disso, possui o segundo pior IDH do Estado. Significa dizer que as riquezas que circulam no município, decorrentes desta produção, não contribuem para o desenvolvimento da região e nem beneficiam a população local.
Além do mais, foi em uma fazenda desta mesma região que se deu o primeiro caso de trabalho escravo no Estado do Tocantins, com o resgate de 29 trabalhadores. A Campanha da Fraternidade deste ano de 2014 que tem como Tema “Fraternidade e Tráfico Humano”, diz, em grandes linhas, que são situações como esta que rompem com o projeto de vida na liberdade e na paz e violam a dignidade e os direitos do ser humano, criado à imagem e semelhança de Deus. “É para a liberdade que Cristo nos libertou” (Gal 5,1).
Nossa solicitude pastoral se dirige, primeiramente, às famílias atingidas pelo Projeto Agrícola Campos Lindos, que já ocupavam estas áreas há décadas, e que hoje correm sério risco de perder e ser despejadas das terras, desde que, em 1997, foram confinadas em sua área de reserva. Nossa orientação é que façam valer os seus direitos, através de um diálogo progressivo e construtivo, mediado pelas autoridades constituídas para estes fins.
Dirigimo-nos, de igual modo, aos produtores de soja, membros da Associação Planalto, a fim de que retirem todas as ameaças às referidas famílias que vivem nestas áreas de conflito e não contaminem mais o meio ambiente pelo uso intensivo de agrotóxicos nas lavouras de soja.
Por fim, conclamamos o Ministério Público Estadual, o INCRA e o Tribunal de Justiça, e outros, para que, dentro da legalidade, acompanhem, de perto, a revisão do mandado de reintegração de posse, em favor da Associação Planalto, e que estas famílias tenham as suas terras regularizadas e tituladas.
Queremos, com este nosso apelo, fazer jus ao nome de Campos Lindos desta querida cidade. É Jesus que nos pede para que sejamos sal da terra e luz do mundo (Mt 5,13-14). A respeito disto, sugestivas são as palavras do papa Francisco: “com uma vida santa, daremos sabor aos diversos ambientes e os defenderemos da corrupção, como faz o sal; e levaremos a luz de Cristo com o testemunho de uma caridade autêntica. Mas se nós, cristãos, perdemos o sabor, apagamos a nossa presença de sal e luz, perdemos a eficácia. É também muito bonito conservar a luz que recebemos de Jesus. Guardá-la. Conservá-la. O cristão deveria ser uma pessoa luminosa, que traz a luz, que sempre dá luz. Uma luz que não é sua, mas é um presente de Deus, o presente de Jesus. E nós levamos em frente esta luz. Se o cristão apaga esta luz, a sua vida não tem sentido: é um cristão somente de nome, que não leva a luz, uma vida sem sentido” (cf. Angelus, 09/02/2014).
Certos de sermos atendidos, em nossa solicitação, nos colocamos à inteira disposição dos senhores para mediar este conflito.
Na caridade de Cristo, Bom Pastor, com nossa bênção.
Em nome dos 5 bispos do regional da CNBB – Norte 3; Dom Pedro Brito Guimarães- Arcebispo de Palmas; Dom Romualdo Matias Kujawski - Bispo de Porto Nacional; Dom Giovane Pereira de Melo- Bispo de Tocantinópolis; Dom Rodolfo Luiz Weber- Bispo da Prelazia de Cristalândia;
Dom Philip Dickmans,
Bispo de Miracema do Tocantins e Presidente do Regional norte 3 da CNBB.
Miracema do Tocantins, 10 de fevereiro de 2014.


NOTA PÚBLICA: Ameaça de Despejo de famílias em Campos Lindos, TO
A Coordenação Nacional da Comissão Pastoral da Terra vem a público externar sua apreensão diante do risco iminente de despejo de suas terras de cerca de 80 famílias camponesas, em Campos Lindos, TO.
O juiz da Comarca de Goiatins emitiu, em 18/09/2013, mandado de reintegração de posse em favor da Associação de Plantadores do Alto do Tocantins (Associação Planalto) do Projeto Agrícola Campos Lindos, município de Campos Lindos, nordeste do Tocantins. Na ação, a Associação Planalto alega que as famílias invadiram a área de reserva em condomínio, o que estaria prejudicando a regularização ambiental do projeto. O recurso apresentado pelos posseiros foi julgado em 29 de janeiro de 2014 pela 5ª Turma da 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Tocantins, a qual manteve a sentença de despejo.
Na verdade a alegação de invasão de área de reserva não corresponde à realidade. Em torno a 160 famílias que, há pelo menos quatro décadas, ocupavam a área, foram pressionadas e encurraladas em reduzido espaço para dar lugar ao Projeto Agrícola Campos Lindos, criado em 1997, pelo governo Siqueira Campos. Em consequência, mais de 90 mil hectares já ocupados por camponeses foram transferidos para fazendeiros, empresários e políticos, entre os quais a atual senadora Kátia Abreu e o ex-ministro da Agricultura Dejandir Dalpasquale. Em uma verdadeira “reforma agrária às avessas”, cada beneficiário pagou apenas 10 reais por hectare.
Depois de muita pressão, aproximadamente 80 famílias tiveram seus direitos reconhecidos pelo Instituto de Terras do Tocantins, Itertins. Grande parte, porém, ficou sem o reconhecimento legal de suas posses. Pais e filhos que moravam perto foram considerados um único núcleo familiar e a eles foi atribuído um único lote. Por isso continuaram na área reivindicando uma solução definitiva.
As últimas sentenças judiciais determinam o despejo de todas essas famílias. A Polícia Militar já fez o reconhecimento de campo e se planeja para, em breve, realizar a ação.
Mais uma vez a propriedade, nem tão legítima como poderia parecer, fala mais alto que os legítimos direitos dos camponeses que, há dezenas de anos, trabalham, produzem e vivem nesta área. Ao invés de tentar conhecer a fundo a realidade, a Justiça se restringe a examinar documentos e papéis. A história escrita e esculpida na terra com o suor e o trabalho das pessoas não conta.
O Ministério Público Federal havia determinado, após audiência pública realizada em 2013, um estudo antropológico sobre a ocupação da área. O laudo do antropólogo foi concluído e publicado somente no dia 28 de janeiro de 2014, na véspera da sentença do Tribunal de Justiça, reconhecendo a ocupação antiga e coletiva da área.
Diante disto, a Coordenação Nacional exige que o despejo seja suspenso e que se garantam os direitos das famílias que, há 18 anos, vivem constantemente sob pressão, na incerteza de como será o dia de amanhã.
Goiânia, 6 de fevereiro de 2014.
Dom Enemésio Lazzaris
Presidente da CPT Nacional