Indígenas Jaminawa
EM ESPAÇOS URBANOS NA CIDADE DE BRASILEIA, ACRE
O atual trabalho,
coordenado por Rosenilda
Nunes Padilha, na cidade de Brasileia,
no bairro Samaúma, periferia, da periferia da cidade de Brasileia, expressa em si uma preocupação e indignação nossa,
do Cimi – Conselho Indigenista Missionário, Regional
Amazônia Ocidental, na busca por direitos e na defesa integral dos povos indígenas. Neste caso em questão são os
Jaminawa que vivem em espaços urbanos na cidade
de Brasileia. A história de abandono deste povo por parte das autoridades, fez com que essas pessoas procurassem seu meio de sobrevivência em espaço urbano. Portanto,
viver e trabalhar na cidade não é uma opção, é questão
de vida, de sobrevivência.
O Cimi tem atuação na defesa da vida
dos povos indígenas há 50 anos. E ao longo desse meio século muitas coisas mudaram. E os povos indígenas também sofreram
grandes mudanças. A realidade do povo Jaminawa que sempre foi muito dura, também sofreu transformações, mesmo que
não tenham tido êxito na solução de seus principais problemas. Destaco aqui duas dessas
mudanças.
Primeiro: O aumento
das migrações para as cidades.
Segundo: A não demarcação
de seus territórios. Os Jaminawa lutam pela demarcação dos territórios São Paulino, Caéte, Kayapuká, Estirão e Boca
do Riozinho (antigo seringal Guanabara). E por
último um território urbano, localizado no município de Brasileia, conhecido
como bairro Sumaúma que é um bairro
indígena, como se fosse uma grande aldeia urbana. Esses territórios, exceto o território urbano, estão com os
processos paralisados há anos, por
exemplo, o território são Paulino, há disputas fortes entre indígenas e
fazendeiros, inclusive com queima de roçados, derrubadas de madeiras e mesmo de casas. No território
Estirão localizado no município de Santa Rosa do Purus, por exemplo, todo ano o povo sofre com alagações, perde todas as suas plantações e sempre estão recomeçando
a vida do zero. Como explica o cacique Francisco Jaminawa “as terras altas estão tudo nas mãos de fazendeiros, antigamente era tudo terra de Jaminawa, não existia Peru e Brasil, tudo era terra do nosso povo”. De
fato, seu Francisco explica bem isso, com lágrimas nos olhos, em sua casinha
coberta de palha com
chão de Paxiúba.
O que destacamos é que a história dos
Jaminawa está claramente vinculada à busca
de seus territórios. A não demarcação e reconhecimento dos territórios do povo Jaminawa
faz com que sejam ameaçados, tenham os territórios invadidos e são obrigados
a migrar em busca de sobrevivência. É urgente que se proceda a demarcação dos territórios e, no caso dos Jaminawa em Brasileia, é preciso que se reconheça o Bairro Samaúma como sendo um território indígena e uma aldeia do
povo Jaminawa. Mesmo estando em
contexto urbano, este povo tem que ter seus direitos garantidos. Direitos
básicos como o direito à saúde e à educação.
O dilema vivido pelos Jaminawa, em
resumo é o seguinte: Por não terem seus territórios
demarcados, são obrigados a migrar para as cidades. Chegando às cidades são obrigados a viver nas periferias onde não conseguem
viver com dignidade, não conseguem trabalho
e se veem obrigados a pedir ajuda pelas ruas. Pelo fato de estarem pelas ruas das cidades em situação
semelhante à mendicância, são tidos como estorvo e motivo de preconceito da parte até mesmo do poder público que
argumenta que os indígenas “sujam”
a cidade.
Desde a década de
80, há registros de índios pedintes na capital. Em janeiro de 2013, a assessoria Indígena
da Secretaria de Desenvolvimento Social
(Seds) em parceria
com a prefeitura de Rio Branco deram início a um trabalho de monitoramento e mapeamento de
famílias indígenas que praticam 'mendicância'. Diariamente o Centro de Atendimento à
População de Rua (Centro Pop) realiza
a abordagem dos índios que ocupam as ruas no centro de Rio Branco para detectar os motivos que os levam a procurar a
capital. "Se forem demandas de competência do poder público,
elas são encaminhadas para nós e tentamos
solucionar para que eles retornem às aldeias" (...). (G1
Acre, 02/04/2013). (Grifo nosso).
Na verdade, o que o poder público
sempre intentou com este “monitoramento” foi
o de encontrar motivos para que esses indígenas fossem levados de volta para as cabeceiras dos rios sob pretexto de que
estavam sendo reencaminhados às aldeias de origem. Entretanto, em nenhum momento
se fala em regularizar e demarcar os territórios ou ainda prestar-lhes a devida assistência nas cidades. Trata-se,
antes, portanto, de
desassistência, falta de reconhecimento de direitos e ausência de políticas públicas.
Já nos manifestamos sobre isso anteriormente.
A face mais cruel
dessa triste realidade de indígenas sem-terra em plena Amazônia, é manifesta no total abandono do povo Jaminawa que,
sem ter terra e nem para onde ir,
fica em grande número vagando pelas ruas das
cidades, especialmente em Rio Branco e Sena Madureira. Os Jaminawa, na verdade
não são apenas um povo, mas pelo menos quatro povos e são tratados
pelo poder público
como resto, escória
da sociedade. Vivem acampados às margens dos rios e periferias das cidades em situação desumana. (PADILHA, 2012, p. 06).
Ora, o suposto reencaminhamento às
aldeias violenta ainda mais o povo porque faz
com que a sociedade passe a vê-los como intrusos nos espaços urbanos e os
aponta como preguiçosos, uma vez que
preferem pedir pelas ruas do que tralhar em “suas terras”. Este tipo de atitude
só aumenta o preconceito e demonstra uma falta de compromisso do poder público
na leal busca por fazer aplicar a lei e garantir a implementação
de direitos. Por anos se difundiu a falsa ideia de que, no Acre, os povos indígenas viviam e ainda vivem no chamado
“tempo do direito” 3. Uma mentira contada várias vezes pode até confundir alguns, mas jamais se tornará uma verdade.
Uma importantíssima contribuição deste trabalho que ora
apresentamos é poder contribuir com o
poder público na formulação de políticas públicas que possam ser efetivas e que não sirvam apenas como
propaganda de governos e instituições ou ainda
para promover pessoas e teses pessoais. O que esperamos que sejam
promovidos são os povos e uma parte
fundamental para isso é a demarcação dos territórios e a garantia de direitos,
ainda que vivam em
espaços urbanos.
1 Doutoranda em Antropologia pela Universidade Federal de Pelotas. Mestra em Ciência da Linguagem pela Universidade Federal de Rondônia, licenciada em Antropologia pela Universidade politécnica Salesiana, Quito/Equador, membro do cimi desde 1998.
2 Mestre em direito pela Universidade Católica de Petrópolis, especialista em desenvolvimento social no campo, povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais pela Universidade de Brasília, UNB, Filósofo e indigenista atuando a mais de 30 anos na Amazônia.
3 O indigenismo oficial no Acre
adota uma divisão do tempo grosso modo distribuído assim: Tempo das malocas; Tempo das correrias; Tempo do
cativeiro e Tempo dos direitos que premasse até os dias de hoje. (PADILHA. 2012, p. 03). http://www padrenello.com/wp-content/uploads/2012/10/Livro-Ind%C3%ADgenas-no-Acre- internet.pdf?iframe=true&width=90%&height=90%
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